domingo, 30 de outubro de 2011

Exorcismos


De Elias Canetti (1905-1994), escritor de origem búlgara que se expressou, literariamente, através da língua alemã, nunca eu tinha lido nada. Canetti era descendente de judeus sefarditas, fugidos de Espanha em 1492, e o uso de palavras castelhanas era normal entre os membros da sua família, sobretudo em casa. O escritor, que foi Nobel da Literatura, em 1981, pertencia à classe média-alta, na Bulgária.
Pois, há dias, comecei a ler, em tradução francesa (Histoire d'une Jeunesse - La langue perdue) de Bernard Kreiss, a sua obra "Die Gerettete Zunge Geschichte einer Jugend". Da sua infância, entre muitas outras coisas, o escritor refere que, em sua casa, havia várias criadas muito jovens (10/12 anos), búlgaras e vindas da aldeia e campos vizinhos, que o ajudaram a criar-se, brincavam com ele e lhe faziam companhia, quando os pais de Elias estavam para fora. Sempre que isto acontecia, chegando a noite, as criaditas, com medo, juntavam-se umas às outras, e começavam a contar histórias de lobisomens e vampiros. Numa espécie de exorcismo psicológico - digo eu.
Ora, eu tive uma experiência semelhante, também na infância, em que a minha empregada, oriunda de Vieira do Minho, à noite, me lia histórias de livros, mas também me contava lendas, não de vampiros, mas de lobisomens que, dizia ela, habitavam no Marão. Isto seria, nela, provavelmente uma forma de exorcisar terrores ancestrais que traria de infância, passados de gerações em gerações. Creio que nunca tive medo excessivo destes contos e lendas, mas antes curiosidade e estranheza. Por isso, talvez, nunca tive necessidade de exorcisá-los, nem de passá-los aos meus filhos...

4 comentários:

  1. Pensava que Elias Canetti tinha escrito em yidish. :(
    Dele só li "Auto de fé" que nos revolve as entranhas.
    Talvez me venha a aventurar nesta "História duma juventude".
    Há tempos soube que ele era irmão de Jacques Canetti, o produtor musical francês. Fiquei espantada porque nunca tinha associado os dois nomes.

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  2. Sei muito pouco sobre Canetti. Se a MR tiver paciência (ainda vou no princípio, pg. 18 de 412), eu depois empresto-lhe o livro. Até porque não é recente (1980), da Poche/Albin Michel.

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  3. Muito obrigada.
    A correspondência Gide/Simenon está num saco à entrada da porta.

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