quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Graciliano Ramos e a Infância


Sempre pensei que a prosa de Graciliano Ramos (1892-1953) era sisuda, enxuta de emoção, quase matemática na sua nudez e paixão fria. Próxima da geometria dos versos de um Cabral de Melo Neto, ou do lirismo pictórico e muralhado das telas de Mondrian. E muito longe do derrame lírico, transbordante, de Guimarães Rosa que, com o seu contágio de palavras, nos faz regressar às memórias primordiais da fala.
Pensava isso, antes de ler "Infância" (1945). Vi que estava enganado. Cada capítulo do livro é uma re-descoberta adulta, cheia de frescura e emoção, dos factos, lugares e pessoas da infância que lhe ficaram na memória. Graciliano Ramos nasceu em Quebrangulo (Alagoas), a 27 de Outubro de 1892. A melhor maneira de o celebrar e lembrar, é recordar as suas vivas palavras:
"...Os maiorais do município, govêrno e oposição, vinham de um grupo de famílias mais ou menos entrelaçadas, poderosas do Nordeste: Cavalcantis, Albuquerques, Siqueiras, Tenórios, Aquinos. Padre João Inácio era Albuquerque. O comendador Badega, parente de todos os graúdos, autor de vários filhos naturais, esfarinhado em César Cantu, vestia cassineta esfiapada e russa, usava chapéu de abas roídas e botas pretas com remendos amarelos. Assim, de rebenque e esporas, entrou uma noite no paço municipal com um lote de caboclas novas e, ao som da harmônica, dançou valsas e quadrilhas até o nascer do sol. Apesar da comenda, os roceiros davam-lhe o título de capitão. ..." (Infância, pg. 52)

2 comentários:

  1. Tenho uma vaguíssima memória de ter lido este livro, numa outra edição. E de ter gostado.

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  2. Esta é a 1º edição, de 1945. Tive a sorte de a comprar recentemente, por prço módico, muito embora o papel seja de fraca qualidade e esteja amarelecido e "queimado" pelo tempo. Mas o texto é uma maravilha, MR.

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