Não se pode dizer que eu seja um entusiasta de prefácios, a livros. Mas aprecio imenso um bom prefácio e que tenha a qualidade adaptada ao conteúdo, enriquecendo-o. Como é o caso da maior parte dos prólogos de Jorge de Sena. Ou de alguns saborosos prefácios camilianos, como esta introdução de A Brasileira de Prazins, com que me cruzei, há pouco. E aqui vai o seu início:
Entre as diversas moléstias significativas da minha vèlhice, o amor aos livros antigos - a mais dispendiosa - leva-me o dinheiro que me sobra da botica, onde os outros achaques me obrigam a fazer grandes orgias de pílulas e tizanas. E, quando cuido que me curo com as drogas e me ilustro com os arcaísmos, arruíno o estômago e enferrujo o cérebro em uma caturrice académica.
Constou-me aqui há dias que a snr.ª Joaquina de Vilalva tinha um gigo de livros vélhos entre duas pipas na adega, e que as pipas, em vez de malhais de pau, assentavam sobre missais. O meu informador denomina "missais" todos os livros grandes; aos pequenos chama "cartilhas". Mandei perguntar à snr.ª Joaquina se dava licença que eu visse os livros. Não só mos deixou ver, mas até mos deu todos - que escolhesse, que levasse. Examinei-os com alvoroço de bibliómano. Eles, gordurosos, húmidos, empoeirados, pareciam-me sedutores como ao leitor delicadamente sensual se lhe figura a face da mulher querida, oleosa de cold-cream, pulverisada de bismuto. (...)
Tenho esse livrinho, numa edição de 1974. Mas não identifica o autor do prefácio, pois não? Ou eu não vi bem (fui espreitar, agora). Este bocadinho realmente é muito bom!
ResponderEliminarContinuação de boa semana:))
O meu exemplar, Isabel, da "Colecção Lusitánia" (3ª ed. da obra), também não refere o autor da introdução. Mas é com certeza de Camilo.
EliminarObrigado. Retribuo, com estima.
É um prefácio de uma qualidade singular !
ResponderEliminarÉ verdade. E Camilo continua ser, pelo menos para mim, uma fonte de prazer na leitura de muitas das suas obras.
EliminarUm dos primeiros Camilo que li. E acho que nesta edição (ou numa semelhante).
ResponderEliminarUm autor que se lê sempre com um prazer renovado.
Bom dia!
Felizmente que Camilo teve que ser mais prolífico do que Eça, para nosso prazer.
EliminarBoa tarde.
Quem sabe escrever deve deixar a mão trabalhar. Camilo passou a maior parte da vida a escrever… e para além dos textos literários escrevia aos amigos (e aos menos amigos) longas cartas que são também um prazer encontrar e ler.
ResponderEliminarGosto deste prefácio porque me identifico nele. Foi por essa paixão de Camilo - amante de livros, como eu - que Ricardo Pinto de Matos o escolheu para prefaciar o seu útil Manual Bibliographico Portuguez.
Mas depois da mão trabalhar, é sempre avisado o espírito sobrevoar as possíveis incorrecções e corrigi-las, for o caso.
EliminarTambém tenho o precioso livro de Pinto de Matos, que me custou, nos anos 80 (?), Esc. 7.800$00, na rua do Alecrim.