segunda-feira, 14 de agosto de 2017

Divagações 124


É Claudio Magris (1939) que, no seu Alfabetos, fala de Praga como uma "cidade literária", no seu conceito mais restrito. Mas, no sentido amplo, por ordem de importância, e sobretudo no século XX, a sagrada trilogia de Veneza, Trieste e Praga foi um must de distinção de alguns escritores e poetas que se prezavam de o ser. Este fascínio, porventura estranho, contagiou muitos leitores e viajantes. Actual e infelizmente, no entanto, Veneza está condenada, principalmente, ao turismo democrático e popularucho, tendo perdido grande parte da sua população residente.
Também para pintores e para os amadores de pintura, no século XX, foram lugares míticos: Florença, a Provença, Paris e, depois, sucessivamente, Londres, Berlim, S. Francisco...
A tudo isto - creio - anda também associado algum snobismo intelectualóide, simultaneamente parolo, de alguns que se julgam ungidos do favor, graça e pertença a uma casta de eleitos e que, com alguma frequência, citam ou referem essas "cidades literárias" ou artísticas, pour épater le bourgeois. Visconti, como realizador e com dois dos seus filmes ("Senso", de 1954, e "Morte em Veneza", de 1971), também ajudou imenso à criação desses mitos, no caso particular, sobre esta cidade italiana do Adriático.
Se Joyce está ligado a Trieste, o seu nome leva-me sempre a Dublin. A Praga, chamava Kafka a sua "Mãezinha". E até acredito que Thomas Mann e Eugénio de Andrade tivessem falado de Veneza sinceramente, com verdadeiro afecto e profunda impressão, mas duvido que esse facto actue, hoje, nos seus leitores como se de um deslumbramento maravilhoso se tratasse, desencadeando, neles, um transe de hipnótico encantamento e atracção.

8 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Fui a Veneza em julho de 1989. O tempo estava uma porcaria, cinzento e com chuva molha-tolos. Os turistas deviam estar dentro dos hotéis, exceto esta turista que passeou à vontade pela cidade, que não a entusiasmou muito. É estranho, mas não Veneza não me fascinou.
    Pelo contrário, gostei imenso de Dublin e Praga, cidades onde espero um dia voltar. Trieste não conheço, mas quero muito lá ir, pelas descrições de Magris e de outros.
    Bom dia!

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    1. Nuna fui a Veneza. Mas parece que o cheiro da Laguna, às vezes, pode ser insuportável. Ainda hoje não tenho boas recordações de Tavira porque, quando lá fui, o cheiro da Ria Formosa (?) era pestilento. E estas coisas acabam por contar...
      Mas este livro de Magris, que ando a ler, bem como "Danúbio", é muito bom, e recomendo-lho.
      Bom feriado!

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  4. Cheiro nauseabundo era o da ria em Aveiro, mas nos últimos anos fui lá duas vezes e fiquei agradavelmente surpreendida: no smell e a cidade muito bonita.
    Li Danúbio de que gostei muito e lá para outubro lerei então Alfabetos. Obrigada pela dica.

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    1. De Aveiro, não sei, mas quando se passa por Cacia é um horror, quase sempre...
      Irei falar de "Alfabetos", mais tarde ou mais cedo, no Arpose, mas estou a lê-lo devagar, para o saborear melhor. Se não quiser comprar o livro, eu posso emprestar-lho depois.
      Quando gosto de um livro, não resisto a fazer-lhe publicidade..:-)

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  5. Recentemente li o "Dictionnaire amoureux de Venise" do Philippe Sollers, que mais uma vez me deixou apaixonado pela cidade de Veneza, mas depois vejo em documentários na tv, as hordas de turistas e fico "de pé atrás", porque as multidões de turistas em "peregrinação", fazem-me fugir dos locais e assim Veneza vai sendo adiada:)
    Concordo consigo quando diz que há cidades que nos fazem recordar de imediato um escritor ou um livro. Tomei nota do livro que sugere de Claudio Magris, apenas li um pequeno livro deste autor: "Ilações Sobre um Sabre".
    Muito boa noite!

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    1. Não conheço o livro que refere, e como já disse, por aqui, nunca fui a Veneza. Mas tenho "flashes" memoriais inesquecíveis de Londres, Gand e Barcelona, cidades de que gostei bastante.
      Quanto a Magris, se puder, não perca "Danúbio", que é um livro interessantíssimo.
      Um bom dia!

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