sexta-feira, 11 de junho de 2021

Antologia (prosa) 2

 


Dimanche 13 janvier 1963

Toda a poesia é intraduzível. Se a edição bilingue dos poemas de Emily Brontë foge à regra, o mérito pertence, à partida, ao tradutor Pierre Leyris. Mas principalmente uma presença se nos impõe, uma dor, uma solidão cujo grito passa através das palavras estrangeiras e faz esquecer a música destruida: no texto francês um coração continua a bater, e eu escuto essa pulsação que se silenciou na poesia francesa de hoje, depois que Rimbaud escolheu calar-se.
A recusa em deixar o sombrio paraíso da sua infância impede Emily de respirar fora do seu presbitério natal. Haworth e da sua charneca ligados a este destino único que lhe guardam o segredo. Porque há um segredo, aqui como em toda e qualquer vida, como em toda a grande poesia, naquele tempo em que os poetas acreditavam na sua alma. O que eles chamavam poesia, era a expressão desse segredo de que eles não revelavam o nome. E talvez nem eles próprios o conhecessem. Os Brontë em Haworth, os Guérin em Cayla: destes dois «altos lugares» se eleva para mim (que teria tido um destino tão diferente desses destinos) uma lamentação, que é minha absolutamente.


François Mauriac (1885-1970), in Bloc-notes, tome III (pg. 291).

4 comentários:

  1. Ainda hoje, a propósito da irmã Charlotte estive a ver a história da família e twnho o esquema do presbiterio para fazer um dia. Fascinam-me os lívros que faziam em miúdos, minúsculos
    Boa noite

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    1. Há infâncias com universos singulares e maravilhosos, os desta família, por exemplo.
      Um bom fim-de-semana!

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  2. Realmente, as traduções traem e é bem pior na poesia do que na prosa. Só um poeta para traduzir outro e mesmo assim é difícil. Bom dia!

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    1. Anda por aí muita tradução travestida de lixo, realmente.
      Bom resto de fim-de-semana.

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