Da leitura, já feita, de As Artes do Sentido (Relógio D'Água, 2017), de George Steiner (1929), gostaria de destacar dois excertos:
Com exceções arcádicas (uma colocação num instituto; a obtenção do estatuto de celebridade nos media; a capacidade invejável de transformar conhecimento genuíno em livros didático-utilitários), o académico e o professor das Letras foram economicamente marginalizados. A captação de financiamento privado e público para a investigação pura, para a dimensão experimental na literatura, na música, no teatro e para publicações de qualidade que apelam a uma minoria, é hoje quase frenética. É duvidoso que a censura política ou a ameaça da supressão tenham sido tão nocivas e humilhantes para a vida do espírito na academia humanística como o é a tirania da candidatura a bolsas (no que toca ao tempo desperdiçado, à intencionalidade mascarada ou rebaixada). As humanidades mendigam, ao passo que, até aos recentes sobressaltos financeiros, as ciências naturais e sociais exigem. (pgs. 104/5)
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As pseudoteologias e teofanias poderão desenvolver a virulência contagiosa da decadência. Muito possivelmente, e de certo modo em analogia com a chamada Idade das Trevas, grupos de homens e de mulheres, enlouquecidos pela erosão da privacidade, pela aniquilação sistemática do silêncio e do espaço para o pensamento que hoje nos persegue, poderão voltar-se para as quase esquecidas artes de leitura séria, de compromisso com a memória individual, de crítica inquirição colaborativa, que constituem os meios essenciais das litterae humaniores. Palavras de viva voz, palavras do coração poderão reverberar através das intimidades da redescoberta. Poder-se-á mesmo argumentar que as ciências, que hoje se encontram tão esmagadoramente em ascensão em termos intelectuais e empíricos, poderão implodir, em alguns aspectos, sobrecarregadas, paralisadas pela própria massa de informação que produzem, pela aceleração da especialização. Esta massa, esta multiplicação imparável de ramos e códigos especializados, torna já cada vez mais precárias a comunicação e a compreensão mútuas no seio de qualquer ciência ou família de ciências. Ninguém está hoje totalmente seguro de que o centro se aguente, de que sequer exista um centro. (pg. 123)
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