Tenho vindo a ler, paulatinamente, um grosso volume, com mais de mil páginas, em que o francês Pierre Assouline (1953) se debruça sobre a vida e obra do belga Georges Simenon (1903-1989). Sendo um trabalho importante e original de análise e investigação, achei por bem vir a fazer uma pequena selecção do que fui lendo, e traduzindo algumas passagens mais significativas, que por aqui deixo registadas:
"Nome (Maigret) engraçado. Como o teria ele (Simenon) encontrado? Quando o pequeno Sim era jornalista na Gazette, um elemento da polícia de Liége chamava-se Arnold Maigret, mas nada indica que os dois homens se tivessem conhecido. Em Paris, um tal Julien Maigret, que acabava de passar quinze anos no Congo, prepara-se para assumir o cargo de primeiro director do Poste Colonial, emissora de rádio do império francês, em maio de 1931, ou seja dois anos depois de ter surgido o patronímico pela pena do escritor. (...) E Simenon descobrirá ainda mais tarde com boa disposição, lendo no inglês Sainte-Beuve de Harold Nicholson, que na página 201 um certo «M. Maigret, director da Segurança geral» teve uma intervenção nos acontecimentos ocorridos em 1855, se não há mais tempo!
Bem como há que confessar: que se ignora como este nome lhe veio ao espírito, ainda que se possa especular infinitamente sobre a relação entre a sua raiz (maigre) e a silhueta volumosa desta personagem com 110 quilos e 1,80 m. de altura.
Jules Maigret nasce para a literatura aos 45 anos, que é praticamente a idade com que morreu o pai de Simenon. Está casado, sem filhos, tal como Simenon a princípio." (Pgs. 207/8)
"Maigret não é um intelectual nem um cerebral: não pensa nem reflecte. Bastante inteligente, mas não manhoso, é um intuitivo e instintivo puro. Como uma esponja, absorve, impregna-se, penetra numa atmosfera para melhor compreender os mecanismos desse meio. O seu faro, ainda mais do que a sua capacidade de reflexão leva-o às mais audaciosas deduções. (...) É um homem de rituais. Vai ao cinema uma vez por semana. À tarde quando regressa a casa, entre o segundo e o terceiro andar, desabotoa o casaco para tirar as chaves do bolso. Embora saiba que Louise, a sua mulher, lhe abrirá a porta mesmo antes de ele meter a chave na fechadura." (pg. 209)
com agradecimentos a H. N., pelo empréstimo.