domingo, 6 de abril de 2014

A par e passo 86


Ouvimos falar de mundos desaparecidos completamente, de impérios soterrados com todos os seus homens e seus engenhos; mergulhados no fundo inexplorado dos séculos com os seus deuses e as suas leis, as suas academias e as suas ciências puras e aplicadas, com as suas gramáticas, os seus dicionários, os seus clássicos, os seus românticos e os seus simbolistas, os seus críticos e os críticos dos seus críticos. Sabemos bem como toda a terra aparente é feita de cinzas, que a cinza significa alguma coisa. Apercebemo-nos através da espessura da história, dos fantasmas de imensos navios que vinham carregados de riqueza e de espírito. Não seremos capazes de os contar. Mas estes naufrágios, apesar de tudo, não eram da nossa conta.
Elam, Ninive, Babilónia eram nomes belos e vagos, e a ruína total destes mundos tinha um significado tão pequeno para nós, como tinha a sua própria existência. Mas França, Inglaterra, Rússia... também seriam nomes bonitos. Lusitânia é também um belo nome. E vemos agora que o abismo da história é suficientemente grande para todo o mundo. Sentimos que uma civilização tem a mesma fragilidade que uma vida.

Paul Valéry, in Variété I (pgs. 11/12).

Nota pessoal: nesta idade, em que exigência e exiguidade muitas vezes se reúnem, não raro, contra a nossa própria vontade, não haveria muito, qualitativamente, por onde escolher. Prossigamos, pois, com Valéry, através de uma sua outra obra de reflexão...

4 comentários:

  1. Ainda bem que Paul Valéry e as suas reflexões continuam a marcar presença!
    Boa noite e uma boa semana!

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    1. Esta tradução, devia ter-lha dedicado..:-)
      Igualmente!, com estima.

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