sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Iconografia moderna e laica (25)


Eu sabia que se me lembrasse do apelido, recordaria certamente o nome. Mas não consegui. O sonho, depois, consubstanciara-se apenas por impressões fragmentárias, intensas mas fluidas, em temas de remotas discussões de cariz profissional, onde a agressividade rondava mas não se revelava inteiramente; em que as ameaças, como um céu carregado, se perfilavam apenas, sem desencadearem um duelo mortal que definisse a situação futura, concreta. Nem o resultado final. Talvez a ironia dominasse as faces, num sorriso enganador - aliás, como eu o lembrava, trinta anos atrás.
O cenário era também improvável: o chão adocicado de fruta escorrida, e pegajoso, escorregadio ao mesmo tempo; juncado de lenços de papel usados e panos diversos muito sujos, já servidos. Por diversos compartimentos contíguos, circulavam protagonistas fardados entoando cantilenas diversas, como se de uma tragédia grega se tratasse, mesmo que ninguém o admitisse. E essas vozes, num coro e destino fatal, de súbito faziam-se grupo reordenado em fuga. Como se da terra procurassem a Arca, desesperadamente. Para escapar, sobreviventes por um pequeno tempo, ao Dilúvio.
Que a ficção não iria senão adiar o fim. Esse, sim, real.

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