terça-feira, 1 de março de 2022

Desequilíbrios


Iniciei-me em leilões de livros usados em 1974/5. Já antes, frequentava com alguma assiduidade as lojas de alfarrabistas. Nessa altura, havia um certo equilíbrio e moderação nos preços, excepto quando algum lote suscitava paixões animosas em diversos licitadores. Aí, os valores, normalmente, descambavam. Até ao início da pandemia, e em anos recentes, houve altos e baixos nos preços, como acontece na bolsa, mas mantendo-se um certo sentido de proporção lógica e objectiva, em função da raridade e números de tiragem, importância da obra e estado de conservação do livro em apreço. A prática de leilões, continuada, durante cerca de 40 anos, permitiu-me criar um certo critério de avaliação e de razoabilidade nos preços, que não dispensava as diferenças geográficas, naquilo que é habitual em Lisboa, Coimbra ou no Porto. Sendo que, no Norte, os preços são mais altos, até nos alfarrabistas, se eventualmente se tratar de obras de Camilo Castelo Branco, por exemplo.
Mais recentemente tem-me parecido, porém, grassar um certo desnorte nos preços de livros, difícil de explicar ou mesmo atribuir, apesar da redução drástica de livrarias de alfarrabistas sobretudo em Lisboa. Por vezes, no exagero de valor atribuído a algumas obras, outras vezes, pelo preço de saldo que pedem por livros que, antes, tinham preços solidamente estabilizados. Vou dar dois exemplos recentes.



Por volta de 1985 comprei em Lisboa uma primeira edição (1778) das Obras Poéticas de Pedro António Correia Garção, edição póstuma mandada imprimir pelo irmão do poeta. O exemplar custou-me Esc. 8.500$00, na rua do Alecrim, nº 44. Era, na altura, um livro estimado e procurado. Em 2021, num leilão do Palácio do Correio Velho (lote 137), um exemplar semelhante, também encadernado, vendeu-se por 80 euros. Pois, há dias, a Livraria Bizantina pôs à venda um livro igual, embora com a encadernação cansada, ao preço fixo de 30 euros...



Em sinal contrário, apareceu à venda no boletim bibliográfico da Livraria Castro e Silva, por 50 euros, um vulgar O Espírito da Raça Portuguesa na sua Expansão Além-Mar, de João de Almeida, obra editada, em 1933, pela Parceria António Maria Pereira. Brochado como este, adquiri em finais dos anos 70, na rua da Madalena, em Lisboa, um exemplar em bom estado, por apenas Esc. 5$00.
Dispenso dizer mais...

2 comentários:

  1. Nesta matéria não podemos culpar o preço do petróleo...só conhecia um numa cidade periférica ao qual recorri algumas vezes para procurar obras muito específicas e valeu-me sempre. Há uns anos, ainda antes da pandemia, deixou de poder pagar a renda e agora monta banca no mercado de rua, todos os domingos...está velhote e ninguém valorizou tudo o que nos deu quando dele precisámos.
    ~CC~

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    1. Também eu tenho "débitos" a 3 ou 4 alfarrabistas de qualidade: Tarcísio Trindade, Almarjão... pelo muito que me trouxeram.
      Uma boa tarde!

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