Do século XVIII português, tirando os poetas que integravam os antigos manuais escolares (e nem todos) ou de primeira linha literária (Correia Garção, Cruz e Silva, Nicolau Tolentino e Bocage), a maioria dos restantes, ainda que estimáveis, desapareceu na voragem do tempo e da memória. Está neste caso, o portuense Bernardo António de Sousa ( 1758-1791? 1797?) que, por ser padre e secretário do Bispo do Porto e os seus versos serem profanos, adoptou o pseudónimo de Belmiro, Pastor do Douro para não ter problemas com a censura e a religião. Era um amante de rios (Leça, Vouga, Tejo, Mondego, além do Douro, surgem nos seus poemas) e de pastoras, ainda que talvez platonicamente, e não de forma tão crua como o Abade de Jazente (1719-1789) fez com a sua Nize (Inês da Cunha), de carne e osso, e algo caprichosa como referem alguns dos seus sonetos.
Os versos do eclesiástico Bernardo A. de Sousa eram suaves e brandos, gozando da estima dos leitores, como atestam as três (ou 4?) edições das suas poesias, maioritariamente sonetos e odes. Cite-se do II tomo, a páginas 51, literalmente e em grafia da época, este soneto de raiz conimbricense:
No tempo em que as travêssas Lavandeiras
Molhando a branca roupa no Mondego,
Estão com natural desassocego
Entoando modinhas Brasileiras;
Sentado sobre a Ponte horas inteiras
As escuto feliz, e com socego:
A dôr foge de mim, e até não chego
A sentir o grilhão de vis canceiras.
Suspende o meu tyrannico Destino
As funestas idéas, que supporto,
Nem nas próprias desgraças imagino.
Tão embebido fico e tão absorto,
Que não me lembra ao menos, bom Jozino,
Que estou, ha quasi hum mez, fóra do Porto.
Os meus dois volumes dos Versos de Belmiro... são da segunda edição, impressa em 1814, tendo havido uma terceira, rolandiana (1825), a que um sobrinho (António Vicente de Carvalho e Sousa) do poeta portuense viria a acrescentar, mais tarde, um 3º volume, creio que de inéditos.
Quem se lembrará hoje de Belmiro?
Não me é estranho este Belmiro como pseud., mas nunca o li.
ResponderEliminarBom domingo!
É, pelo menos, um poeta estimável e tem alguns versos "frescos" e originais.
ResponderEliminarRetribuo cordialmente.
Gostei muito do soneto. Resto de Bom Domingo!
ResponderEliminarÉ muito simples e fresco, na verdade.
EliminarRetribuo, cordialmente.
Bem gostava de conhecer alguma coisa escrita por ele sobre o Rio Leça, dado não ter possibilidades de ter nenhuma das obras.
ResponderEliminarSerá que as lavadeiras serão contempladas ?
Não refere lavadeiras no Leça.
EliminarMas há 2 referências em 2 sonetos, meramente indicativas, no tomo I (pgs 40 e 41):
"Não passa dia algum, que reclinado
Sobre as margens do Leça fugitivo, ..."
e
"Como vás, caro Leça, murmurando,
Por entre a verde rama dos salgueiros!..."
HMJ dará cópia dos sonetos via email.
Uma boa noite.