quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Uma velha balada escocesa medieval


Esta antiga balada celta, Lord Randall, levada por emigrantes escoceses para os E. U. A., acabou por ser ajustada instrumentalmente, adaptada e integrada no folclore norte-americano. Entre vários, foi interpretada pelo cantor Harry Belafonte. É referida, em América dia a dia (Arcádia), por Simone de Beauvoir que a ouviu, numa das suas deslocações por terras americanas.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Apontamento 87: Passeios por Lisboa - 2



Há algum tempo que me falaram do “baralho” em epígrafe. Eu explico. São uns cartões com sugestões de passeios por Lisboa, a pé ou de bicicleta. Na altura, fiquei com as antenas no ar, mas não perguntei mais. Estava com receios de ser mal interpretada, insinuando querer candidatar-me a um presente.

Recentemente, com as minhas passeatas por Lisboa, veio-me, novamente, a sugestão das ditas cartas. Hoje, lá as comprei e, sublinho, que não foi fácil. Mas não as utilizei ainda.

Estava, hoje, prevista uma incursão numa zona completamente afastada dos meus horizontes. Telheiras ! Para ver a nova livraria, com livros em alemão. O dia até convidava e lá fui, na ida de Metro, porque o regresso já o sabia de autocarro até ao Campo de Santana. A rua da livraria poucos conheciam, até vários taxistas não se descoseram. Teriam medo que pedisse a deslocação com um percurso tão pequeno ?

Sobre a livraria não me pronuncio, porque se dedica, sobretudo, ao livro escolar, certamente para abastecer a Escola Alemã próxima. Descobertas de livrarias, ultimamente, só uma. A Bittner, em Colónia.

No entanto, aproveitei a zona ajardinada à volta, no meio de umas construções de duvidosa estética. Lá estavam umas hortas.


Concluindo a minha volta, vi uma igreja com um nome fora do comum: Nossa Senhora da Porta do Céu.

Pouco a pouco, lá irei dar conta de alguns recantos que vou descobrindo nesta Lisboa, fugindo a tal “auto-estrada dos formigos forasteiros” que conspurcam certas zonas centrais da capital.

Post de HMJ

A par e passo 173


O poeta desperta no homem por um acontecimento inesperado, um incidente exterior ou interior; uma árvore, um rosto, um assunto, uma emoção, uma palavra. E, depois, é uma vontade, de expressão que começa à partida, uma necessidade de traduzir o que se sente, mas de súbito é, ao inverso, um elemento de forma, um esquisso de expressão que procura a sua causa, que busca um sentido no espaço da minha alma... Observem bem esta dualidade passível de entrar em jogo: por vezes qualquer coisa quer ganhar expressão, por vezes, algum meio de expressão quer ganhar um sentido.

Paul Valéry, in Variété V (pgs. 160/1).

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Perdido


Perdido é um conceito amplo. De largo espectro, raramente trágico. Aqui há uns anos, perdi-me em Colónia (Köln), mas mesmo sem pedir informações, consegui reencontrar-me. Não foi grave, nem muito demorado.
Mas hoje foi diferente e eu apenas servi de mera bússola  na reorientação de um ser humano. Conheço-o de vista, tem aspecto mais ou menos cuidado, barba pequena, andar concentrado. A mulher, talvez octogenária, é que já não parece deste mundo...
Pois, hoje de manhã, quando despejava lixo no contentor dos papéis e cartão, ouvi chamar. Olhei e vi, numa janela dum rés-do-chão, o tal sujeito. Fiquei, então, espectante e ele perguntou-me, bem alto: "Que dia é hoje?" Passada a minha surpresa, respondi-lhe: "É Segunda-feira!" E vendo que não era suficiente, acrescentei: "29 de Agosto."

Do rifoneiro castelhano (4)


El que de aire empreña, qué ha de parir sino vento?

( Aquele que pelo ar emprenha, que há-de parir senão vento? )

Memória (111)


Para mim, de algum modo, o mês de Agosto ainda é a Póvoa de Varzim, muito embora não a frequente na pele de veraneante, há mais de quarenta anos, neste mesmo mês.
Mas este prospecto desdobrável, em imagem, é dessa época recuada em que as casas não ultrapassavam os três andares, tirando o ex-Palace Hotel;

os restaurantes de qualidade contavam-se pelos dedos de uma mão e havia apenas duas livrarias e dois cinemas: o Garrett e o Póvoa-Cine. Uma vila pacífica e tranquila, mesmo no pino do Verão, apesar de lá desembocarem muitas famílias minhotas e de Trás-os-Montes.
O autor do texto de apresentação (Vasques Calafate) apresenta um apelido próprio da vila piscatória, muito comum, na pertença familiar da actividade de algum dos seus avoengos.


domingo, 28 de agosto de 2016

Interlúdio 56


Que não seja só pelas piores razões que hoje nos lembremos do Brasil...

Carnes


Ora, talvez por fastio de vegetais, frutas e verduras, por volta de 2 milhões de anos A. C., o homo habilis, nosso longínquo avô, principiou a esburgar a carcaça de alguns animais. E gostou.
Das vacas loucas recentes aos antigos cavalos vertiginosos dos tártaros (século XII), que permitiam recozer os bifes no seu dorso, vai toda uma história gastronómica do uso da carne na alimentação humana.
Sempre julguei que tinham sido os GI a levar o hambúrguer para os Estados Unidos, depois da II Grande Guerra. Mas L'Obs clarifica que foi no final do séc. XIX, levado por emigrantes alemães. Assim seja!

sábado, 27 de agosto de 2016

Para se ir ouvindo...


Compostas por Beethoven entre 1819 e 1823, as chamadas Variações Diabelli são o fruto  de um desafio que o compositor austríaco Anton Diabelli (1781-1858) lançou a vários colegas seus contemporâneos, no sentido de desenvolverem o tema nuclear de uma sua valsa.
Beethoven correspondeu com 33 variações. Peça musical que alguns consideram quase tão importante como as Variações Goldberg, de Bach. Brendel, no alto da sua competência, escolhe-as como uma das suas obras favoritas. E até lhes encontra humor (coisa que, com a minha ignorância musical, eu não saberia dizer.).

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Bibliofilia 136


Vou referir vários poetas, tenham paciência...
A minha opinião sobre Teixeira de Pascoaes (1877-1952) foi sempre um pouco ambígua. E a leitura dos seus poemas poucas vezes me entusiasmou. Menos ainda a sua prosa. E, se Eugénio de Andrade pouco me falou dele, é bem certo que vários textos admiráveis escreveu sobre o Poeta do Gatão. Como alguns também escreveu Cesariny. Poetas que eu aprecio e cuja opinião costumo ter em conta.





Também Jorge de Sena lhe dedicou estudos com a sua habitual agudeza crítica, gabando-lhe o estro, com algum entusiasmo. Mas nem sempre podemos coincidir nas afinidades electivas. Também Sena estudou Florbela com devoção e eu nem por isso lhe consagro a minha adoração, muito embora, em arroubos de juventude eu gostasse de ler os seus apaixonados versos. Como a José Régio também, aliás. Ambos, ousaria eu dizer, devedores ou familiares, se não dos temas, pelo menos do tom exclamativo de Junqueiro que, na adolescência, muito frequentei...



Os livrinhos, que ora se apresentam, são o fruto da dedicação que o poeta vimaranense Guilherme de Faria tinha por Teixeira de Pascoaes, impressos em 1924 e 1925, com mimosos cuidados estéticos e pequena tiragem de muito boa qualidade. D. Carlos, em tiragem especial, custou-me, nos anos 80, Esc. 1.900$00. Os restantes fui-os comprando por cerca de metade do preço, em anos posteriores.


Por curiosidade, posso informar que a caricatura de Teixeira de Pascoaes, que encima este poste, é da autoria do também poeta, de origem moçambicana, Rui Knopfli.

Aprender com...


Destas breves perguntas a Alfred Brendel, algumas coisas se ficam a saber. Que as Variações de Diabelli, de Beethoven, são uma das obras preferidas do Pianista. Que as composições musicais de Schubert têm um trajecto mais contraditório e imprevisível, enquanto as de Beethoven têm uma estrutura mais lógica...

quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Contributo do Arpose para a "Silly Season"


Sobre a Burkini Farsa não falo. Ao que parece o país africano mudou-se geograficamente para a Córsega.
Por outro lado, numa cacofonia deslumbrante, a rapaziada imberbe das redes sociais não fala de outra coisa. E até o mal-encarado bochechudo do Público, que não faz a barba todos os dias, gastou uma crónica com o momentoso problema...
Não escapando à geralada, aqui estou eu, obliquamente, a perder o meu tempo com um poste.
Chamem a Polícia!

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Apontamento 86: Passeios por Lisboa




Com o bilhete dos transportes públicos carregado, dá-me, por vezes, vontade de apanhar um autocarro e cirandar pela cidade. Não gosto muito do Metro, porque não se vê nada da cidade.

Ontem foi o dia em que escolhi a carreira de propósito, o 759, se não me engano. Ia do Terreiro do Paço até à estação Oriente, passando por toda a zona oriental que mal conheço.

A primeira parte do percurso tornou-se um pouco cansativa, com uma serigaita – julgando-se senhora – a animar com voz alta todo o autocarro. Confesso que dispenso este tipo de banhos de realidade, com criaturas em idade escolar sem qualquer verniz civilizado. Há muito que não experimentava essa desagradável sensação da inutilidade do esforço de educação, e fiquei incomodada.

Passando Xabregas e Chelas, o ambiente no autocarro sossegou. A partir daí deu para olhar pelo Bairro da Encarnação, a pensar numa velha amiga, e tentar descobrir qual a parte antiga dos Olivais. Eis-me chegado à estação Oriente. Uma nova cidade dentro da cidade, sem dúvida.

Não fosse a primeira passagem pelos “bairros do chinelo”, daria o tempo por bem empregue. Assim, ficou-me a velha azia de um ambiente escolar desgastante sem grandes contributos educacionais.

Hoje, pela força da publicidade de J. Avillez, lá fui espreitar o novo espaço, sobretudo para saber o que a mercearia vendia. Ficou-me a impressão de o fotógrafo ter conseguido aumentar imenso o espaço nas imagens publicadas em jornais. A mercearia não merece o nome e, sobretudo, não se aconselha pelos preços exorbitantes. Um pacote de chá custa lá mais 2.00 euros do que 100 m abaixo, numa loja de cafés.

Mas, lá estava muita gente a experimentar “a novidade”.



Ora eu tinha escolhido o velho “1º de Maio”, quase vazio, para almoçar, e ainda bem. Pela comida e pelo sossego.

Post de HMJ

Recuperado de um moleskine (24)


Havemos de nos conformar com isso.
Entre aquilo que dizemos e o que omitimos vai, quase sempre, a distância da intimidade humana, que nem todos merecem. Por excessiva leveza, por desatenção, ou por desconfiança nossa. E porque muitas vezes um segredo, com o tempo, não foi merecido por quem o acolheu. Há pessoas que, tendo entrado intensamente nas nossas vidas durante alguns anos, desaparecem como por encanto, de repente, para sempre, como se nunca tivessem existido, nem sido tão paralelas e íntimas, em determinada idade. Sumem-se no vazio, sem deixar sinais, ou sem explicar a súbita retirada e o silêncio definitivo. Houve, talvez, alguma coisa que se quebrou, por dentro delas. E nós, divididos, não ousamos um contacto que se pode vir a traduzir por um incómodo recíproco.
Tive hoje três encontros daquilo que chamo: alta intensidade humana. Em que a sinceridade se expõem no seu mais alto grau, em que o tom é totalmente verdadeiro e nu de artifícios. Em que a atenção recíproca é essencial. Sai-se destes encontros mais purificado e reconciliado com a vida, mesmo que os motivos nem sempre sejam felizes. Num dos casos, o cenário até era picaresco e o encontro foi pontuado de sorrisos. Para não dizer gargalhadas, porque o interlocutor era um narrador talentoso da sua própria biografia. Um pouco ao jeito de um Fernão Mendes Pinto (oral), e que, se não contou da Ásia, falou das Áfricas (Moçambique, Guiné, Gâmbia e Mali), que eram o pano de fundo das suas peripécias de anos mais recentes... 
Nos outros dois encontros prevaleceu a sombra fatal de desencontros humanos, como motivos essenciais, no diálogo narrativo. Separação e destruição recíproca entre seres, ainda que involuntariamente. Até porque, muitas vezes, sem saber, fazemos mal aos outros. Com a mesma despreocupação e indiferença com que matamos uma mosca ou uma formiga, quando se cruzam connosco.

2 poemas de Mariana Finochietto (Argentina, 24/1/1971), traduzidos


Por uma vez
ou outra,
eu nomeio
as coisas
como a dar-lhes
alma.

As cadeiras,
as janelas,
a sombra difusa
do salgueiro
existem
porque as digo.

Às vezes
as coisas
recusam-se
a entrar
no jogo.

E eu pareço
um deus
confuso
e abandonado
a um punhado
de palavras vãs.

...
...

Por alturas de uma certa
idade, nós, mulheres
caminhamos pela margem
do sarcasmo
com um equilíbrio
natural.

Com a cortante
sabedoria
da linguagem
mantemos a distância
exacta,
imprescindível.

Já o sabemos,
há que proteger
o coração
e apenas temos
esta sólida
parede
feita de palavras
e de lágrimas.
 


Mariana Finochietto, in Cuadernos de la breve ceguera (2015).

Vivaldi, no dia de S. Bartolomeu


para Maria Franco, no seu dia (creio...), com os melhores votos.

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Da geometria


Até há poucos anos, neste Verão outrabandista, dois ou três morcegos faziam a sua aparição, ao cair da noite, como se a anunciá-la. E o seu voo era num trajecto ovalado, num bater de asas curto, frenético e repetitivo. Deixaram de aparecer, ultimamente.
Ao começo da noite, as andorinhas têm um voo mais desordenado, embora o seu ponto de partida e chegada coincida com o ninho, num beiral. Rarissimamente pousam noutro sítio. Enquanto há luz, porém, descrevem, no seu bater de asas trémulo ou nervoso, quase sempre círculos ou ovais de voo.
Só os pequenos pardais é que se projectam numa recta, que parece infinita, no seu voar, em bando ou singular.
Das pombas, falarei noutro dia...

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Gulodices


Matinalmente, eram as Línguas-da-Sogra e os Barquilhos, as guloseimas de praia, no mês de Agosto. Suaves e talvez não muito calóricos. Mas, de tarde, vinham os gelados Rajá (eu preferia os de ananás), as Sameiras (laranjadas) inicialmente e, mais tarde, a refrescante e deliciosa Laranjina C, de boa memória. E para acompanhá-los, uma Bola-de-Berlim, quase sempre com creme. A meio da adolescência, fixei-me definitivamente nos Mil-Folhas, que obrigavam a prodígios de equilíbrio para que o creme não caísse...
Ora, fiquei pasmado que este último bolo só tivesse sido inventado em 1867. Mas é o que nos diz o último L'Obs (nº 2702), referindo também as datas de criação de alguns outros bolos famosos.

para MR, que se costuma  pelar por estas gulodices..:-)

Citações CCXCIV


O homem é a única criatura a mostrar, em simultâneo, um certo desgosto pela vida e um desmesurado desejo de existir: despreza a vida, mas teme o nada.

Alexis de Tocqueville (1819-1856), in Democracy in America.

domingo, 21 de agosto de 2016

Apontamento 85: Produtos da Terra



Embora correndo o risco de reincidir na temática, reafirmo o meu gosto pelas idas ao mercado e a compra de produtos frescos.

São, certamente, saudades desse quintal, já mítico, de média dimensão, que nos abastecia de batatas, hortaliça e fruta. No entanto, também não esqueci o trabalhão, que era, e o saber próprio para produzir e, de seguida, arranjar e conservar o necessário para o Inverno.

Assim, lá fomos nós, mais uma vez, a Almoçageme, mirando e comprando os produtos da terra reproduzidos acima. Desta vez, o objectivo era comprar rainhas-cláudias para as conservar em calda e para acompanhar a sericaia, pois considero o preço das ameixas de Elvas quase obsceno: 8,50 euros para um frasquinho de 8 e 10 ameixas ! A minha calda faz o mesmo e o resto do líquido ainda deu para doce de rainhas-cláudias, a pensar no próximo Inverno.



Como encontrei uns feijões amarelos – “feijão de cera”, como se dizia na minha juventude – preparei-os para acompanhar o nosso almoço de hoje.




E de fruta está a casa cheia !

Post de HMJ

Natureza morta outrabandista


Derrama-se a figueira em braços retorcidos. Angustiosos - diria eu -, e na horizontal quase, porque raramente sobem muito alto, tal como os das oliveiras que por aqui abundam, por entre pequenos muros derruídos.
Por estes restos de subúrbios não urbanizados, são vestígios das frondosas quintas anteriores, que sobraram nas margens de baldios desprezados e sujos. Árvores abandonadas por um tempo novo que já não quer saber delas para nada.
E de que ninguém se dá ao trabalho de colher os frutos, que elas vão continuando a produzir, diligentemente.

sábado, 20 de agosto de 2016

A terna convivência...


E, por favor, não liguem ao manguito do orangotango. Porque não foi intencional...

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Da leitura (15)


Se nos dermos ao trabalho, como eu fiz nestes últimos dois meses, de (re?)ler Os Lusíadas, pelo menos, chegaremos a uma sucinta e pragmática conclusão: todos os impérios acabam, por mais grandiosos que tenham sido.
Também, depois da leitura e para sermos justos, ficaremos assombrados com os conhecimentos prodigiosos de Camões: de ordem histórica, geográfica e humana, de mitologia e antiguidade clássica, reunidos num simples homem. Que, porém, tinha mundo... e não pequeno.
Não recomendarei a ninguém este exercício de leitura, apesar de valer a pena. Estes desejos, ou vêm com a idade, ou não vêm nunca. Mesmo que sejamos portugueses que, na sua maioria, infelizmente, preferem ler e folhear tijolos, nos transportes públicos. Calhamaços que são totalmentes inúteis e muito mais indigestos.

Dia Mundial da Fotografia

Será sempre injusto citar um em detrimento de outros fotógrafos que enobreceram a sua arte, hoje, em que se comemora o dia da fotografia. Mas esquecer "O Beijo" (1950), de Robert Doisneau (1912-1994), seria imperdoável, embora digam que o instantâneo teria sido encenado.



Como também preparada terá sido, segundo a lenda que corre, a fotografia da morte do republicano espanhol combatente, tirada por Robert Capa (1913-1954), durante a Guerra Civil. Emblemáticos são os retratos que o cubano Alberto Korda (1928-2001) tirou a Che Guevara, um dos quais viria a servir de base a tantos posters. Mas também nele há pose...

Naturalmente realista e não encenada, mas muito menos conhecida, é, porém, a foto tirada pelo médico e jornalista columbiano Reginaldo Ustariz Arze, a Che Guevara, na sua mesa de morte, que aqui reproduzo. 

Às visitas do Arpose, lanço o desafio de escolherem, mesmo que silenciosamente para si, a(s) sua(s) fotografia(s) preferida(s). Será apenas uma questão de exercitar, a preto e branco, a memória visual...

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Retro (87)


Não costuma ser usada a expressão postal de amor, consagrada que está a generalização de cartas de amor para classificar este tipo de missivas mais ou menos ardentes. Mas é, na verdade, um postal de amor este que o Júlio Mendes remeteu à Anna, de Monte Real, há cerca de 98 anos (29/8/918).
Contém alguns erros ortográficos, o postal apaixonado, mas perdoe-se o facto pela vulcânica emoção que o terá ditado. Quem sabe, se num Agosto tão ardente quanto tem sido este de 2016... Terá este amor frutificado, como o Júlio pretendia? São coisas que eu nunca saberei, mas imagino que sim. Para bem de todos...


quarta-feira, 17 de agosto de 2016

The Piano Guys, com algumas reservas...

Se nos abstrairmos da base religiosa (natalícia) da música e dos efeitos sensacionalistas do cenário; bem como das expressões forçadas do violoncelista, que mais parece um actor cabotino de terceira ordem, tirando isso, parece-me que a música e o vídeo ainda valem a pena.

Impromptu (27)


De súbito, reparo que o azul do rio é muito mais intenso do que o do céu. Estranhamente pálido, para esta altura do ano. Como se fora de Outono, por onde as cores começam a desmaiar.
Ou será que os incêndios extintos pincelaram o ar de um estranho cinzento? Que, de alguma forma, diluiu a vivacidade e força do azul de Verão.

Curiosidades 57


É sabido que Fernando Pessoa gostava de escrever de pé, preferencialmente, sobre uma escrivaninha alta. O que eu não sabia é que Balzac preferia escrever deitado, na sua cama; aliás, como Proust.
Entretanto, Edmond Rostand optava por reclinar-se na sua banheira, para dedicar-se à escrita. E Colette não dispensava o papel azul para melhor efabular. Mas, pela fotografia, devia escrever sentada, prosaicamente...

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Adagiário CCLVIII


Quando o pardal tem fome, vem a farinha.

Do cancioneiro tradicional castelhano (2)


Negra tenho a cara,
preto o coração,
como o amor é fogo
tornou-se carvão.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Memória (110) : Sinatra e Armstrong


Em tom neutro, para desdramatizar


Ao que parece, presentemente em Portugal, publicam-se 14.000 livros, em média, por ano.
No mesmo comprimento de onda, em entrevista recente ao DN, a editora Bárbara Bulhosa, da Tinta da China, referia: "Está instalada uma máquina de fazer livros que tem muito pouco a ver com literatura."
Agora atente-se seriamente nestes títulos prodigiosos, editados nos últimos meses:
- A livraria dos finais felizes.
- A vida é fácil, não te preocupes.
- Só no escuro podes ver estrelas.
- As memórias do nosso amor.
- A gravitação do amor
- Viver depois de ti.
- O teu rosto será o último.
- Deixei-te ir. (Este pede meças a algumas obras da sra. Rebelo Pinto.)
Em sintonia com a prodigiosa imaginação destes títulos, eu não deixaria de premiar e louvar a originalidade de alguns nomes de Blogues. Destaco três, ao acaso:
- Moro em um Kinder Ovo.
- Amo-te mil milhões.
- A vida em azul cueca.
Abençoada silly season, que nos faz esquecer o essencial e não nos deixa sofrer!

domingo, 14 de agosto de 2016

Gratidão


Pela crueza ardorosa dos incêndios, nem a silly season apetece.
Espreita-se a manhã a medo e é sempre o céu limpo ameaçador, o silêncio de não haver vento que traga nuvens, os acima de 30º, inclementes, um cheiro a fumo que vem no ar, sem origem visível.
E, depois, os exaustos bombeiros incansáveis, que só irão para o Algarve, se lá forem necessários...
Uma palavra de gratidão para os países que responderam, solidariamente, ao pedido de ajuda do poder político português. Há que nomeá-los, para que conste: Itália, Marrocos, França, Itália e Rússia.
(E a Europa aqui tão perto!?...)

A par e passo 172


Na verdade, um poema é uma espécie de máquina capaz de produzir o estado poético através de palavras. O efeito desta máquina é incerto, porque nada garante a sua acção sobre os espíritos. Mas, qualquer que seja o resultado e a sua incerteza, a construção da máquina exige a solução de uma quantidade de problemas. Se a palavra máquina vos choca; se a minha composição mecânica vos parece grosseira, queiram notar que a duração do elaborar de um poema, mesmo que seja curto, pode absorver o trabalho de anos, enquanto o efeito de um poema sobre o leitor durará apenas alguns minutos.

Paul Valéry, in Variété V (pg. 159).

sábado, 13 de agosto de 2016

Revivalismo Ligeiro CCXXXVI

Animosidades poéticas


Para além de grande poeta e Nobel da Literatura (1956), Juan Ramón Jiménez (1881-1958) era um homem austero e rigoroso. Que, na sua plenitude humana, não escapava a ter algumas antipatias viscerais. Esses ódios de estimação compreendiam Gongora, falecido há muito, mas também Pablo Neruda, ainda vivo quando o poeta do Moguer compôs este dístico acerbo, matando assim dois coelhos de uma só cajadada:

La antigua juventud gongorica
que tornado se ha nerudataria.

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Do rifoneiro castelhano (3)


Quien no sabe el arte, cierre la tienda.

(Quem não sabe da arte, que feche a loja.)

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Apontamento 84: Quando o insólito acontece ...



Por feitio e, também, convicção profunda, sempre advoguei, enquanto prestadora de serviço público de educação, que a discrição e boa educação evitam muitos problemas desnecessários com os nossos concidadãos.

Assim, recordo-me bem da canseira diária de batalhar nas formas de tratamento em Português, combatendo a tendência nefasta de chamar “Você” a pessoas que não conhecemos de lado nenhum, e sublinhando a obrigação do cumprimento desta regra básica para qualquer serviço público.

Ora, já posta em sossego, fui objecto de uma tratamento indevido, por parte de uma criatura de uma instituição bancária que, embora abrindo a conversa, “puxando” para o título académico do cliente, resolveu infringir, de seguida, a norma superior de tratamento em Português, num discurso pobre em que tentava explicar a “Você” o que se resumia numa mais que evidente falha do respectivo Banco.

E como não há dias sem assunto, nomeadamente numa cidade como Lisboa que, pelo espaço reduzido já se encontra “exausto” de tanto forasteiro, meterem-me em mais um episódio insólito sem pedirem o meu consentimento.

Num espaço anódino de “Let’s copy”, para os lados das Amoreiras, estava à espera de vez e  a assistir, na televisão, ao infortúnio das reportagens, sem fim, dos incêndios. Dirigiu-se uma senhora, sem eu ter feito nada para que ele entrasse no meu espaço de sossego e discrição, estrangeira pelo sotaque – porventura francesa – a berrar contra os incendiários, e também os terroristas – muçulmanos em França – afirmando que não se podia ser simpática com semelhante gente, a saber, incendiários de motivações diferentes. Disto passou a invocar que o país – certamente este donde estava a falar – não aguentava esta gente, porque tinha pedido muito dinheiro emprestado à Europa e que não estava em condições de pagar.

Quando, sobre a parte final, tentei dar a minha opinião de que a “narrativa” da dívida portuguesa estava a ser mal contada, tanto aos nacionais como aos estrangeiros por certas forças internas e externas, a senhora surpreendeu-me com uma pergunta que nem os meus mais próximos algumas vezes me colocaram. “A Senhora votou nas últimas eleições ?”.

Ora, antes que saísse da minha discrição, por ora paciente, para esclarecer devidamente o assunto, dirigi-me ao balcão ao lado, porque chegara a vez do meu atendimento.

Com mais este episódio, confesso que já me cansa tanto forasteiro balofo, incivilizado e convencido que, ao fim do dia, só encontrei, nesta zona de invasão abusiva de turistas, um espaço de sossego. Descobri o largo da igreja das Chagas, na imagem acima, por enquanto fora dos "carreiros" dos enxames turísticos.

 Post de HMJ

De Philip Glass, o Estudo nº 9 para piano

Siegfried Sassoon (1886-1967)


They


"Quando os rapazes regressarem" - disse o Bispo
- "não serão os mesmos; porque vão lutar
por uma causa justa: hão-de levar até ao fim
a guerra contra o Anti-Cristo; e o sangue dos caídos
dará origem e lugar a uma nova geração e raça,
porque desafiaram a morte, olhando-a face a face."

"Não somos já os mesmos" - responderam os moços.
"Porque George perdeu ambas as pernas; Bill cegou;
o pobre do Jim está afectado dos pulmões e quer morrer;
e o Bert ficou sifilítico; não se há-de encontrar
nem um só dos moços que não tenha mudado."
E o Bispo disse: "São insondáveis os caminhos do Senhor!"


Nota pessoal: apesar de ter combatido na I Grande Guerra,  o poeta inglês Siegfried Sassoon foi um pacifista militante; muitos dos seus poemas são sátiras pungentes contra a Guerra.

quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Pessoal e intransmissível


Matinalmente, hoje, ao fazer a minha ronda pelos blogues que frequento (três deles em que não me inscrevi como seguidor), num deles deparou-se-me a imagem de 16 lombadas em que nitidamente se poderiam ler os títulos e os autores. Quase ao centro, uma coisa que tinha por título Lava Jato, de Vladimir Netto. E perguntei-me como é que uma pessoa culta, ilustrada e com mundo, comentador em vários canais televisivos, se dispunha a perder tempo com um livro destes... Eu sei que eram leituras de férias, silly season para todos os efeitos, mas que diabo!... Depois, humildemente, reconheci que cada um tem direito às suas fraquezas e a gastar o seu tempo de forma perdulária ou inútil, como quiser, enfim. E meti a viola ao saco...
Muitos me poderão verberar a escolha de O Labirinto de Castang (nº 644, da Vampiro), de Nicolas Freeling, autor que é a minha última coqueluche em matéria de policiais. Porque escreve bem, pensa, divulga factos interessantes sobre países (Holanda, França, Alemanha e Inglaterra, sobretudo) e, embora a intriga policiária não use o cânone clássico (ver S. S. van Dine), o interesse, para o leitor, mantém-se constante ao longo da narrativa. Juntaria, se me fosse de férias, o Je déballe ma Bibliothèque, de Walter Benjamin, que já tem outra consistência, e obra a que já vou a meio, na leitura. Bem como Tristão, de Thomas Mann, numa tradução partilhada de Fernando Lopes Graça, editado pela Inquérito. Seriam estas as minhas leituras de férias.
E quanto a local onde me apeteceria estar, como não tenho, e não há paraísos artificiais, só desejava que não fosse este nosso país devastado pelos fogos.


para MR, com uma piscadela de olho, e renovado agradecimento.

terça-feira, 9 de agosto de 2016

Em tempo, ou da infelicidade de ter um incêndio particular


Não lhe sofremos directamente os malefícios, mas já nos bastavam os fogos na TV...
Atrás da terceira grande chaminé, à direita, a nuvem cinzenta diluída até parece o fumo dum vulcão.
Não é, é mais um incêndio, algures entre o Barreiro e Palmela - que não merece palavras ou comentários piedosos, nesta fornalha de Sol que foi o dia.

Citações CCXCIII


Para conseguir manter os seus erros reduzidos ao mínimo, o Censor íntimo a quem o poeta submete o seu processo criativo, deveria ser uma espécie de comité de Censura. Que conviria incluir, por exemplo, uma criança sensível, uma dona de casa pragmática, um monge, um bobo irreverente e até talvez mesmo, o mais detestado por todos os outros - que lhe hão-de consagrar um enorme desprezo -, um brutal sargento fala-barato e bronco que considera toda a poesia um perfeito e inútil desperdício.

W. H. Auden (1907-1973), in Writing (1962).

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

domingo, 7 de agosto de 2016

Beethoven : "Andante com variações..."


Uma fotografia, de vez em quando (85)


Nascida em Berlim, a fotógrafa alemã Marianne Breslauer (1909-2001) teve uma carreira profissional relativamente curta de cerca de uma dúzia de anos, muito embora tenha deixado uma obra de consistente qualidade, ainda hoje reconhecida.
Fez a sua aprendizagem em Paris, com Man Ray, tendo depois colaborado intensamente em diversas revistas germânicas, em finais dos anos 20. Com a ascensão do nazismo, transferiu-se para a Holanda onde veio a conhecer e casar com o marchand Walter Feilchenfeldt. Por alturas da II Grande Guerra passou a residir na Suíça, abandonou a profissão de fotógrafa, tendo-se dedicado, por inteiro, à sua galeria de arte. Morreu em Zurique, a 7 de Fevereiro de 2001.


sábado, 6 de agosto de 2016

Apontamento 83: Desilusão



Embora correndo o risco de me repetir, sublinho que não acredito na inocência da criação literária, mas também não encontrei isenção nos campos da ciência ou até do desporto, tão em voga nos nossos dias.

Felizmente, pertenço ainda à geração dos praticantes de desporto, de diversas modalidades, nos vários graus de ensino, muito antes de entrarmos nesta “nova religião da actividade física”, com imposições de moda, formas de estar e pensar.

Assim, livrei-me deste novo “ente” todo-poderoso desportivo, e também não me obrigaram a jogar futebol, como não impuseram aos meus colegas masculinos a prática de “ballet”.

Dito isto, entendo que atrás de uma ideia salutar do desporto se instalou todo uma indústria, formas de vida unívocas, espiritual e material, que não aprovo nem pretendo alimentar.

E, no meio deste pântano, também se perverteu o ideal dos Jogos Olímpicos, tão em voga actualmente. No entanto, quem ler, com atenção alguns artigos, publicados no DIE ZEIT, sobre a matéria, concluirá que a pureza dos Jogos Olímpicos se desvaneceu há muito.


Bastou-nos, aqueles que como eu tiveram a tarefa de transcrever os escritos de Carl Diem – em epígrafe – o contacto com um dos obreiros do Comité Olímpico para perdermos a ilusão quanto à pureza do ideal dos Jogos Olímpicos, no passado, e, com maior razão, no presente.

Post de HMJ