O
dia começou bem para as efemérides muito especiais, familiares, com o tio Otto
a celebrar, como único sobrevivente dos Wagner, os 100 anos. Utilizou uma
palavra para se referir à proeza de alcançar a meta, que já não ouvira há muito
tempo, e que é de difícil tradução para português. Voltou a insistir que, a
partir de agora, voltaria a contar o percurso da sua vida a partir do ano 1.
Destacando-se,
desde sempre, dos restantes irmãos pela boa disposição e pelo enorme gosto pela
vida, houve quem o recompensasse por períodos de grandes sacrifícios durante a
guerra. Teve honras de uma visita do burgomestre que comentou, com o seu humor,
dizendo que o estavam a “embonecar” para o evento.
Para
além de artífice memorável na construção de móveis, era um fotógrafo
excepcional, enriquecendo o espólio familiar e, sobretudo, o meu álbum de
fotografias desde a infância até aos meus quinze anos. Tenho pena das
películas, da AGFA, que se perderam quando abandonou a sua câmara escura
instalada na cave da sua casa.
Lembrei-me,
pois, das fotos que me deixou da infância, do teatro de bonifrates que montava
em casa a contar histórias, numa casa pequena, cheia de alegria.
Por
coincidência, o dia de hoje é também o início do ano lectivo, em Colónia e no
respectivo estado. Veio-me à memória o primeiro dia de escola, com a fotografia
a preceito que, no entanto, não foi o tio Otto que ma tirou. As recordações
fixaram-se na fotografia reproduzida acima e ficou a interrogação sobre o
percurso da civilização – europeia – nos últimos 60 anos.
Confesso
que tenho alguma dificuldade em aceitar a menorização e infantilização do ser
humano, empreendidas pelas poderosas forças do consumo, a ponto de o Governo de
Portugal emitir uma brochura sobre o “Regresso às aulas” com conselhos
indigentes.
Ora,
como se pode ver pela foto, apresentei-me, no primeiro dia de aulas,
“compostinha”, sem haver necessidade, da parte do governo de então, em explicar
à minha mãe o que me havia de vestir, ou de comprar para levar para a Escola.
A
lição de chegar aos 100 anos, “são e salvo”, não passa, certamente, por essa
indigência do consumo tolo e do supérfluo em detrimento da essência. Para já, nem
sequer me rebaixo a comentar a imagem que o folheto oficial transmite dos
professores. Deixo a imagem apenas como registo de revolta.
Post de HMJ