É uma esplanada sobre a praia fluvial e sobre o rio. Quatro quarentões, por entre a sobremesa e os cafés, todos, mais ou menos amigos: o filósofo, o poeta, o editor e eu. Final de Agosto, temperatura a rodar os 30º. Folhas manuscritas, numa 5ª cadeira vazia. Diz o editor: "...os analfabetos falam por frases completas, não se expressam por monossílabos, ou palavras únicas, isoladas..." - e contou duas histórias exemplares, a seguir. Mas o filósofo quer elevar o nível da conversa e cita, a despropósito Heidegger, segundo o qual o conhecimento antecipado da morte, propiciava autenticidade (referiu, no entanto: sinceridade). O poeta não concorda, nem aconselha: "Há que ser delicado para com os outros! A sinceridade ou a verdade não são as virtudes principais do ser humano." Eu fico-me na dúvida e não me pronuncio. Dividimos a conta, pagamos, e o filósofo pede o segundo café.
O editor, que está com pressa, pegou então nas folhas manuscritas, metendo-as debaixo do braço. Ao despedir-se dos 3 amigos sentados e restantes, disparou para o nosso amigo vate: "Como queres a minha opinião crítica sobre os teus poemas?, sincera ou delicada?" E antes que o poeta respondesse, prosseguiu: "Vou ser delicado, podes crer!..." E saíu do restaurante, a sorrir, e acenando para trás. Nós ficamos em silêncio uns bons cinco minutos. E puxamos de cigarros, que fomos acendendo lentamente, para ganhar tempo e coragem para preparar as palavras seguintes...
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