quinta-feira, 30 de junho de 2011

Curiosidades 37 : etéreas, vaticanas e celestiais


Do livro "Reflexões" (já aqui referido, no Blogue) de Graham Greene (1904-1991), escritor inglês, que se converteu ao catolicismo em 1926, no capítulo "O Preço da Fé", recolhi algumas informações curiosas, que desconhecia e passo a partilhar.
a) nos anos 50 do século passado e, perante o uso de carros cada vez mais luxuosos, por parte dos Pontífices, os italianos começaram a traduzir as placas identificativas da proveniência das limousines: SCV (Stato della Città del Vaticano) por "Se Cristo Visse"(!).
b) Alexandre VI (1431-1503) que foi Papa desde 1492 até à morte, não primava pela virtude e terá tido várias amantes. A mais conhecida terá sido Giulia Farnese, esposa de Orsino Orsini. Quando Giulia quis acabar com a relação adúltera, o Papa ameaçou-a de excomunhão, se o fizesse.
c) um dos papados mais longos foi o de Pio IX (1792-1878), hoje Beato, que governou os destinos da Igreja Romana de 1846 até à sua morte, em Junho de 1878. Dizem que lançava mau-olhado. E tinha uma enorme paixão pelo bilhar.

Comparado com estas idiossincrasias, o nosso Cardeal  D. José Policarpo (estimado por mim), que tem o vício do tabaco, irá com certeza, quando morrer, direitinho para o Reino dos Céus...

Mus, Muris

Ao ler a informação, veiculada ontem num jornal económico, sobre a fuga, no passado mês de Maio, das grandes fortunas de valores mobiliários portugueses, nomeadamente de seguradoras e outros, no valor de 5,3 mil milhões de euros, recordei-me da sapiência do nosso PR. No entanto, para não aduzir afirmações levianas, entrei na página oficial da PR com o objectivo de confirmar o que ouvira. Remeto, pois, os leitores interessados para o vídeo da PR, gravado durante um encontro da COTEC, para confirmar os excertos que me pareceram mais significativos.
Reafirmando o que os portugueses já conhecem do discurso do PR, exortava os cidadãos, perante "a situação explosiva" do país, a uma postura patriótica, a saber: a) consumir produtos portugueses; b) trabalhar melhor; c) exportar mais e importar menos.
Ora, então, as grandes fortunas não são patrióticas e solidárias ? Até são ! Exportam mais capital para importar menos prejuízos. Perfeito ! Os prejuízos ficam com os "cidadãos" - auto-excluindo-se os das grandes fortunas - para trabalhar melhor e consumir produto nacional.
Com efeito, torna-se imperativo ético saber o nome destas entidades seguradoras que fogem, como os "mus, muris", a fim de o "consumidor nacional" poder distinguir entre o "produto genuinamente português" e o importado que atiça ainda mais a "situação explosiva" referida pelo PR.
Parece que as fortunas da Grécia procederam de igual modo, com os resultados à vista na ruas de Atenas. Tem razão Carvalho da Silva, da CGTP, quando afirma, por analogia, que o PR - perante determinadas "situações explosivas" - fica "seráfico e calado".
Post de HMJ

quarta-feira, 29 de junho de 2011

As cascatinhas


Esqueçam a imagem que coloquei ( e a devida vénia ao Bloguer a quem a roubei) e que apenas sirva de vaga sugestão de aquilo que eram as cascatinhas da minha infância. Os pequenos bonecos eram muito mais toscos e rudes. O cenário, como o próprio nome indica (cascata), era vertical e não horizontal - como se fora uma colina, com socalcos para os Santos e figuras, ou um pequeno altar, à porta de casas modestas. Ou pobres. E havia um ou dois ganapos, normalmente, descalços, sentados à beira, que esganiçavam a voz sempre que passava um transeunte. Gritavam: "Um tostão para a cascatinha!"
Na véspera do Santo António, na noite de S. João, hoje(-antigamente), no dia de S.Pedro. Com dez tostões podiam-se comprar muitos rebuçados, ou então 2 dropes ingleses (que eram uma tentação!) na Confeitaria Colonial, da Rua da Rainha. As cascatinhas eram uma espécie de Presépio fora de tempo. Mas para aqueles rapazitos pobres e descalços, embora católicos (fosse lá o que isso fosse nas suas pequenas cabeças), era uma forma expedita - e bonita, digo eu - de ganhar uns cobres e comprar uns rebuçados de tostão.

Metamorfoses: em geminação com o Prosimetron


As metamorfoses do Tempo. No intermédio, pode ver-se, no Prosimetron, S. Pedro e S. Paulo, de El Greco, num astigmatismo mais pronunciado de que, as bem-pensâncias, dizem que o pintor grego sofria. Será?, ou seria um estilo já moderno, para a época? A Igreja católica celebra, hoje, os 2 Santos: a Pedra e a Fénix. As crenças têm sempre a sua própria mitologia e, normalmente, também respeitam a tradição.

para LB.

Citações LXX : André Malraux


"O museu separa a obra do mundo "profano" e aproxima-a das obras opostas ou rivais. Ele é uma confrontação de metamorfoses."
André Malraux (1901-1976), in As Vozes do Silêncio

Sobre Pintura do século XX



As duas pinturas, em imagem, de Paul Klee (1879-1940) e de Paula Rego (1935), foram feitas com um intervalo de 65 anos. "Senecio", de Klee, em 1922, o quadro "Looking back", de Paula Rego, em 1987. Para mim que sou leigo, embora amador atento de Pintura, "Senecio" parece-me mais "moderno" do que o neo-figurativo "Looking back", talvez porque este último é mais transparente e parece, na sua realidade simbólica, contar uma história, ou despertar imediatas sugestões a quem o observa. A informação a propósito deste óleo sobre tela, de Klee, diz-nos que é baseado no retrato do artista Senecio, vestido de Arlequim. O quadro de Paula Rego reinterpreta, de uma forma ambígua, a discreta perversidade feminina.
Cruzaram-se-me, na manhã, porque Klee morreu a 29 de Junho de 1940, e uma boa parte da sua obra foi destruída pelos nazis que a consideravam "degenerada". E o quadro de Paula Rego, ontem em leilão, atingiu um recorde em venda: 860.000,00 euros. Só ultrapassado, em pintores de origem portuguesa, por Vieira da Silva, com o seu "Lisbonne-Ville", de 1958, que foi vendido, em 2007, por: 1.100.000,00 euros. Até parece que os mercados sabem proteger, das vicissitudes, muito melhor a Pintura, do que os políticos. Muito embora os nazis não sejam um bom exemplo de princípios estéticos. Nem éticos, claro.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Lisboa, pisando a terra

Em luz, os dias ainda vão crescendo devagar. O "Aladino" piscou os olhos às 21,16, o irmão mais novo, o "Pirilampo", só deu sinal dois minutos mais tarde. As andorinhas outrabandistas vão altas, hoje, prenúncio de bom tempo. Mas ontem não as vi em Lisboa.
Vamos que a Exposição ainda não estivesse fechada, e eu não teria feito o itinerário pedestre, quase em duplicado. Também não teria ouvido por mais de uma hora, até à exaustão e para lá do que podia suportar, música bossa-nova requentada, em casa amiga. Por direitos de minoria, quase exigi, urbanamente, Elis Regina e, depois, Ella Fitzgerald, em comum acordo. Deu para respirar fundo e não ficar irritado.
Valeu depois a companhia inesperada e grata, ao jantar, na esplanada tranquila. Acabada que foi, soberbamente, a refeição, nos eflúvios de uma "Alvarinha" caseira, depois do café, cujo furor divino, e aromático, foi aplacado por uma pequena pedra de gelo - que a noite de Junho ainda estava morna e não havia vento. O serviço, a cozinha e a companhia ajudaram a esquecer a tarde. Depois, foi a pedestre descoberta, pelas ruas silenciosas e interiores de Lisboa.
Desde a loja Rosacruz, numa rua quieta, ao busto equilibrado de Wellington do pequeno Largo triangular, creio que entre a Saraiva de Carvalho e a Rua D. Dinis, muito chegado ao Cemitério Inglês, onde descansa Fielding. Mas antes, já tinhamos passado por aquilo que fora uma das casas de Garrett. Transformada, e já sem azulejos, num condomínio pardo e sem graça. De uma arquitectura baça e neutra, talvez para disfarçar o luxo das madeiras exóticas e das piscinas interiores (que um distinto ilhavense, que já foi ministro, não dispensa a água...). Até porque isto de cultura, cada um toma a que quer e sabe.
Despedimo-nos, no Rato, e eu segui e bisei, no mesmo dia, o percurso que já fizera de tarde. No Príncipe Real, para intervalar o passo já um pouco cansado, sentei-me na esplanada do Quiosque para beber o terceiro café dessa noite. A Catarina Portas terá agradecido, de forma imaterial e abstracta, a despesa. Mas eu arrependi-me: tive uma insónia dos diabos!... E parecia-me ouvir, interminavelmente, bossa-nova.

para ms, afectuosamente.

Henry Fielding / Franz Schubert / Stanley Kubrick


Em contiguidade e concordância: Henry Fielding. E, já agora marcialmente, Wellington.

Comic Relief (31) : ainda as "search words"


Às vezes, ao ver as "search words" dos pesquisadores da net e os encaminhamentos do motor Google de busca que os orienta para este Blogue, tenho dúvidas sobre a quem atribuir o maior desconchavo. Seguem alguns dos últimos disparates mais notórios.
1. as "search words" eram: "balofa úrsula disney" (imagine-se!); foram guiadas para o poste: "Economia, política e hipocrisia"!, que até incluía um poema de Sophia Andresen...
2. o conciso pesquisador escreveu: "sopro singer salieri"; pois o Google encaminhou-o para "Jogos infantis: futebol de sopro". O pesquisador deve ter ficado a bufar.
3. o investigador lançou: "o a escola tia violeta quer henrique de sousa felix" (repare-se na dúvida filosófica de género -"o a..."); levaram-no até ao poste: "Olhos violeta em tons castanhos", sobre Elizabeth Taylor...
4. agora, este último curioso, que deveria era ter feito a pesquisa na revista "Caras" ou "Nova Gente", escreveu para o motor de busca do Google: "Antonio Borges FMI passa feriados na Quinta do Lago". E, clarividentíssimo, o motor de busca empurra-o para o poste: "Estela Barbot, conselheira do FMI, troca-tintas" (Pasme-se!). Das duas, uma: ou o pesquisador era um espião da Sra. Merkel, ou a associação do Google se fez, porque ambos (o Borges e a Barbot) pintam o cabelo de loiro, para parecerem nórdicos...

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Adagiário XLIV


"É manha do açougue: quem muito fala, pouco ouve."

Divagações 9 (e em sequência de Guimarães Rosa)


Não será muito comum, ao lermos um texto simples em prosa, na nossa própria língua, não o entendermos. Mas já me aconteceu a mim, excepcionalmente, uma vez: em Mafra, a 19 de Janeiro de 1968. Após cinco dias de reclusão obrigatória e absoluta no Convento (recruta da tropa) e o início gradual do "massacre e lavagem ao cérebro" desses tempos militarizados, quando saí, na sexta-feira, ao fim da tarde, comprei sofregamente o DL ("Diário de Lisboa") e comecei a lê-lo, num Café mafrense. Apercebi-me, então, que não conseguia entender o sentido do que lia. Reconhecia as palavras, mas elas não se me organizavam em realidade, nem traduziam sentidos.
De uma forma já normal, isto mesmo pode acontecer, a outro nível, ao lermos poesia, na nossa própria língua. Conhecemos os vocábulos, mas escapa-nos o sentido do poema. Mais frequentemente, quando lemos poesia numa língua estranha à nossa, é possível ocorrerem equívocos de interpretação. Ou através duma compreensão errada, criarmos outra realidade para que se ordene, em nós, um sentido (outro?) que não estava no poema, ou no verso original, quando foi escrito. Aqui, no entanto, poderá ocorrer o feliz acaso de se ir ao encontro de uma nova realidade virtual, subjectivamente, objectiva.
Tudo isto se aproxima, perigosamente, da simbologia de Babel e das línguas de fogo do Pentecostes. Ou, simplesmente, daquilo que se denomina a ambiguidade da Poesia, para sermos mais claros.

João Guimarães Rosa


João Guimarães Rosa nasceu em 27 de Junho de 1908. Creio que é um autor de quem se gosta muito, ou não se gosta nada. Pertenço ao primeiro grupo. A leitura dos seus contos e dos seus romances leva-nos por caminhos difíceis, mas numa viagem maravilhosa. Com ele descobrimos as virtualidades infinitas da língua portuguesa, através de desmontagens e recriações das palavras, mas também pela ressurreição de antigos étimos que ele usa com um virtuosismo admirável. É como que um Joyce, sem secura, e porventura menos complexo. Por outro lado, abre-nos perspectivas novas em que sensibilidade, inteligência e um amplo domínio linguístico conduzem a diferentes entendimentos da realidade. Ou que, pelo menos, nos permitem supor outros mundos, talvez menos lógicos, mas muito mais largos e ricos de conteúdo. Mas o melhor é dar-lhe a palavra, através de um pequeno excerto de um dos quatro prefácios de "Tutaméia". Segue:
"...Menino, mandavam-me escovar em jejum os dentes, mal saído da cama. Eu fazia e obedecia. Sabe-se - aqui no planêta por ora tudo se processa com escassa autonomia de raciocínio. Mas, naquela ingrata época, disso eu ainda nem desconfiava. Faltavam-me o que contra ou pró a geral, obrigada escovação.
Ao menos  as duas vêzes por dia? À noite, a fim de retirar as partículas de comida, que enquanto o dormir não azedassem. De manhã...
Até que a luz nasceu do absurdo.
De manhã, razoável não seria primeiro bochechar com água ou algo, para abolir o amargo da bôca, o mingau-das-almas? E escovar, então, só depois do café com pão, renovador de detritos?
Desde aí, passei a efetuar assim o asseio. Durante anos, porém, em vários lugares, venho amiúde perguntando a outros; e sempre com já embotada surprêsa. Respondem-me - mulheres, homens, crianças, médicos, dentistas - que usam o velho, consagrado, comum modo, o que cedo me impunham. Cumprem o inexplicável.
Donde, enfim, simplesmente referir-se o motivo da escôva. ..."

domingo, 26 de junho de 2011

Salão de Recusados XXXVI : Academia dos Singulares


Foram inúmeras, em Portugal, as chamadas Academias, nos séculos XVII e XVIII, a maior parte delas com vida breve. Poetava-se (mediocremente, as mais das vezes) em português, em castelhano, em latim e também em língua italiana. A Academia dos Singulares foi uma das que teve vida mais prolongada: fez no mínimo 36 sessões, com discursos e abundante produção poética. Há notícia, em livro, que a primeira reunião dos vates terá ocorrido a 4 de Outubro de 1663, sob presidência de Sebastião da Fonseca e Paiva, que era mestre do "Hospital d'El-Rei". A última sessão terá, eventualmente, sido feita com presidência de André Nunes da Silva, em 19 de Fevereiro de 1665. É de António Serrão de Castro, um dos Académicos, o soneto intitulado Festas Bacanais que, a seguir, se transcreve.

Filhós, fatias, sonhos, mal assadas,
Galinhas, porco, vaca e mais carneiro,
Os perus em poder do pasteleiro,
Esguichar, deitar pulhas, laranjadas;

Enfarinhar, pôr rabos, dar risadas,
Gastar para comer muito dinheiro,
Não ter mãos a medir o taberneiro,
Com réstias de cebolas dar pancadas;

Das janelas c'um tanho dar na gente,
A  buzina a tanger, quebrar panelas,
Querer em um só dia comer tudo;

Não perdoar arroz, nem cuscuz quente,
Despejar pratos e alimpar tijelas,
Estas as festas são do gordo Entrudo.

para MR, em geminação com o seu poste, no Prosimetron, sobre a Academia dos Renascidos.

Leituras Antigas XXXIV : Enciclopédia pela Imagem

 
Esta colecção de pequenos livros, que tenho incompleta, foi indiscutivelmente a minha primeira enciclopédia, antes ainda de "Le Petit Larousse" (poste de 28/1/2011), comprado em 1959.
Os livrinhos, intensamente ilustrados a preto e branco - só as capas eram a cores - abordavam grande número de assuntos: de História a Ciências, das Artes à Literatura, etc. Comprei apenas os livros cujos temas mais me interessavam, para os tentar conhecer melhor. Eram a versão portuguesa traduzida da congénere, original, editada pela Livraria Hachette, de Paris. Embora também houvesse volumes totalmente portugueses, especializados, de temas nacionais: "As Lutas Liberais", "O Exército Português"...
No nosso país, foram editados (anos 40? 50?) pela Livraria Chardron / Lello & Irmão, Lda., do Porto. Inicialmente, os voluminhos julgo que custavam Esc. 12$50, mas foram sendo mais caros, com o tempo. Os últimos que comprei ("As Aves" e "O Nosso Mobiliário") já foram vendidos a Esc. 40$00, em meados dos anos 60 do século passado.

sábado, 25 de junho de 2011

Recomendado : quinze - um tinto de varanda


Como as saias se alternam de curtas para compridas e, na moda masculina, embora muito mais lentamente, as calças se vão alterando no corte (qualquer dia regressam as "à boca de sino" dos anos setenta), também nos vinhos se vão registando modas. Estamos, agora, em período de transição para os tintos de baixa graduação alcoólica. Depois dos alentejões e durienses carregadíssimos e pesados, como os "Bafarela" a rondar os 15º, e os consumidores a ficarem prostrados e alumbrados, eis que regressam os leves, perante a saturação. Oscilações do mercado que, se os produtores não se apercebem nem acompanham, morrem. E os vinhos deixam de se vender.
Aqui há 40 anos, vinhos tintos com 13º ou mais, eram raríssimos: lembro-me do "Garrafeira" das Caves Velhas, e pouco mais. A graduação normal eram 12º para tintos, 11/11,5º para brancos e 8/9º para vinhos verdes.
Ora, hoje, venho chamar a atenção para um vinho tinto de varanda ( como eu lhes chamo), ou de Verão, com 12º de graduação alcoólica, e saboroso. Tem boa acidez, a tender para o seco. Acompanha muito bem um prato de massas al dente, um queijinho fresco de cabra, uma omoleta de presunto. É um varietal de Sangiovese, no tocante a casta ( "sangue de Júpiter" - ver poste de 9/10/2010). Integrou a semana italiana de uma empresa de médias superfícies, com sede na Alemanha, mas com várias lojas em Portugal. Apenas um pouco de gás, dispensável, quando se deita no copo. É o único mas. E deve ser bebido já, porque não lhe auguro grande longevidade.
Eu até nem gosto de propagandear vinhos estrangeiros (que Miss Tolstoi me desculpe, se me vier a ler), quando os temos excelentes e nacionais, em qualidade. Mas este "Sangiovese Di Romagna", tinto de 2010, tem o preço imbatível de 1,99 euros. E, em Portugal, a este preço? (Hic opus...) Não há nada como provar, e aprovar, ou não.

Linhagens 12

Memórias do lado paterno: em terras do Senhor Arcebispo

Apenas separada pelo Reno, Leverkusen do lado direito e situado nos antigos domínios do Grão-Ducado de Berg, a aldeia de Merkenich, do lado esquerdo do rio e a norte da cidade de Colónia, constava já do mapa de Mercator, no início do século XVI.

Reza a história que os arcebispos não desdenhavam o poder e a propriedade dos terrenos. Recordo que o pai dizia de certas pessoas da aldeia, não sendo obviamente o nosso caso (!), que apenas tinham conseguido construir a casa "em terras da igreja". Tal desventura significava que "compravam" o solo por um período renovável de 99 anos, findos os quais, tinham que re-adquirir a terra. Pertencendo a uma família com "pergaminhos" e residência, desde o século XVIII, na aldeia, o terreno era nosso. A casa do avô paterno ficava na rua principal que, em tempos remotos, teria sido a antiga "via romana" e que ligava a Agrippina Colonia à setentrional Novaesium, actual cidade de Neuss.

No entanto, a minha vida na aldeia passou-se na casa dos bisavôs, cujo quintal confrontava com os terrenos e o edifício da Escola.

Herdei da bisavó o segundo nome, assim como a persistência de carácter, segundo constava dos anais familiares. O bisavô era, nos tempos livres, o "Kirchenschweitzer" da aldeia, uma espécie de acólito que, com manto vermelho, superintendia os serviços religiosos. Ora, uma herança católica tão pesada, nem sempre contribuiu para uma vida pacífica.
A "culpa" - ou "pecado original" - teria sido do pai que, durante a guerra, conheceu, através de "um camarada da tropa" e futuro cunhado, aquela que viria a ser a minha mãe. Para as aldeãs em idade casadoira, à espera dos soldados sobreviventes - porque da turma do pai com cerca de trinta rapazes regressaram apenas metade - a escolha paterna, fora da aldeia, tinha dois defeitos: era uma mulher bonita e protestante. Assim, da vivência na aldeia constam as "pequenas vinganças da contra-reforma" que, embora subtis, eram frequentes.  O padre da aldeia, contrariando o previsto legalmente, obrigou a mãe a tornar-se apostólica romana antes de casar, para além de ter de atestar que iria educar os seus descendentes na fé dominante nas terras do arcebispo de Colónia. Quando, aos 15 anos e em idade prevista pela lei, declarei num notário que não pretendia manter-me nas fileiras da fé católica, os pais receberam a visita do Senhor Padre, meu professor de Religião durante anos na escola da aldeia. Sem atacar, directamente, a mãe, tinha encontrado um argumento de peso. A filha tinha arranjado uma amiga pouco recomendável, outra protestante (!), filha de "gente" que invadira a aldeia no pós-guerra com a instalação de indústrias várias, nomeadamente a fábrica de automóveis da Ford.
Ainda hoje, passeando pela velha aldeia durante as férias, sou conhecida, não pelo nome, mas como filha de fulano, i.e., do João, ignorando, subtilmente, fulana, protestante e forasteira. E assim, por herança, tornei-me forasteira para o resto da vida.

Post de HMJ

Uma fábula abstracta



Este poste esteve para chamar-se, plagiando José Gomes Ferreira: " Viver sempre também cansa." Também hesitei em chamar-lhe prosaicamente, e só: O cubo de Rubik e o buraco negro. Mas como o desenho animado, de Ivan Maximov, pode ter várias leituras, optei finalmente por - Uma fábula abstracta.

Ridículas, festivas e pimbas


Passos Coelho optou por viajar em classe económica, para Bruxelas, para dar exemplo ao país. Poupança para o Estado português: zero - desde o tempo de Salazar que os membros de qualquer Governo luso são transportados gratuitamente, pela TAP. E também não valia a pena querer transpor Massamá para os altos céus. Nem havia necessidade... Mas o País agradece o nobre gesto e regista a ignorância administrativa.
A Net (Wikipedia) anota que hoje se celebra o dia do "cotonete" - rima, e é verdade. Fiquei curioso em saber quando se comemora o dia do palito, o dia da melga e da varejeira, e o dia do disparate. Será que temos de viver sempre em festa, assim feios, assim porcos, assim estupidamente consumistas? Viva o dia da Mãe!, com esse, ao menos, ainda concordo.

A Batalha de São Mamede


Celebra-se hoje o 883º aniversário da Batalha de S. Mamede, acção decisiva que viria a conduzir à independência de Portugal. A cidade de Guimarães, para comemorar o facto, consagra o dia 24 de Junho como feriado municipal. Até meados do séc. XX sempre se considerou que a Batalha teria tido lugar nas cercanias do Castelo de Guimarães, à sua rectaguarda. Na segunda metade desse século, Câmara Pina propõe, com argumentos lógicos, como local da contenda entre D. Afonso Henriques e sua Mãe, D. Teresa, "uma pequena planície não longe de S. Mamede de Aldão, no caminho de Guimarães para São Torcato." Este local situa-se a 2 ou 3 quilómetros do Castelo de Guimarães. Creio que esta tese não teve refutação, até hoje.


Revisões levianas e irresponsáveis

Pela gravidade do assunto transcreve-se do "Público" um abaixo-assinado a propósito da publicação da Obra de Eugénio de Andrade, com deficiente revisão e gralhas graves. Assim vai o mundo das edições...



Citações LXIX : George Steiner


"...O génio individual é tão visivel na história das ciências como na história da literatura e das artes, mas assume muito menos importância. A Commedia não existiria sem Dante, ou as Variações de Goldberg sem Bach. A morte de Schubert deixa espaços de sensibilidade por preencher. Isto não acontece na matemática e nas ciências. ..."
George Steiner, in "As lições dos Mestres" (pg. 206).

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Retratos (1) : Cristina de S.


Dela, e em cima da secretária, tenho um pequeno bibelot, tipo clépsidra, que viro, de vez em quando, para que se desenhem novas pequenas montanhas ou colinas. Mandou-mo pela irmã mais velha que, ao contrário dela, tem pele alvíssima e olhos claros. Cristina de S. tinha pele de um castanho clarinho e cabelo frizado. Quando a entrevistei, franzina como era, surpreendeu-me a sua firmeza, quase a rondar a veemência, a autenticidade e a confiança. Estava em vésperas de completar 18 anos, e fez-me lembrar a Elis Regina, embora a cantora brasileira fosse do signo Peixes, e a Cristina, Touro. Mas respirava-se nelas força de alma e era comum o gosto ( e devoção?) pela Nª Sra. da Aparecida.
Em dois anos e meio, Cristina de S. conseguiu poupar dinheiro para ajudar a pagar a operação que a Mãe teve que fazer. E ainda mandou comprar, lá longe, uma junta de bois - não sei como o conseguiu, porque o ordenado que recebia era bem pequeno...Mas o seu sonho era regressar ao seu País, rever o seu namorado, universitário, e abrir uma loja de roupa. A Cristina trabalhou comigo pouco mais de 3 anos: puxei por ela até onde pude e ela respondeu sempre, responsavelmente e bem, apesar de ser jovem. Depois, despediu-se de mim e da empresa, e regressou às origens.
Quando, aqui há uns tempos, a Cristiana, de pele clara, me veio trazer o presente da Cristina, perguntei-lhe por ela. Que estava bem - disse-me -, já conseguira abrir a segunda loja de roupa e estava a frequentar a Universidade. Fiquei feliz. 

Tolentino, no 2º centenário da sua morte


Há muito que se deixaram de ler, nos liceus, as suas obras. Daí que talvez passe despercebido o 2º centenário da sua morte, em 23 de Junho de 1811. Pertence à família dos grandes poetas satíricos portugueses que vem das cantigas de maldizer e chega até O'Neill e Assis Pacheco. Dizia dele próprio: "...sou homem duro / E rebelde às leis primeiras..." Mas era também mestre-escola e um pouco pedinchão, em muitos dos seus versos, porque não conseguia resistir à tentação do jogo. E também gostava muito de música. Nicolau Tolentino de Almeida nascera em Lisboa, a 10 de Setembro de 1841. Costa e Silva descreve-o assim: "Era de estatura alta, cheio de corpo, rosto redondo, pelle clara e rosada, olhos pardos, nariz regular, bocca larga e engraçadíssima, dentes bellos, andar nobre e pausado."

para MR, pelo truque-dica que me ensinou para acrescentar as imagens...

Em defesa da Grécia


Escolhi, de propósito, uma imagem do antigo chanceler Helmut Schmidt mais antiga. De facto, o seu envelhecimento físico é apenas um "acidente de percurso". Quem nos dera, a nós e aos povos europeus, dirigentes políticos tão lúcidos, tanto no plano humano como nas áreas indispensáveis ao destino comum: o domínio da história, da economia, da política e, sobretudo, da lucidez.
Mais uma vez, e com o peso da experiência, da autoridade e idade, Helmut Schmidt publicou, a 22.6.2011, um artigo no DIE ZEIT. Brilhante, na defesa da História dos povos europeus e, sobretudo, da Grécia! Lufada de ar fresco no meio de discursos confrangedores, de "pequenos Helderzinhos", a quererem dissertar sobre o destino de povos, cuja História, Cultura e Geografia ignoram por completo.
Helmut Schmidt é desassombrado na sua crítica, e valha-nos a verdade. A Comissão Europeia e os Mininstros das Finanças "dormiram" enquanto a crise avançava. Quanto à Alemanha reconhece que tem a faculdade para intervir, falta, no entanto, capacidade de decisão e vontade. Nem mais !
Relembra, e bem, o que seria a Europa sem a herança grega. Acrescentamos nós, o que seria o centro da Europa sem os descobrimentos de outros mundos por parte de países ora chamados "periféricos"
De facto, e aproveitando o pensamento de Helmut Schmidt, a Grécia faz parte de nós - europeus. Nessa "virtus" não terão lugar, certamente, todos aqueles que vivem, em proveito próprio, para o imediato, reinventando a usura.

Post de HMJ

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Futuro presente


1/7 das famílias portugueses já não conseguem pagar os juros dos seus débitos e 1/5 das empresas nacionais já estão atrasadas no pagamento das suas obrigações à Banca - dizem as notícias.
1/2 das visitas brasileiras, a este blogue, vem direitinhas à imagem  da "Senhora com o arminho", quadro de Leonardo da Vinci que se guarda no Museu de Cracóvia - digo eu. Bendita massificação, gosto e globalização turística! O azeite vem sempre à tona da água.
Em breve deixará de haver vestígios pessoais manuscritos, postais e cartas escriturados à mão. As edições críticas irão passar ao domínio da museologia, os grafólogos perderão os seus empregos e os C.V. que, até há pouco tempo eram, obrigatoriamente, escritos à mão, deixarão de ser o 1º crivo para análise caligráfica e selecção de pessoal nas PME.
Um pouco mais tarde, talvez, os SMS e os emails irão perder-se em arquivos mortos ou, quiçá, no infinito. O Google virá a ser uma empresa funerária de sucesso e só guardará as cinzas destes humanos sinais desaparecidos mediante chorudos e caros pagamentos. O espaço, na sua infinita bondade e complacência milenar, conservará o resto, expressando um sorriso de compreensão sobre o nada que é tudo.

Obsv.: devido a anomalias técnicas, alheias ao Blogue e provavelmente atribuíveis ao Alzheimer progressivo do  Google, a imagem (páginas de um livro sobre Grafologia) só foi adicionada em 23 de Junho de 2011.

A força da música


É sabido, de quem já teve ou criou canários, que a melhor forma de os pôr a cantar é fazendo deslizar uma rolha, ligeiramente humedecida, verticalmente, pela superfície de uma garrafa de vidro. Os silvos agudos produzidos motivam a ave a também ensaiar os seus trinados. Lembrei-me disto ao ler, de George Steiner ("Os livros que não escrevi"), a descrição das reacções do seu cão, "Ben", à música: "...O seu gosto musical é selectivo. Ladra aos metais e emite um longo uivo no início do Bolero de Ravel. Haydn sossega-o, o mesmo se diga de todos os compositores barrocos."
Pessoalmente, conheci um bébé que, ao ouvir Beethoven, agitava os pés, incansavelmente, naquilo que eu considerava uma manifestação de alegria, ou excitação positiva. Mas também soube de outra criança que, ainda antes de falar, ao ouvir cantar o "Parabéns a você", começava a fazer beicinho, e quase chorava. Música e sensibilidades...

Nota pessoal: por razões exteriores à minha vontade, ou por malfeitoria alheia (!?), desde a manhã de hoje que não consigo adicionar imagens aos postes do Arpose. Ou então é o Alzheimer do Google que continua a avançar.

Obsv.: só consegui colocar a imagem da harpa do séc. XVIII no dia 23/6/11.

Democracia, política e liberdade


Dadas as pequenas diferenças, por vezes, entre partidos políticos que são contíguos, penso que, cada vez mais, se vota em função dos elencos que são propostos à eleição e, menos, pelas siglas partidárias. Uma figura ou um nome podem fazer a diferença, consoante o seu grau de credibilidade pública ou a confiança que, nessa pessoa, possamos ter. Daí também a aposta, maior ou menor, que os partidos políticos fazem em personalidades independentes e, por vezes, em nomes prestigiados fora do espectro partidário. Mas a vida desses independentes, nos grupos ou aparelhos políticos, nem sempre é fácil. Como escreve, hoje no "Público", Rui Tavares: "...Primeiro, o independente faz falta. Depois, o independente começa a não dar jeito. E, finalmente, abre-se a caça ao independente."
São óbvios e bons exemplos recentes, o caso de Teixeira dos Santos, independente integrado no governo PS, que foi vergonhosamente marginalizado, nos últimos tempos de governação, pelo Partido; e o próprio Rui Tavares que se viu obrigado, por questões de coerência e honra, a desvincular-se do BE, muito embora se mantenha no Parlamento Europeu, "duplamente" independente - justificadamente, aliás.
Do ponto de vista dos partidos políticos, a independência de um "compagnon de route" parece ser, ainda e só, um rótulo meramente formal para dar colorido ao cinzentismo habitual. No fundo, esperam que o independente alinhe sempre no pensamento único e na disciplina cega, e gregária. Pensar por si é crime, e não se recomenda.

Obsv.: a imagem foi colocada apenas em 23/6/11.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Nortenhas e populares (quadras) 3


Mais 3 quadras populares retiradas da Monografia de que se mostra, em imagem, a capa do volume I.

A silva nasceu-me em casa,
Deu volta pela cantareira:
Arranje Pai quem o sirva
Qu'eu já tenho quem me queira.

Vem cantar uma cantiga,
Que eu bem sei como se canta,
Dá-se um jeitinho à boca,
Revoltea-se a garganta.

Julgavas qu'eu te queria,
Já te andavas a gabar;
Vai à mãe que te dê mama,
Que te acabe de criar.

Adagiário XLIII


Colhido do romance Levantado do Chão, de José Saramago:

"Burro com fome, até cardos come."

Ajuntadores, alcoviteiras e olheiros


São as novas profissões da Net. Ou as novas oportunidades de criaturas que se aproveitam do trabalho dos outros blogues para criarem centrais de informações (não, não têm nada a ver com a C. I. A., nem com o Google) sobre temas, e vendê-los depois aos incautos que têm pressa ou preguiça de pesquisar por si. Pululam e aproveitam para juntar anúncios de outros produtos que nada têm a ver com os blogues originais que usam. Não pedem autorização e, como alguns nem línguas devem saber, utilizam só as imagens como isco; outros sugam textos e imagens. São inúmeras estas páginas, com siglas muito diversas, algumas apelativas:  http://www.alexa.com/, http://www.dzonenews.com/, http://www.fightersrec.com/, http://www.radarbit.com/, http://www.ziipe.com/. ...São carraças sugadoras, estes novos "pimps", pelo ciberespaço.

Memória 58 : Françoise Sagan


Foi uma certa juventude que durou algumas breves primaveras. Dos anos 50 do século que passou, Françoise Sagan, nascida a 21 de Junho de 1935, era um dos seus retratos mais emblemáticos. Com os traços leves, mas também melancólicos que adivinham a brevidade das coisas. A Escritora faria hoje 76 anos. Mas faleceu em 2004. Tudo passa depressa: queiramos ou não.

Com agradecimentos a MR, pelos ajustes...

Pinacoteca Pessoal 13 : Pedro Chorão




Coimbra, 1945, Abril. Lisboa e, depois, Liverpool, Paris, Cabo Verde, Lisboa e Paris, de novo. O Porto, por um ano breve, numa pintura onde a bruma, leitosa ou cinzenta, já assomava, por vezes. Ou um esfacelado azul e branco das casas que, pelo Alentejo, Pedro Chorão fotografou, durante quase dois anos. Há mais de 20 anos atrás, falei de estética do precário a propósito destas cores e dos sinais discretos que surgem nas suas telas, para sugerir alegria (Verão 79) ou, talvez, lembrar um pássaro de ferro que pontificava num jardim selvagem de Paço de Arcos. E que lá deve ter ficado quando o Pintor abandonou a Casa. São sinais e coisas que me lembram tantas outras que conheço ou conheci, de perto, numa Amizade que já vem de 1968 e que também inclui Rilke. E que me povoam a casa numa geografia de afecto que, também há muitos anos atrás tentei condensar, como se fora em osmose, nestes dois versos (Tela) que lhe dediquei:
É pelo branco todo que procuro
uma raíz de sol por onde arda.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

A importância das trombetas


"...Quando a terceira esposa de Filipe o Bom, Isabel de Portugal, chegou a Bruges em 1429, havia mais trombetas e menestréis aguardando-a que nunca dantes se vira; havia «pelo menos cento e vinte trombetas de prata» acompanhando a comitiva e mais setenta e seis à entrada do palácio ducal, «faziam tanto barulho que se ouvia em toda a cidade». Quanto mais terrífico era o barulho mais valor tinha - até os instrumentos relativamente mais suaves dos princípios do século XV faziam muito mais barulho que os seus sucessores da Renascença."
Alec Robertson e Denis Stevens, in "História da Música", 1963.

Mercearias Finas 33 : sardinhas


Que só lá para Setembro e que a culpa é das nortadas, que não têm soprado como habitualmente - dizem os especialistas. E, por isso, as sardinhas estão enfezadas e não têm engordado como deviam. Nem pingam, ou rechinam sobre os grelhadores e assadores caseiros. E andamos nisto há quase 2 meses. Mas a paciência tem limites, nestes hábitos ancestrais que, nos nossos genes ou chips, já vem inscritos quando nascemos, e acabam por fazer exigências impacientes e instintivas.
Como não há fome que não dê em fartura, em vez de uma sardinhada, foram duas - na sexta-feira e neste domingo passado. Aproveitamos uma aberta, um parecer positivo no nosso restaurante de estimação, e a aprovação avisada ("comprar!", como se diz na Bolsa de Valores) da nossa Peixeira preferida, no Mercado do Monte (da Caparica), logo pela manhãzinha de domingo. E lá vieram mais 8: foi um fartar vilanagem!...
Não poderei dizer, em nome do rigor, que estavam excelentes, mas eram boas, tinham sabor marítimo e fresco, algumas já tinham ovas (ou mílharas, como se diz no Norte) - o que é sempre um bom sinal. Acompanhadas a broa de milho, como manda a lei. E, à falta do verde tinto de Monção que completaria a trindade santíssima, abri um Dão tinto, com Alfrocheiro, que é mais rude do que a casta Jaen - mais suave e elegante. Em lote de Touriga Nacional e Tinta Roriz, como é de norma na região demarcada do Dão. Esteve bem.
E não faltou a salada, com todos os matadores: alface, tomate, cebola, pimentos verdes e vermelhos e pepino - que se dane o E. coli. Falta dizer que as batatas da Lourinhã, cozidas, levaram uns pinguinhos de azeite (0,3 de acidez) da Quinta do Noval. De lamber os beiços! 

domingo, 19 de junho de 2011

O campo, a cidade e o subúrbio


O campo, numa iniciativa engenhosa patrocinada por uma empresa de grandes superfícies e de catedrais de consumo urbanas, veio encher a cidade, recentemente. Ou a Avenida da Liberdade. Aliás, na sequência do que tem acontecido, nos últimos 100 anos: os campos vão ficando despovoados de pessoas que vão superlotando os subúrbios das grandes cidades. É sintomático que o novel primeiro-ministro, pela 1ª vez, nestes últimos anos de Democracia, que eu saiba, habite um subúrbio ou freguesia artificial e dormitório (Massamá).
Eça, o citadino, Camilo, campestre e rural. Polémica, a afirmação, define de algum modo os cenários literários. Mas talvez explique um gosto mais acentuado, dos portugueses, pelos romances de Eça de Queiroz. Em Camilo há tempo, paciência, espera; em Eça, há pressa (rima, e parece-me verdade). O tempo nos campos, o stress (incipiente, ainda) nas cidades.
Quem, cordialmente, me acompanha já se deve ter apercebido que ando a ler (ou reler? - confesso que não sei, ao certo) "Levantado do Chão", de Saramago. É um livro "guloso", na acepção semelhante de dizermos que "um pão é guloso" ou "um vinho é guloso"-  apetece mais. O livro está bem construído mas, sobretudo, o cenário (Alentejo interior) já nos diz muito pouco. As realidades são outras. Aquilino, porventura, já foi sepultado pelo Tempo (oxalá me engane!); quem se lembra ou lê, hoje, com menos de 40 anos,  Araújo Correia,  Loureiro Botas, Namora, Torga, Redol ou Régio? Dentro de 50 anos, creio, serão relíquias estudadas por Académicos curiosos, estudiosos sérios do neo-realismo, ou hiper-renascentistas das antigas realidades...
A cidade secou os campos, como o eucalipto vai secando tudo em volta. Ironia das ironias: talvez os subúrbios venham a secar as cidades.  

Filatelia XXIII : Bibliografia (1)


Iniciado em 1853, o uso do selo postal, em Portugal, nos primeiros 90 anos não se pode dizer que tenha havido muitos estudos de fundo sobre a filatelia nacional. Tirando Castro Brandão que abordou os selos "Ceres" (1942), em trabalho de fôlego, os mais alargados estudos filatélicos, foram feitas por estrangeiros. Em 1948 saíria outro trabalho, bem importante e minucioso: "Estudo das reimpressões de selos portugueses", de José da Cunha Lamas, com a colaboração de Luís da Câmara d'Orey.
Foi preciso chegar-se ao centenário do selo postal (1953) para começarem a aparecer filatelistas portugueses a divulgar e a estudar, com profundidade, as emissões nacionais. Nos primórdios, há que destacar as obras de Constantino Salvi (1887- ?), sobre carimbos de Portugal, publicada em 1929 e, anteriormente, 2 livros  do inglês Frederick John Melville (1882-1940), sobre "Cameos" e as emissões de selos entre 1880 e 1911. Estas duas obras foram editadas em 1911. Até 1953, tirando as obras referidas, de autores nacionais, o que há são artigos fragmentados e parcelares, e obras de pouco fôlego. Uma ressalva, ainda, para os trabalhos de Godofredo Ferreira (funcionário dos CTT), mas que abordam, sobretudo o funcionamento dos Correios Portugueses, através dos tempos. A primeira obra de grande fôlego começará a ser editada em 1954 e é da autoria de A. H. de Oliveira Marques: "História do Selo Postal Português", que foi reeditada em 1995. Ainda hoje é um livro imprescindível e fundamental.

para JAD, por várias razões.
  

Linhagens 11

Memórias do lado materno 4: o tio marceneiro e fotógrafo

Chegou a altura de me despedir das memórias do lado materno, de Leverkusen, com a evocação do meu tio marceneiro e fotógrafo. Aliás, toda a parte documental e familiar, que serve de base às linhagens, devemo-la ao tio fotógrafo. Para além de mestre na arte da marcenaria, aperfeiçoou o gosto pela fotografia. Basta recordar que tinha o material à mão. Tendo a AGFA sido uma empresa ligada à Bayer, teve, certamente, acesso não apenas aos produtos como aos ensinamentos da empresa e montou uma câmara escura na cave do prédio onde vivia.
Digamos que o tio Otto, o rapaz mais velhos dos cinco descendentes dos avós, era, e é, para nós, o mais catita e alegre. Casado com uma viúva da guerra, com uma filha, seguiu, porventura, um rumo menos canónico para a família. Em vez de se aplicar na construção de uma casa própria, manteve-se sempre no seu pequeno apartamento alugado. A falta de espaço edificado compensava-o, desde muito cedo, com viagens pela Europa, e, sobretudo, com férias na Baviera e na Áustria, em tendas, caravanas e casas alugadas. Até hoje. Será, talvez por causa da sua opção, o mais bem-aventurado até ao final da sua vida. O estado "social" não o poderá obrigar a alienar o seu bem edificado, com esforço de décadas, como sucedera ao seu cunhado, em troca de uma assistência na velhice que ultrapassava o valor de sua pensão. Seria necessária uma memória mais alargada, e quiçá solidária, para o Estado alemão reconhecer que fora a geração nascida entre 1914 e 1921 que, com os anos de juventude perdidos na 2ª Guerra Mundial, construíu o tal "estado social". Seria imperativo proporcionar a esses obreiros um final de vida mais digno, poupando-os à alienação forçada da habitação (re-)edificada após o final de guerra.

Regressando, no entanto, à alegria em casa do tio, lembro-me de um teatro de fantoches. A "casa do teatro" e os bonecos tinham saído das mãos do tio. Ao fim do dia, ou aos fins-de-semana em que passava com ele, as senhoras, i.e., a tia, a prima e eu, sentadas no sofá, assistíamos aos espectáculos do tio. Ele mexendo nos bonecos, contava histórias e anedotas que nos enchiam de boa disposição. A casa podia ser pequena, mas nunca senti a limitação do espaço, pela irradiação da alegria.
Da câmara escura, situada na cave, saíam, então, as fotos. Como memória derradeira das fotos do tio, aqui vai uma imagem.


P.S. Para o tio Otto que, em Agosto, fará 98 anos. É obra !

Post de HMJ

sábado, 18 de junho de 2011

No primeiro ano da morte de Saramago


A unha do meu dedo anelar esquerdo partiu-se-me, inexplicavelmente, na vertical, hoje. Mas nem tudo vem de cima, nem dos céus. Saramago era uma alcunha que a família do Escritor tinha. Ao registar o filho, o pai defrontou-se com um escriturário já bêbado, que acrescentou a José de Sousa, o apelido da alcunha: Saramago. Assim ficou. Por vezes, aquilo que nasce horizontal, na horizontal volta a ficar, para sempre. Sejam corpos ou cinzas. José Saramago morreu, exactamente, há um ano. Lembrêmo-lo:
"...Nos altos céus, os anjos estão debruçados dos parapeitos das janelas ou daquela varanda corrida, com balaústres de prata, que dá uma volta inteira mesmo por cima do horizonte, em dias claros vê-se bem, e apontam, e chamam-se uns aos outros, estouvaditos, está-lhes na idade, e um deles, mais graduado, vai a correr chamar dois ou três santos antigamente ligados a coisas de agricultura e pecuária, para que venham ver o que vai pelo latifúndio, um desassossego, magotes de gente escura pelas estradas, onde as há, ou pelos quase invisíveis carris do mato, a atalhar caminho, ou em linha, pela estrema das searas, como um carreiro de formigas pretas. Há muito tempo que os anjos não se divertiam tanto, os santos fazem suaves prelecções sobre plantas e animais, já a memória lhes falha um pouco, mas ainda vão dizendo como cresce o trigo e se coze o pão, e que do porco tudo se aproveita, e que se queres conhecer o teu corpo abre o teu porco, porque iguais são. A afirmação é ousada e herética, põe em causa os escrúpulos do criador, que, não sabendo que mais inventar, tendo de fazer o homem repetiu o porco, mas se tanta gente o diz, verdade será. ..."
in Levantado do Chão, (pg. 145), 1982 (3º edição).
Quem disse que José Saramago não era um homem religioso?

O pintassilgo, de visita


Sou um apaixonado por canários - e sempre utilizei e uso a palavra paixão com contenção e propriedade. Com extrema usura, e respeito. Não sou capaz (a não ser por ironia) de dizer como as "Tias": "Adorei, adorei!" Porque acho tosco, muito quitche, pedestremente vulgar. E também porque revela ignorância linguística, pobreza de sentimentos e é, no fundo, uma desvalorização da importância concreta e valor ou peso intrínseco das palavras. Será difícil, e moroso, eu explicar porque gosto tanto de canários - vem de longe. Mas a última paixão que tive por uma destas avezinhas canoras, correu mal (expliquei-a, aqui no Blogue e na terceira pessoa, a 27/3/2010). Mas agora, muito recentemente, para minha (nossa) felicidade tenho um pintassilgo por vizinho. Não é um canário, mas é da família: Carduelis magellanica. Não canta tão bem, mas canta bem. E lembra-me o canário emblemático da minha paixão e da minha infância.
A velhice contenta-se com pouco, fica grata com uma pequena lembrança quando chega ao coração. Mesmo que a visita e a lembrança não sejam constantes e quotidianas. Pois, embora seja bissexto nas visitas, o jovem, ágil e bonito pintassilgo vem pousar, de vez em quando, no parapeito da varanda a Leste, quando não está ninguém, e lhe apetece. E solta os seus gorgeios ritmados.
Longa vida, avezinha simpática! Que me acompanhes, mesmo de longe a longe, com o teu canto amigo!

Astrologias : os Gémeos

Diz-se que têm, normalmente, tronco curto, mas pernas e braços longos (D. Manuel I), que são nervosos, habitualmente, e pequenos (Charles Aznavour). Que têm tendência para a dupla personalidade (Fernando Pessoa) ou, pelo menos, para grandes oscilações de humor e estados de espírito. Atraídos pelo paradoxo (G. K. Chesterton), quando não paradoxais. Provocadores, no sentido de humor (G. B. Shaw). Também se refere que são superficiais, mas com algum fascínio no contacto pessoal (J. F. Kennedy). Atraídos pelo mundo do espectáculo e, muitas vezes, bem sucedidos (Marilyn Monroe e Bob Dylan). Gostam de desvendar mistérios ou criá-los (Conan Doyle). São os Gémeos, astrologicamente.
Na mitologia, eram filhos de Leda, mas com pais diferentes (Zeus e Tíndaro), e com os nomes de Castor e Pólux, um eterno, outro mortal. Também eram chamados Dióscuros.



Favoritos LIII : Paul McCartney

Paul McCartney nasceu a 18 de Junho de 1942.

Da janela do aposento 1

Princípios e Valores

Uma cópia, do ponto de vista linguístico ou da História do Livro, representa uma imitação de um texto anterior, frequentemente, sem consentimento do autor original. Portanto, primeira infracção a um princípio básico, i.e., o respeito pelo autor do texto. No entanto, o roubo da propriedade intelectual alheia, ou seja, a cópia abusiva, não parece motivo para penalizações. A iniciação ao "copianço" - eufemismo encontrado para amenizar o delito - começa cedo e, com complacências várias ao longo da vida, pode chegar ao título académico supremo como têm demonstrado alguns casos recentes.
O "copy-paste" tornou-se um expediente normal. Passaram à categora de "inflexíveis, autoritários e quejandos" todos aqueles que defendem o mesmo estatuto para a propriedade intelectual como para a propriedade material, ou seja, o respeito pelo bem alheio. A citação, ou seja, uma cópia de um pensamento alheio, até tem um recurso simples, o uso das aspas. Sucede, contudo, que o rigor no cumprimento de princípios éticos, mesmo nos considerados pormenores, se tornou obsoleto, motivo de troça e incompreensão.
O passo seguinte será, numa escala de grau, a cópia fraudulenta, em benefício próprio, de um pensamento alheio ou do aproveitamento de estudo/trabalho/esforço alheio. A infracção ao princípio ético é, no entanto, idêntico, à falta de respeito pelo bem alheio, agravada pelo grau de instrução, idade e responsabilidade cívica do infractor.
Ora, uma sociedade que assenta a sua educação no princípio de "o Estado não pode(r) atribuir-se o direito de programar a educação e a cultura segundo quaisquer directrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas" - (cf. Lei de Bases do Sistema Educativo) - tem, forçosamente, de confundir tudo. Uma tal sociedade, sem princípios nem directrizes, pretende, certamente, formar "gente", ao contrário de uma cidadania que implica, no minimo, o respeito por deveres e o gozo de direitos inerentes.
Esse mesmo Estado tem sido incapaz de orientar a educação para o essencial, i.e., o pensar e em todas as áreas do saber, científico e humanístico. Permanece a velha tradição de "encornar" para depois "despejar" nos exames, prática com uma directriz filosófica, estética, política e ideológica muito precisa, i.e., amputar, à nascença, o pensamento próprio. Ora tal prática encontrou um expediente óptimo. "Os testes à americana!" São recursos excelentes para reduzir, ao mínimo, o trabalho e a responsabilidade do professor. Numa ânsia perversa de orientar a avaliação por uma objectividade sem limites, as "cruzinhas" apõem-se a coordenadas pré-pensadas - tipo exame de condução em que a escolha ínvia e ilógica substitui o próprio raciocínio - terreno fértil para o "copianço", sobretudo quando os professores não sabem fazer "espelhos da sala" para fiscalizar, posteriormente, passagens ilícitas de marcação de respostas.
Os professores vigilantes do CEJ não devem conhecer esses "pequenos truques".


Sabem, ao que parece, responsabilizar falhas aos docentes em níveis de ensino precedentes.
Com efeito, o que está em causa é a completa ausência de princípios básicos em todo o sistema de Educação do país, assumido em plenitude na sua Lei de Bases. Daí decorre a indigência na prestação - nas provas e na vida - de toda uma sociedade, com especial destaque para aqueles que se arrogam o direito de falar em justiça.
Entre outros bens, não haverá justiça num país em que o princípio básico da educação não é o pensamento próprio. Mais do que o "copianço" de futuros adminstradores de justiça, o país deverá preocupar-se com "gente certificada" e carente do bem humano essencial mais estimável: o pensamento.

Post de HMJ

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Postais : aéreos e terrestres


Os três postais foram usados entre 1911 e 1924, e apenas o do galã aviador, foi remetido de França com a recomendação, no verso: "Muitos beijos ao pimpolhito, da Tia Maria". Não faço a menor ideia se o pimpolho chegou a tripular aviões. Os dois outros postais tiveram circulação interna, em Portugal, sendo que o das criancinhas com a ovelha, embora com selo (10 réis) de D. Manuel II, sem sobrecarga, já foi usado depois da implantação da República, pois tem carimbo de Lisboa, datado de 11 de Janeiro de 1911.