Com os anos e leituras, a figura controversa, e algo enigmática, de Felipe II (1527-1598), de Espanha (I de Portugal), foi ganhando contornos nítidos muito diferentes daqueles que o definiam, para mim, na adolescência. Filho de Isabel de Portugal e de Carlos V, era neto de D. Manuel, o nosso rei Venturoso. E muito de português tinha ele, sem dúvida, além de gostar de Portugal - em Lisboa, ficou ele cerca de dois anos, com agrado, embora tivesse saudades das filhas. Felipe I (de Portugal) era um burocrata minucioso, respeitador escrupuloso dos acordos que fez com os portugueses, cristianíssimo e pio, mas também misterioso, talvez obsessivo em questões de Poder.
Mas, recentemente, tive notícia, através de Eugenio Asensio (Los «Lusiadas» y las «Rimas» de Camões en la poesia Española - 1580-1640, F.C.G. Paris, 1982), de mais um facto insólito da personalidade de Filipe I. Acontece que ele admirava muito Camões e, não menos, a saga dos descobrimentos portugueses. Sucede que uma das mais célebres naus da Índia, a Cinco Chagas (mandada construir pelo vice-rei Constantino de Bragança) que fizera 10 viagens de ida e volta, estava já imprestável, e foi abandonada no Tejo. Filipe mandou recolher algum do madeirame, e fê-lo enviar para Espanha. Dessa madeira se fez um crucifixo grande para a sua capela particular. As tábuas restantes, por vontade dele, serviram-lhe de caixão: nelas foi amortalhado, no Escorial.
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