sábado, 4 de fevereiro de 2012

Mercearias Finas 48 : colheitas tardias



Conheci alguém, de estima e saudosa memória, com quem convivi até 1981, data da sua morte, a quem o melhor presente que se lhe podia dar, pelos anos, era uma garrafa de Grandjó, da Real Companhia Velha. A esse branco duriense, ligeiramente doce, beberricava-o ele, paulatinamente, durante a tarde, depois do almoço de aniversário, que ocorria num dos últimos dias de Setembro. Levemente refrescado o vinho durava-lhe, sempre, até pouco antes do jantar.
Dos Sauternes (França) manda a tradição que acompanhem um bom patê, à entrada, ou uma sobremesa de doce de colher. Eu acho que fazem o pleno emparceirando com uma boa encharcada alentejana que justifica, em excelência, este tipo de vinhos doces de Bordéus. Mas, até há pouco tempo, o que tinhamos de parecido, na enologia nacional, era apenas o veterano Grandjó. Hoje em dia os "colheita tardia" proliferam, quase sempre em garrafas pequenas de 0,50 lt.. Há os da Casa da Alorna, do Esporão e a nova versão do velho Grandjó, apelidado de "latest harvest", - entre os melhores, na minha opinião.
São vinhos caros, porque as uvas de que se fazem são colhidas depois dos frios do Outono (e mesmo já no Inverno), em condições climatéricas favoráveis quando acontecem, e que começam a ser atacadas por um fungo denominado botrytis cinerea, ou, à portuguesa: podridão nobre. Em França chamam-lhe "pourriture noble", na Alemanha, "Edelfäule". As uvas colhidas à mão, uma a uma, concentraram os açúcares e estão, por isso, muito doces (quase uvas passas), atingindo facilmente os 14º de teor alcoólico.
Na Alemanha, este tipo de vinhos são ainda divididos em várias qualidades: Spatlese, Trockenbeerauslese e Eiswein (vinho do gelo - raro e caríssimo) - de que se mostra, em imagem, um cacho de uvas. Contentêmo-nos com os nossos "colheita tardia", se tivermos uma encharcada à nossa frente. Que ficamos bem servidos!

4 comentários:

  1. Céus, que Europa tão bonita escreveu aqui!

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  2. Há anos que não bebo Grangjó e confesso que não é vinho que escolhesse, mas depois de ter experimentado o "colheita tardia" da Alorna com um doce, fiquei fã. E já converti amigos. Hei-de então experimentar agora um docinho, bem docinho, com Grandjó.

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