quinta-feira, 31 de março de 2022

Dizeres



A imagem acima não dará conta, nem sugere o tema deste poste. Mas foi neste terceiro volume da História da Vida Privada em Portugal (A Época Contemporânea), obra sólida e competente que adquiri através da Livraria Lumière (Porto), há tempos, que descobri dois ditos populares a que achei imensa graça e que vou citar. O primeiro tem por objectivo assegurar que o pão venha a ter bom sucesso final, depois da massa feita e depois de ir para o forno. Após desenhar três cruzes sobre o produto, a padeira dizia:

"São Mamede te levede, São Vicente te acrescente, São Romão te faça bom pão e os anjos te comerão."

O segundo exorcismo era o contraponto que respondia ao pedido de benção de uma criança, a que o adulto (pais, padrinhos...), que abençoava, dizia depois:

"Nosso Senhor te abençoe e te faça um santinho e te leve para o Céu quando fores velhinho."

(Estes dizeres vêm no livro da imagem acima, a páginas 300 e 301, respectivamente.)

terça-feira, 29 de março de 2022

Citações CDLXXIX



Rara é a felicidade dos tempos em que é permitido pensar o que quisermos e dizer aquilo que pensamos.

Tácito (55-120), in Histórias.

segunda-feira, 28 de março de 2022

Uma louvável iniciativa 63



Em boa hora e para celebrar os 110 anos da sua fundação, resolveu a Universidade do Porto editar o livro 110 Anos, 110 Poetas, seleccionando autores "que, em algum momento do seu percurso de vida, cruzaram a sua história com a história da sua Universidade.", como refere Isabel Morujão, organizadora, no prefácio da obra. Estética sóbria no grafismo, o volume, de 276 páginas, tem uma apresentação excelente. Os poetas nele representados vão de Jorge de Sena a Fernando Guimarães, de José Augusto Seabra a Eugénio de Andrade, passando por Vasco da Graça Moura e António de Almeida Mattos. Deste último poeta, e meu grande amigo, transcrevo um poema:



Recomendado : noventa e três



É uma revista quase sempre com interesse, embora privilegie, naturalmente, os assuntos da literatura francesa. Este último número (505), de Março de 2022, consagra o seu dossiê temático aos casais literários (Elsa/Aragon, Simone/Sartre...) e, entre outros temas, há uma entrevista a Patrice Gérard sobre a nova série Maigret, baseada nos romances de Simenon, e que tem Gérard Depardieu como actor principal no papel do Comissário parisiense. Duas páginas de Le Magazine Littérire (14/5) abordam a eventual transfobia de J. K. Rowling. E há ainda vários outros artigos com interesse. Por isso o recomendo.

domingo, 27 de março de 2022

sábado, 26 de março de 2022

Lembrete 88



Esta noite, o sono terá de ser mais curto..:-)
Não esquecer, à 1h00 da madrugada de adiantar os relógios para as 2h00 da noite.

Palermices



Dentre a profusão de políticos cabotinos que pululam neste nosso mundo desgovernado, há um que eu quase iria jurar que, em vez de se compor e pentear para posar nas fotografias, se desarranja e despenteia, propositadamente, antes. Talvez para dar nas vistas.
Ele há tolos para tudo...

sexta-feira, 25 de março de 2022

Esquecidos (9)



Esta súmula de afectos que a memória perpetua, habitualmente, torna-se com o tempo um local de romagem virtual e oásis gratificante a que recorremos em momentos de tédio, dúvida ou solidão pessoal. Podem ser imagens ou palavras, cheiros e sabores, geografia de lugares amenos. Ou apenas nomes. Ancoradouros seguros, no tempo incerto.



António Mega Ferreira resolveu, e muito bem, no penúltimo JL (nº 1342), trazer-nos à lembrança o multímodo escritor e divulgador cultural português-santomense Mário Domingues (1899-1977), figura bem conhecida de quem lia e se interessava pela História de Portugal, em meados do século passado. Mas também autor de policiais, sob vários pseudónimos.



Creio que Mário Domingues está hoje relativamente esquecido, e não o merecia. Suponho que actualmente não há livros de qualidade semelhante e de propagação histórica aos que a Romano Torres editou, para a juventude, da sua autoria, em meados do século passado. Que, além de fidedignos quanto aos factos, eram bem escritos. E que eu li com tanto agrado e entusiasmo, na minha adolescência.

quinta-feira, 24 de março de 2022

Uma fotografia, de vez em quando... (156)



Húngaro, de ascendência judaica, o fotógrafo Nicolás Muller (1913-2000) teve uma formação em Direito mas cedo abandonou a advocacia para se dedicar à fotografia, sem preocupações de maior, visto que a família tinha boas condições financeiras.



Com o advento do nazismo viajou pela Europa ocidental e mais tarde por Marrocos. Também andou por Portugal e o seu portefólio sobre o nosso país é notável (mais de 70 fotos) e dele se fez, em 2016, uma exposição em Cascais. A partir de 1948, Muller fixou-se definitivamente em Espanha, onde veio a falecer.



Como curiosidade, registe-se que ao entrar pela primeira vez em Portugal foi detido em Vilar Formoso e, mais  tarde, foi preso, durante 15 dias, pela Pide, na cadeia do Aljube.




quarta-feira, 23 de março de 2022

Imigração francófona



O mais recente Le Point (nº 2588) faz uma perninha pelo turismo português ou pela imigração (?) dos franceses para Lisboa. Destacando, elogiosamente, em três páginas, a zona do Príncipe Real e as suas atracções, convidando a que sejam visitadas. 

terça-feira, 22 de março de 2022

Ideias fixas 67


A exiguidade de reacções, na blogosfera, ao desaparecimento de António Osório (1933-2021) e, mais recentemente, de Gastão Cruz (1941-2022), demostram à exaustão o desinteresse (ou crassa ignorância)  dos blogonautas pela poesia. Apesar dos protestos de amor que fingem encenar, de bom tom, por alguns poetas... 

segunda-feira, 21 de março de 2022

Um poema de G. C.

 


As palavras despedem-se dos dias
em que falar é o melhor serviço
Caem mortas e vivas da linguagem
vitimada

               Mas quando regressarem
a sua fúria grande prenderá
nos humanos céus húmidos a arte
esquecida e excessiva da poesia


Gastão Cruz (1941-2022), in Campânula (1978), pg.63.

Citações CDLXXVIII



A França está acima dos Franceses. Eu não me ocupei da felicidade dos Franceses. Morre-se pela França: isso prova que ela é outra coisa, e mais do que os Franceses.

Charles de Gaulle (1890-1970), in De Gaulle (Hachette, 1973), pg. 169.

sábado, 19 de março de 2022

Recuperado de um moleskine (40)

 

Pela infância anda tudo arrumado, excepto dois ou três brinquedos que ficaram fora da caixa.
Basta abrir, a pedido, um só dos capítulos, dar o nome do tema, mais ou menos a data do caso, a geografia do assunto. E tudo parece vir alinhavado, essencial, nítido gradualmente à memória do que hoje é apenas o pequeno caos do que será o breve futuro que se vai ajustando a ficar.
Convém, no entanto, perguntar muito - acertar o que nos vem de longe, para que tudo coincida e caiba no puzzle, sem destoar do conjunto. Se possível, cruzar ainda os pormenores com alguém próximo que, connosco, sobreviveu, afortunadamente todos estes anos que já passaram. Para uma certificação capaz.

sexta-feira, 18 de março de 2022

Retro (112)



O anúncio era de 1909 e vinha na guarda posterior do número 230 do voluminho sobre a História da Literatura Portuguesa, obra que tinha a indicação preciosa de: "Acomodada ao programa dos Liceus". Este livrinho, da útil Bibliotheca do Povo e das Escolas, não indicava o nome do autor do texto publicado.
Quanto à publicidade ao livro de Júlio Dinis, creio que dispensa quaisquer comentários.

quinta-feira, 17 de março de 2022

3 haiku japoneses, em versão portuguesa e livre






Noite breve
- a lagartixa retém
as gotas de orvalho.

Yosa Buson
(1716-1783)
...

Perseguido
o pirilampo abriga-se
no rasto do luar.

Ôshima Ryôta
(1718-1787)
...

Queria tanto partir
- penteado pela lua
sob o céu vagabundo!

Tagami Kikusha-ni
(1753-1826) 

quarta-feira, 16 de março de 2022

Bibliofilia 196



Recentemente e por questões de localização, nas estantes, andei à volta de livros de Ernst Jünger (1895-1998), 5 volumes apenas, e de obras de Georges Simenon (1903-1989), que são muitas, na biblioteca. Deste escritor belga, constatei, sem uma pesquisa muito exaustiva, que tinha pelo menos 4 primeiras edições originais. Assim e cronologicamente:



1. Le Voyageur de la Toussaint, 1941 - Gallimard.
2. Trois Chambres à Manhattan, 1946 - Les Presses de la Cité.
3. Le Fils, 1957 - Les Presses de la Cité.
4. Le Veuf, 1959 - Les Presses de la Cité.



Todos se encontram em bom estado, embora aos dois últimos faltem as sobrecapas. Apenas do número 3 sei que paguei por ele, usado, 5 euros na livraria De Slegte, em Antuérpia, mas os restantes também não foram caros e, provavelmente, foram adquiridos via ebay
Consultas breves na AbeBooks, Iberlivros e ebay permitiram-me constatar que os 4 títulos, em primeiras edições eram oferecidos num intervalo de preços que oscilava entre os 3 e os 25,80 euros.
O facto destes preços baixos talvez se possa explicar pelas grandes tiragens dos livros de Simenon, que era um escritor extremamente popular e que tinha muitos leitores dedicados.

terça-feira, 15 de março de 2022

Mercearias Finas 176



O tachinho veio em take away da Trafaria. Com um Rancho apaladado e generoso.
Quando por lá andei no Verão de 68, não havia memória de nenhum levantamento de rancho no BRT (Batalhão de Reconhecimento e Transmissões), mas eu trouxera algumas histórias da EPI (Escola Prática de Infantaria) de Mafra, onde teriam acontecido, certamente por razões sobejas que, tirando o sempre magnífico pequeno almoço, pelas boas qualidades do pão e do leite, as restantes refeições deixavam muito a desejar para os recrutas soldados cadetes.



Injustamente classificado como comida de pobres, o Rancho português agregava massa (macarrão), batata e grão-de-bico, a que uns bocadinhos de carne de porco e umas, poucas, rodelas de chouriço corrente davam sabor e substância. Cruzei-me com ele já tarde, na segunda metade dos anos 80 e fiquei fã.
Para este Rancho, feito com gosto e que trouxemos para degustar em casa, abrimos um tinto do Dão, Quinta do Cerrado 2020 (13%), da UCB, que esteve à maneira. E cumpriu.

segunda-feira, 14 de março de 2022

Curiosidades 91



Do rei D. Manuel I se dizia que era entroncado, mas tinha o tórax curto e os braços muito compridos, que quase lhe chegavam aos joelhos. Sobre as suas régias mãos não constam as crónicas.
Por diversas vezes, Maria João Pires referiu que o seu repertório evitava Liszt por a pianista portuguesa ter as mãos pequenas e os dedos curtos.
Em Quando os robles também se abatem diz-nos André Malraux (1901-1971) que : "Volto a descobrir, ao apertar-lhe a mão, como as mãos deste homem (Charles de Gaulle), tão grande ainda, são pequenas e finas. Também as mãos de Mao Tsé-Tung, descarnadas, parecem as mãos de um outro." (pg. 20)

sábado, 12 de março de 2022

Dos inconvenientes da iliteracia

 


Escrevera-te uma carta,
se tu a soubesses ler,
mas tu dá-la a ler a outro,
tudo se vem a saber.


(Quadra popular registada por J. Leite de Vasconcellos, na região de Moncorvo.)

sexta-feira, 11 de março de 2022

quinta-feira, 10 de março de 2022

Filatelia CXLVII


 

                                                       Em solidariedade para com a Ucrânia.

As contradições desta bandalheira...

 

... e a cara do artista e cómico principal desta pantomina monumental e vergonhosa.

Citações CDLXXVII



A lucidez é um exílio construído, uma porta de socorro, o vestiário da inteligência. Mas é também uma doença que nos pode levar à solidão.

Léo Ferré (1916-1993), in Testament phonographe (Plasma, 1980).

quarta-feira, 9 de março de 2022

Dicionários e Enciclopédias temáticas



Estes Vademecum, sendo bem feitos, conscenciosos e elaborados por conhecedores da matéria tratada, têm um valor inestimável para amadores e para quem queira ficar a saber alguma coisa sobre os assuntos.
Nem tudo se pode encontrar por lá, daquilo que gostaríamos, e compreende-se, apesar das 1114 páginas cerradas deste Dictionaire des Interprètes et... (Robert Laffont, 1989), do chefe de orquestra Alain Pâris (1947) que orientou um grande número de colaboradores-especialistas. Comprei o grosso volume, usado, muito barato, há tempos, e valeu a pena.
O seu anterior proprietário vê-se que era um melómano e percebia bastante de música pelas anotações a lápis que deixou no livro. Uma das mais curiosas, embora pessoal, foi a que escreveu na entrada do pianista e chefe de orquestra espanhol José Iturbi (1895-1985), assim: 1º pianista que ouvi aos 15 anos. São também inúmeros os apontamentos de nomes de artistas que não constavam deste dicionário, de que eu destacaria o do pianista português Sequeira Costa (1929-2019).
Aliás não são muitas as entradas de artífices portugueses. A referir, cronologicamente:
- José Vianna da Mota (1868-1948), na página 861.
- Pedro de Freitas Branco (1896-1963), a páginas 381.
- Maria João Pires (1944), pg. 691.
Anotem-se ainda as entradas da Orquestra e do Coro da Fundação Gulbenkian, no capítulo das instituições musicais.
Como curiosidade final, não gostaria deixar de referir as entradas, nesta obra, dos 3 irmãos Marx, na sua qualidade, respectivamente de: Chico (pianista), Groucho (guitarrista e tocador de banjo) e Harpo Marx, como harpista.
Ainda assim creio que nenhum destes últimos músicos chegaria aos calcanhares de Sequeira Costa. Mas como lá diz o povo: Mais vale cair em graça do que ser engraçado...

Divagações 178



A divulgação de inéditos póstumos de escritores falecidos, por parte de familiares, amigos ou admiradores, colhe normalmente alguma perplexidade e divide críticos e leitores. No entanto, a não acontecer, não teríamos tido acesso, por exemplo, às esplêndidas obras de Cesário Verde e à Clepsidra, de Camilo Pessanha, que, se não fossem os cuidados da família Castro Osório, teria ficado sepultada na acédia ou abulia do Poeta. É óbvio que a decisão de publicar inéditos implica conhecimentos literários e, antes de mais, sentido crítico e estético por parte do decisor.

No sentido favorável se pronuncia, de algum modo, J. M. Coetzee (1940), em Textos sobre Literatura (2006 -- 2017), assim: " Se Brod tivesse cumprido as determinações de Kafka, não teríamos nem O Processo nem O Castelo. Como consequência de sua deslealdade, o mundo não só ficou mais rico como se viu transfigurado, metamorfoseado. Assim o exemplo de Brod e Kafka não deveria bastar como prova de que os testamenteiros literários - e talvez os testamenteiros em geral - devem dispor da liberdade de reinterpretar as suas instruções à luz do bem de todos?" (pg. 278)

Pinacoteca Pessoal 182



Para fauviste tem talvez pinturas com cores muito brandas e amenas nos seus quadros, mas o francês Albert Marquet (1875-1947) foi também um pintor impressionista, embora hoje seja um nome pouco referido, imerecidamente.



Gosto muito das suas marinhas. E as muitas que pintou talvez se deva ao facto de ter nascido e vivido uma grande parte da sua vida em Bordéus.



segunda-feira, 7 de março de 2022

Sob o signo gaulês, para uma Aniversariante





Um bom dia e um ano ainda melhor, MR - muitos parabéns, com esta pequena raridade de Serge Lifar (que, não esqueçamos, era de origem ucraniana.)!


sábado, 5 de março de 2022

As paisagens tristes de um Sábado de Inverno




Faça-se, algo melancólico, o inventário, por entre a aldeia outrabandista e a beira-mar: são tudo naturezas mortas, paupérrimas. Incluíam vários indivíduos, encostados a muros, meio derruídos, falando continuamente ao telemóvel, vários séniores em fatos de treino de cores garridas, que mais pareciam pijamas, em exercícios fisicos tentando imitar grotescamente o Carlos Lopes; vimos ainda quase uma dezena de cães adolescentes passeando jovens dengosos. Sinuosos depois, a pé, fizemos gincanas difíceis para evitar os inúmeros dejectos caninos mais as javardices humanas que proliferavam pela rua, circundando os contentores. Até chegarmos ao restaurante, finalmente, sãos e salvos.
Para uma saborosa Feijoada à Transmontana.

sexta-feira, 4 de março de 2022

Uma obra e algumas respostas de Picasso





O prato pintado por Picasso (1881-1973) pertencia a Jacqueline Picasso. Foi leiloado pela Christie's, em Dezembro de 1997. O lote (183) tinha uma estimativa de venda entre 20.000 e 25.000 libras inglesas.




quinta-feira, 3 de março de 2022

Uma curiosa epígrafe usada por Malraux



Na abertura de La Tentation de l'Occident (1926), de André Malraux (1901-1976), vem a seguinte inscrição:

Celui qui regarde longtemps les singes devient semblable à son ombre.
                                                                                                                    Proverbe malabar

( Adágio que se poderia traduzir por: "Aquele que contempla durante muito tempo os macacos torna-se semelhante à sua sombra.)

quarta-feira, 2 de março de 2022

Cultura popular e restauro


O mínimo que se pode dizer desta enorme (mais de 196 pequenos volumes) colecção Bibliotheca do Povo e das Escolas é que era uma publicação muito bem intencionada. Criada e orientada por Xavier da Cunha (1840-1920), médico e intelectual, que foi director da BNP (1902-1911), o objectivo destes livrinhos era contribuir para a ilustração e cultura da população portuguesa (e brasileira). Custando 50 réis cada obra, que era escrita por especialistas na matéria temática.

Tenho apenas 2 títulos: História Natural dos Peixes (nº 70) e Arcaísmos (nº197). E dada a fragilidade do papel utilizado nos exemplares, HMJ tem andado a restaurá-los de forma a protegê-los melhor e para que possam durar mais tempo e em condições até de leitura. É o caso do primeiro da imagem, que já tem uma encadernação apropriada e muito condigna.

terça-feira, 1 de março de 2022

Um clássico para se acabar o Carnaval


Recordando o cantor brasileiro Adoniran Barbosa (1912-1982) , e o seu famoso samba de 1951.

Desequilíbrios


Iniciei-me em leilões de livros usados em 1974/5. Já antes, frequentava com alguma assiduidade as lojas de alfarrabistas. Nessa altura, havia um certo equilíbrio e moderação nos preços, excepto quando algum lote suscitava paixões animosas em diversos licitadores. Aí, os valores, normalmente, descambavam. Até ao início da pandemia, e em anos recentes, houve altos e baixos nos preços, como acontece na bolsa, mas mantendo-se um certo sentido de proporção lógica e objectiva, em função da raridade e números de tiragem, importância da obra e estado de conservação do livro em apreço. A prática de leilões, continuada, durante cerca de 40 anos, permitiu-me criar um certo critério de avaliação e de razoabilidade nos preços, que não dispensava as diferenças geográficas, naquilo que é habitual em Lisboa, Coimbra ou no Porto. Sendo que, no Norte, os preços são mais altos, até nos alfarrabistas, se eventualmente se tratar de obras de Camilo Castelo Branco, por exemplo.
Mais recentemente tem-me parecido, porém, grassar um certo desnorte nos preços de livros, difícil de explicar ou mesmo atribuir, apesar da redução drástica de livrarias de alfarrabistas sobretudo em Lisboa. Por vezes, no exagero de valor atribuído a algumas obras, outras vezes, pelo preço de saldo que pedem por livros que, antes, tinham preços solidamente estabilizados. Vou dar dois exemplos recentes.



Por volta de 1985 comprei em Lisboa uma primeira edição (1778) das Obras Poéticas de Pedro António Correia Garção, edição póstuma mandada imprimir pelo irmão do poeta. O exemplar custou-me Esc. 8.500$00, na rua do Alecrim, nº 44. Era, na altura, um livro estimado e procurado. Em 2021, num leilão do Palácio do Correio Velho (lote 137), um exemplar semelhante, também encadernado, vendeu-se por 80 euros. Pois, há dias, a Livraria Bizantina pôs à venda um livro igual, embora com a encadernação cansada, ao preço fixo de 30 euros...



Em sinal contrário, apareceu à venda no boletim bibliográfico da Livraria Castro e Silva, por 50 euros, um vulgar O Espírito da Raça Portuguesa na sua Expansão Além-Mar, de João de Almeida, obra editada, em 1933, pela Parceria António Maria Pereira. Brochado como este, adquiri em finais dos anos 70, na rua da Madalena, em Lisboa, um exemplar em bom estado, por apenas Esc. 5$00.
Dispenso dizer mais...

Adagiário CCCXXXIII



Si marzo vuelve el rabo, ni deja pastor enzamarrado, ni cordero encencerrado.

(Provérbio espanhol)