sexta-feira, 30 de abril de 2021

Natureza viva



No ano passado a natureza foi-nos madrasta. Nenhum dos limoeiros produziu frutos e a oliveira, a sul, diminuiu grandemente a sua safra, a que estávamos habituados. A própria Amaryllis (também chamada Açucena), tão pontual pela Primavera, se negou a florir. Atentamente, HMJ corrigiu-lhe a terra e alargou-lhe o vaso. Este ano, as coisas parecem correr de feição: a Amaryllis, num dos rebentos produziu trigémeas, e promete, noutro segmente, produzir mais duas flores esplendorosas. É obra!

quarta-feira, 28 de abril de 2021

Divagações 170



Por desfastio, colhi das estantes da sala o De Olhos Abertos, livro de Marguerite Yourcenar (1903-1987), e logo, ao reler as primeiras frases da escritora, a empatia  e o interesse se me reacenderam. Raramente, isto me acontece. Três exemplos me vêm ao espírito, de desencontros notórios, de autores ainda que estimáveis, mas cujos textos se me tornam enfadonhos e cuja leitura, quase sempre, não consigo acabar. São eles: Guilherme de Oliveira Martins que, no JL, escreve com alguma frequência; no mesmo jornal cultural e na Revista do Expresso, as crónicas de Gonçalo M. Tavares cujas glosas literárias me cansam imenso. E, finalmente, os textos no jornal Público, do político António Barreto, que, por princípio, nunca diz ou escreve nada de novo...

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Um CD por mês (24)



Não sendo  Johannes Brahms (1833-1897) um dos meus compositores preferidos, guardo uma especial estima pelas suas voluptuosas Danças Húngaras com que tomei contacto, pela primeira vez, em 1963, na Alemanha. Acontece que comprei, no Kaufhof de Bona, um simplório e banal single, em saldo, por 40 pf. (?), que continha as primeiras 6 danças, executadas pela Orquestra da Ópera de Viena, dirigida pelo maestro Hans Swarowsky (1899-1975). Ouvi dezenas de vezes este single, sempre com renovado prazer. 



E, durante muito tempo, estive convencido que Brahams só compusera seis danças húngaras. Só mais tarde, por volta de 1985, é que descobri que, pelo menos, existiam 21 danças, ao comprar um CD da TMI, com a gravação dessas obras musicais, pelo maestro Alfred Scholz (1926-1999).

domingo, 25 de abril de 2021

Em tempo e como referência

A atmosfera nacional não permite celebrar na euforia o quarto aniversário da Revolução. Os povos não apreciam, aliás, as festas que eles próprios não concebem como expressão da sua alegria, força, vitalidade e autocelebração. Não há festejos de encomenda, nem celebrações ritmadas pelo acaso do calendário. Nas vésperas deste quarto aniversário, a Esquerda portuguesa não tem o direito de se enganar, nem de inimigo nem de alegria.

Eduardo Lourenço (1923-2020), in O Complexo de Marx (1979), pg. 180.

sexta-feira, 23 de abril de 2021

Do Livro



É no dia provável do nascimento de William Shakespeare (1564-1616) que se convencionou celebrar o Dia Mundial do Livro. Mais concretamente, 23 de Abril (de 1616) terá sido, no entanto e com mais certeza, a data de morte do conhecido dramaturgo inglês.



Para ilustrar a efeméride resolvi dar imagem, em livro, do vetusto e vimaranense foral manuelino de 1517, em edição fac-similada de 1989, da Sociedade Martins Sarmento, edição primorosa que foi patrocinada pela extinta Livraria Oito Séculos, de Guimarães.


grato reconhecimento a H. N., que permitiu tal facto.

quinta-feira, 22 de abril de 2021

Recomendado : noventa



Creio que todos concordaremos que o JL já teve melhores dias. Graficamente, em textos, na qualidade dos seus colaboradores. Mas este último número dedica o seu dossiê ao soneto, como forma literária - uma boa lembrança sem dúvida, ao recordar também Sá de Miranda, como seu introdutor em Portugal. Claro que ao recomendar o jornal literário, eu terei de passar por cima de algumas bacoquices parolas que denunciam um certo terceiromundismo cultural. Como, por exemplo, este subtítulo pindérico, a propósito da poesia do poeta do Neiva: "E há uma reescrita em devir, com a sua reactivação artística no contexto performativo da música pop e rock" (pg. 7).

melhores agradecimentos a MR, pela dica amiga.

Citações CDLXIV

 


O gosto exclusivo pela novidade denuncia uma degenerescência do espírito crítico, porque nada é mais difícil de avaliar do que a novidade de uma obra.

Paul Valéry (1871-1945).

terça-feira, 20 de abril de 2021

Continentes e conteúdos, em sequência diversa

 


Brinquedos, bonecas russas ou peças simplesmente decorativas, as matrioskas são quase sempre de madeira e contém, em si, na maioria das vezes, 5, 6 ou 7 réplicas mais pequenas. Pintadas e envernizadas, têm, no entanto, um ar rígido e formal, por serem feitas do mesmo pedaço de madeira e terem pernas e braços unidos ao corpo.



Dependendo da perspectiva de quem vê, a Europa, segundo continente mais pequeno do Mundo, pode bem parecer uma emanação ou península da Ásia. A divisão destes 2 continentes é uma mera questão geográfica ou formal. Mas também a Europa segrega, entre outras, a Península Ibérica. E Portugal contém, em si, a península de Setúbal. Para não falarmos de Tróia...




Apenas o sono consegue vencer a dor. Pelo próprio cansaço do corpo.

sexta-feira, 16 de abril de 2021

O SNS, no seu melhor


Já o sabíamos de há muito, em questões de eficiência, a ovelha negra do SNS é o sector administrativo e burocrático: ocioso, inútil-palavroso e, muitas vezes, tiranete. Sublinhe-se que as colaboradoras, embora telefonem, raramente atendem chamadas do exterior ou de potenciais pacientes.
O centro de vacinação, para o Covid 19, foi instalado no amplo espaço do Picadeiro do antigo Colégio dos Nobres, à Escola Politécnica, que foi adaptado com tendas, cadeiras, bem como enfermeiros e pessoal especializado. Este Centro abarca os habitantes das freguesias de Sto. António, Misericórdia e Estrela.
Tudo bem organizado e profissional. Tive a sorte de me calhar a versão Pfizer, da vacina. E pouco antes das 17h00, uma menina (que não se esquecia de dizer que era oferta da Câmara de Lisboa) oferecia, aos vacinados em recobro e vacinandos, um saquinho com embalagens de água lisa, bolachas de água e sal e uma maçã Gala. 
Chamei-lhe o kit Medina...

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Citações CDLXIII

 


Interpretar é empobrecer, diminuir a imagem do mundo - substituí-lo por um mundo fictício de «significações».

Susan Sontag (1933-2004).

terça-feira, 13 de abril de 2021

Coincidências



Não sem grande surpresa, verifiquei recentemente que os escritores franceses eram os mais premiados do Nobel da literatura. Nada menos  de 15 autores, de 1901 até hoje, ultrapassando os norte-americanos (12) e os de língua inglesa (11). Há dias, li em Le Monde, também, este título significativo: Albert Camus, toujours aussi contemporain en ces temps de pandemie. A propósito da recente procura intensificada do seu romance La Peste, de 1947. Contemplando a convergência inesperada, acabei de ler ontem, de François Mauriac (1885-1970), no seu Bloc-notes II (pg. 366), uma referência à morte imprevista de Camus (4/1/1960), que vou passar a transcrever, traduzindo:



Uma chamada telefónica: Albert Camus (1913-1960) morreu. Algumas polémicas por altura da Libertação, aliás cortezes, e não tivemos outros contactos. A emoção que sinto dá-me melhor a medida do que ele representava para mim: o homem que terá ajudado toda uma geração a tomar consciência do seu destino. O absurdo deste mundo de crematórios alemães e de purgas estalinistas, que ele terá denunciado em nome de uma justiça cuja paixão estava nele próprio - sem que nunca tenha consentido dar-lhe um Nome, um Rosto a esta paixão, a esse amor.

segunda-feira, 12 de abril de 2021

Espaço e dinheiro



A ocupação progressiva do espaço doméstico pelos livros é uma das preocupações maiores dos bibliófilos. E até, muitas vezes, dos simples amantes de livros. Ainda assim me tenho surpreendido pela rapidez frequente com que se desfazem muitas bibliotecas, através de leilões ou nos alfarrabistas, logo após a morte dos seus donos. Falta de espaço ou partilhas explicam, normalmente, a celeridade da venda dos livros, muitas vezes sem que se atenda a dedicatórias íntimas ou afectuosas, que morrem também no papel e por si.



Este livro em imagens, editado (Sextante Editora) em 2009, por Mário Soares (1924-2017), e oferecido, com dedicatória manuscrita, ao também político Manuel José Homem de Melo (1930-2019), que foi director do jornal A Capital, de algum modo corrobora o que eu disse atrás. Mal se passaram 2 anos para que ele mudasse de mãos, através de um conhecido alfarrabista de Lisboa. À guisa de conclusão, posso dizer que HMJ gostou muito de ler a obra. O que me faz pensar que eu também o vou ler com prazer. 


cordiais agradecimentos a H. N.

sábado, 10 de abril de 2021

Nota de pé de página

 De há uns dias a esta parte, dei pela vinda de um(a) visitante (de Lisboa ou arredores) sistemático que tem percorrido (ou devassado), no Arpose, o label Poesia, de forma fervorosa e continuada. São mais de 700 os postes desta temática. Só faço votos para que lhe faça bom proveito, esta pesca de arrasto, mas que não use, as traduções que fiz (e são muitas), de forma fraudulenta ou ilegal.

quinta-feira, 8 de abril de 2021

Uma fotografia, de vez em quando... (146)


O lado insólito ou a originalidade do enquadramento, são apenas dois dos elementos que nos fazem demorar o olhar e admirar melhor uma fotografia. O fotógrafo alemão Kurt Hutton (1893-1960), em 1934, trocou a Alemanha pela Inglaterra, onde viria a ter um papel importante como pioneiro do fotojornalismo, tendo colaborado, inicialmente, na revista Weekly Illustrated.





Viria, mais tarde, a lançar a Picture Post (1938-1957), publicação que teve grande sucesso e ombreou, em rivalidade, com a Life norte-americana. A naturalidade dos seus retratos (Churchill, Hitchcock, Ingrid Bergman...) e cenas quotidianas fixando, com realismo, a vida inglesa, justificam plenamente que Hutton esteja representado na Tate




quarta-feira, 7 de abril de 2021

Da leitura 42


Que ninguém atire a primeira pedra, porque quase todos nós temos as nossas fraquezas. O meu atento e bom amigo H. N. sabe das minhas. E trouxe-me, para emprestar, dois livros sobre Miterrand, para eu ler num futuro já próximo. Só posso, muito reconhecido, agradecer-lhe.

Citações CDLXII



As pessoas não reconhecem a sua, mas a felicidade dos outros nunca lhes escapa.

Pierre Daninos (1913-2005), in Un certain monsieur Blot (1960). 

terça-feira, 6 de abril de 2021

Sem título (3)

Há que medir os dramas com precaução. Avaliar as limitações, com alguma bonomia positiva e bom senso. A libertação das normas rígidas - e não era previsível supô-lo - desencadeia, afinal, o frenesi da multidão anárquica, que inunda esplanadas, lojas e tugúrios - as bichas são imensas. Denunciam, no fundo, a estreiteza de horizontes das criaturas. Felizmente que vai havendo, sempre, um psicólogo de serviço pronto para ajudar, nestas tragédias comesinhas... 

segunda-feira, 5 de abril de 2021

A propósito do espadarte

Seria canónico falar-se do anho pascal que ontem cumpriu, de facto. Mas não. Começo pelo tempo. 

Instalou-se a Primavera, com armas e bagagens. Os morangos, embora adstringentes, já estão com sabor, vi anteontem duas jovens andorinhas, lá para as bandas de Murfacém. E a banca do peixe, na Trafaria, ostentava, sobrevivente, a última posta fresca avantajada de um espadarte quase extinto. Merquei-a, de imediato, antes que se fosse para outros destinos alheios.
O bicho, em si, suscita-me múltiplas memórias associadas. Do unicórnio ao narval, de Hemingway à Mirandolina (que os pendurava em gancho, na rica banca ali para as bandas de S. Domingos de Rana). É um peixe enorme, porém, de belíssimo sabor. E, quanto a bifes do mar é, francamente, melhor que o de atum. De cebolada, ou não. Neste caso a dispensamos, e bem. Só batata e cenouras cozidas.



De Bucelas, veio um Arinto especioso, da Quinta da Romeira, colhido em 2017. Tinha estagiado em carvalho (francês?), e baptizaram-no de Reserva e Morgado de Sta. Catherina. Nobre e perfeito, nos seus 13º.

domingo, 4 de abril de 2021

Quatro sublinhados de leitura, para reflexão alheia

Devo-o ao meu pai, porque, como escrevi em Depois de Babel, ele soube adivinhar que uma língua que se aprende é uma nova liberdade, uma língua nova, um cosmos e um mundo por si só, enfim, uma probabilidade de sobrevivência inestimável. (pg. 26)

Se não soubermos quem era Hipnos, se não tivermos a decência de pegar num bom dicionário de mitologia para o descobrirmos, nada nos será acessível de René Char, do seu papel, da sua luta pela vida e pela liberdade. (pg. 119)

A arte abstracta, a de Paul Klee, de Kandinsky, ilustra a queda da matéria no silêncio com o qual tem laços indissolúveis. Em terceiro lugar, diria que a temática do ruído, na cultura e na educação modernas me apaixona. A intrusão do ruído, a impossibilidade de encontrarmos espaços consagrados ao silêncio, tanto na nossa existência privada, como na vida pública ou na educação reservada às crianças, parece-me ser a poluição mais grave com que a cultura moderna se confronta. (pg. 138/9)

O universalismo não é portador de qualquer valor de tolerância ou de acolhimento. Traz consigo o seu próprio dogma. O supermercado não quer produtos locais, enlata uma cultura capitalista de exportação que o mundo inteiro terá de sofrer. (pg. 177)


George Steiner (1929-2020), in Quatro Entrevistas... (VS Editor, 2020).


sábado, 3 de abril de 2021

De Antonio Gamoneda (1931)



Alguém entrou pela memória branca no coração imóvel.

Vejo uma luz sob a névoa e a doçura do erro obriga-me a fechar os olhos.

É a embriaguês da melancolia; como aproximar do rosto uma rosa doente, indecisa entre o perfume e a morte.

...........................


Pus água e cinábrio no meu coração e veias

e vi a morte mais distante da púrpura.


Agora os meus olhos vêem no passado: grandes flores imóveis, mães

atormentadas por seus filhos, líquenes fertilizados de tristeza. 

sexta-feira, 2 de abril de 2021

Balanços



Termino, algo defraudado (excepto pela qualidade da escrita), a desfolhada de Lettres à Anne (Gallimard, 2016), nas suas 1.280 páginas. Mas de que é que eu estava à espera? Segredos do poder, confidências demasiado humanas, retratos inescapáveis de alguns homens públicos? Nada disso aparece, as cartas de François Miterrand são inócuas, quase diria, cuidadosas, talvez por precaução futura ou para não enfastiar a jovem enamorada (Anne Pingeot) com aspectos políticos ou com minudências burocráticas do estado. Inesperadamente, nem sequer encontrei referências a Mário Soares. E, quanto a Portugal, apenas aparece um curto apontamento favorável sobre o Porto (pg. 1116), no dia de S. João, de 1977.



Retive alguns sinais do gosto pessoal de ambos, ou de cada um, através de uma notação cinéfila: Les Parapluies de Cherbourg (Jacques Demy), na página 323. E quanto à música clássica as referências abundam. No que diz respeito à música ligeira, não consegui saber qual era a interpretação preferida da canção Anyone who had a heart (Cilla Black?, Dionne Warwick?, Dusty Springfield?). Resta-me a consolação indubitável de que Je chante pour passer le temps, poema de Aragon, refere certamente a versão de Léo Ferré, que aqui fica.




quinta-feira, 1 de abril de 2021

O Medina que se cuide...

 


Já não bastava o alentejano Moedas, vindo expressamente da Fundação, para lhe disputar a presidência, agora é a tonitroante saloia da Malveira, accionista e clowness da TVI, Cristina, que, patrocinada pelo Chega, entrou também na corrida à Câmara de Lisboa. Fernando Medina já não dorme sossegado...

Adagiário CCCXXI

 


Deixa-te de grelos, que é roubo de azeite.