domingo, 31 de julho de 2016

Bibliofilia 145


Eu já tive um encantado afecto pelos livros de Fialho de Almeida (1857-1911) e ainda releio, hoje, algumas das suas obras com imenso gosto.
Por outro lado, esta colecção de culto, minoritário é certo, criada por Vitor Silva Tavares (1937-2015) e que morreu com ele, sempre me mereceu um concentrado respeito. Comprei vários dos seus números, na altura da saída. Entre o fescenino e o raro, o provocador e o proibido, a série contramargem / & etc tem a maior parte dos seus livros-folhetos esgotados.
Pois, esta pequena antologia de Fialho, com o número 11 da série, tem exactamente 35 anos, porque foi editada em Julho de 1981, e contém alguns textos soberbos como, por exemplo, a extravagante descrição do enterro do rei D. Luís I. Depois, o exemplar era o único, que restava, nessa pequena, mas muito cuidada livraria da Cova da Piedade, onde o comprei. Custava 3 euros - para quê esperar?


sábado, 30 de julho de 2016

Português em destaque (10)


Nascido em Lisboa, no ano de 1980, o fotógrafo João Pina - arriscaria a dizê-lo - é talvez mais conhecido no Brasil e em França, do que no seu país de origem. No Musée Arles Antique tem, presentemente, uma exposição sobre a repressão em países da América Latina, com fotografias que integraram o seu livro Operação Condor. Filho de pais comunistas, os aspectos tortuosos das ditaduras são uma das suas temáticas mais obsessivas, bem exemplificadas no livro Por teu livre pensamento (Assírio & Alvim), com texto de Rui Daniel Galiza, ilustrado com fotografias suas.
Presentemente, encontra-se no Brasil, para cobrir os Jogos Olímpicos, e suas consequências...


sexta-feira, 29 de julho de 2016

Recuperado de um moleskine (23)


Há um cheiro a sabonete novo que vem no ar inesperado do crepúsculo. Que se cruza com as quatro cores do fim da tarde: o róseo tímido, o azul já desmaiado, um roxo brando e o amarelo-adeus do Sol. O cinzento não era, ainda, para ali chamado.
Foi por essa altura que notei a rola (uma das 3 residentes) pousada na antena parabólica, em frente, a preparar o voo, num nervosismo de asas. E, então, pela segunda ou (?) terceira vez, na minha vida, eu a vi subir quase na vertical, como um helicóptero. Assim mesmo.
Fica anotado o milagre ou simples fenómeno singular. Foi em Julho, o piso alcatroado tremulava. Ou mellhor, fumegava quase.

quinta-feira, 28 de julho de 2016

Do cancioneiro tradicional castelhano (1)



Se a moça me pede,
e a velha me paga,
não sei o que diga,
nem sei o que faça.

Outras catedrais


Por razões pessoais, tive que me deslocar, recentemente, a duas importantes dependências diferentes de instituições bancárias, a que já não ia há muito.
Para lá da arquitectura exterior faraónica, o espaço interior era enorme, embora pontuado de pequenos cubículos envidraçados. Amplo espaço, mas quase deserto de clientes e funcionários. O que fora antes (há 30/40 anos) colmeia fervilhante de movimentos (humanos) e zumbidos, era agora um recinto quase sem vivalma, e assepticamente silencioso. Uma catedral de vazio a que só faltava o ritual de um serviço divino.
Ou, talvez melhor, um majestoso mausoléu, museologicamente limpo, donde múmias poderiam surgir a todo o momento.

quarta-feira, 27 de julho de 2016

Ensaio


Para o programa de amanhã, no Largo de S. Carlos, em Lisboa, encontrava-se, hoje, a Companhia Nacional de Bailado a ensaiar.

Aqui fica, para MR, um cheirinho a dança.

Post de HMJ

A par e passo 171


Do meu ponto de vista, a mais autêntica filosofia não se encontra nos objectos da nossa reflexão, mas sobretudo no próprio acto do pensamento e nas suas movimentações. Retire-se à metafísica todos os seus termos predilectos e temáticos, todo o seu vocabulário tradicional, e talvez possamos concluir que não empobrecemos o seu pensamento específico.

Paul Valéry, in Variété V (pg. 157).

terça-feira, 26 de julho de 2016

Comic Relief (128)


Não estar à altura.
Já Sarkozy usava uns sapatos de saltos altíssimos, para estar à altura de Carla Bruni.
Agora, a François Hollande, arranjaram-lhe um palanque...
Estes pequenos gauleses deviam era pôr os olhos no grande Corso!


grato reconhecimento a C. S..

Ao Exmo. e Iltmo. Youtube, marcano (muito pouco rigoroso, deselegante e boçal)


Creio que quase todos os Bloggers têm no seu activo, se usam música no Blogue, a desagradável experiência de lhes terem sido sugados, por essa inefável Eminência, alguns vídeos.
Devo dizer que tenho um especial prazer, quando detecto o facto, de substituir esse vazio, por outro vídeo quase igual ou muito semelhante. Sobretudo quando eles dizem: "This video doesn´t exist" - nessa fórmula Trump(eana), mentirosa e boçal, que os caracteriza.
Hoje, já ganhei o dia: já preenchi e ocupei, de novo, duas sugadelas do Youtube. Não digo é quais... não vá o diabo tecê-las.

Citações CCXCII


Católicos e Comunistas cometeram grandes crimes, mas, pelo menos, não se puseram de lado, como instituições estabelecidas, e não ficaram indiferentes. Eu preferiria ter sangue nas minhas mãos, em vez de água como Pilatos.

Graham Greene (1904-1991), in The Comedians (1966).

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Reciprocidades


Reconheço um poeta verdadeiro, no modo como ele se me repercute, depois da sua leitura. Recíproco, como uma mola suave. Induzindo uma intenção secreta, por uma frase, um verso, uma palavra. Que ganham, no entanto, uma outra direcção, outro sentido. O curso projectado de um diferente conjunto de versos.
Pode até acontecer que o poema lido, inicial, não seja do meu agrado mas, provocador, ele desencadeia uma reacção de movimento ou ritmo, um dizer novo que vem do interior, e que foi tocado pela graça, em mim. Numa resposta mais ou menos clara. Ou até mesmo críptica.
Porque essa corrente de linguagem subterrânea é uma espécie de trilho de cogumelos pronto a emergir em direcção à luz. Numa vocação irresistível.

domingo, 24 de julho de 2016

Fina García Marruz (Cuba, 1923)


As últimas palavras

Quem nos abriu os olhos
sem deixar notícia
da oferenda?
Com que lágrimas
dormiremos uma noite?
Quem abateu as árvores
para iluminar
a paisagem?
Será que vou entender alguma vez
a vida cega,
essa delicadeza que se oculta?

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Do rifoneiro castelhano (2)


Al bobo múdale el juego.

( Ao bobo troca-lhe o jogo. )

Filatelia CXIV


O primeiro catálogo de selos portugueses, que tive, era do ano de 1953, precisamente do centenário da criação dos primeiros selos portugueses - reinado de D. Maria II (1853). Era uma edição modesta, mas digna, a preto e branco, patrocinada pela casa filatélica Simões Ferreira (Porto), mas elaborada por coleccionadores de selos com reconhecido mérito e isenção. Os preços sempre me pareceram justos. Outros catálogos fui comprando, ao longo dos anos. Nacionais e estrangeiros (Yvert, S. Gibbons, Michel).
Fui-me apercebendo das diferenças. Nos catálogos portugueses, os selos portugueses nunca baixavam de valor, acompanhando, no mínimo, a inflação. Enquanto nos estrangeiros, os preços oscilavam consoante a procura do mercado. O exemplo mais flagrante era o dos catálogos da Stanley Gibbons. Talvez por isso, as grandes colecções de selos (clássicos) portugueses foram quase todas leiloadas na praça de Londres. Como foi o caso da notável colecção do brigadeiro Cunha Lamas. Dispersando-se assim um acervo nacional importante...
Saído já há algum tempo, comprei ontem o mais recente catálogo, da Mundifil (para 2016), herdeiro nobre na sucessão do Simões Ferreira e, depois, dos catálogos Ateneu do Porto/Afinsa, orientado, aquele, por J. Miranda da Mota, conhecido e importante filatelista português. A edição é luxuosa, a cores e papel couchet, e suficientemente especializada para um coleccionador que se preze.
Em breve comparação, pouco rigorosa, pude aperceber-me que entre 2002 e 2016, os selos portugueses tiveram um aumento de valor, nos preços, entre 25% e 30%.



quarta-feira, 20 de julho de 2016

Regresso ao Futuro


Não sei porquê, mas imaginei Joana Vasconcelos daqui por uns bons anos...

terça-feira, 19 de julho de 2016

Apontamento 82: Limpeza da Capital


Por acaso, gostei da simulação do arranjo da baixa lisboeta. Pode ter um aspecto muito asséptico e limpinho, mas sublinha a nobreza do espaço.

Prefiro o espaço ordenado àquele desleixo e pretenso “multiculturalismo” actual, ao que parece sem “lei, nem roque”. Cada um monta a barraca – até no Jardim de S. Pedro de Alcântara a tapar a vista para o Tejo – instala um altifalante e começa a berrar ou cirandar. Seguem os que levam o cãozinho e outros a mostrar as chagas para puxar para a miséria.

Senhores ! Até quando uma capital a puxar para o chinelo, com espectáculos chungas a fazer as delícias de turistas boçais ?
Como diria o outro: “Lisboa tem mais encanto ....”

Post de HMJ

Da leitura (14)


Ao seu romance Grande Sertão: Veredas (1956) chamou João Guimarães Rosa (1908-1967) "autobiografia irracional". Mas ele não destoa, de um modo geral, do registo da sua restante obra. A toda ela preside um tratamento onírico (poético?) da linguagem, onde o léxico antigo se mescla no regional, estrangeirismos sabiamente aportuguesados, convocando reminiscências sensoriais, sabedoria popular, mas também científica, num discurso que muitas vezes se assemelha ao piloto automático do surrealismo.
Por alguns aspectos os seus livros lembram-me, também, dois antigos escritores portugueses: Jorge Ferreira de Vasconcelos (1515?-1585) e, um pouco menos, Francisco Manuel de Melo (1608-1666). Nas Comédias do primeiro são frequentes os bordões de linguagem, normalmente, provérbios que o escritor utiliza num encadeamento vertiginoso em que é difícil distinguir o que são as palavras do autor e a sabedoria ancestral e popular. Idêntico processo se verifica em algumas obras do poeta seiscentista.
Voltando a Guimarães Rosa, de que releio Grande Sertão: Veredas. É manifesto o uso de adágios, existentes, ou criados para o efeito da função de máximas, que asseguram (numa espécie de suspension of disbelief) ou fortificam o decurso da narração que é um prolongado contar de história, quase monólogo, saborosíssimo, aliás. Por aqui deixo 4 pequenos exemplos das primeiras páginas:
- "...quem mói no asp'ro, não fantasêia. ..." (pg. 11)
- "Sua alta opinião compõe minha valia." (pg. 11)
- "...passarinho que se debruça - o voo já está pronto!" (pg. 13)
- "Sou só um sertanejo, nessas altas ideias navego mal!" (pg. 14).

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Retro (86)


Publicação curiosa do Instituto do Vinho do Porto, de que mão amiga me fez chegar alguns números, estes Cadernos informam-nos, estatisticamente, sobre vários aspectos do comércio de  exportação do néctar duriense, no período à volta da II Grande Guerra.
Por curiosidade, deixo também em imagem um gráfico sucinto sobre a divisão dos custos/lucros, em Inglaterra, com base na venda do Vinho do Porto que se exportava em 1948. Como será hoje? E depois do Brexit, como virá a ser?


sábado, 16 de julho de 2016

Instantâneos outrabandistas


1. A bandeira verde rubra, que tremula ao vento, vai desbotando ao Sol inclemente. Perdeu a euforia das cores mais vivas, esquecida cá fora, já inútil. Como a emoção se gastou, primária, de todo, terá agora de vir a renascer e de ir para outras coisas...
2. O trambolho loiro, massa informe de carne esbranquiçada, envolta no que parece ser um sumário roupão de praia donde ressaltam inúmeros refegos, desce lentamente as escadas. Vai juntar-se depois lá fora a três amigas mais velhas, no banco do jardim. Todas murmuram. Ou resmoneam?
3. Por toda a parte se procura a palavra mais ajustada. Ou mais justa ao sentimento da tarde. Mas mais vale esquecer a palavra, que as frases na sua dispersão própria de alma são sempre mais fáceis de encontrar. E os números estão sempre prontos a serem concretos.
4. Nuvens de branco, as 22 orquídeas, mais 11 promissoras, à direita. À esquerda, mais 9 amarelas pintalgadas do que parece ser sangue vegetal, por entre as sardinheiras. Mais catorze por desabrochar, ainda. Dois limões, envergonhados e minúsculos, escondem-se na folhagem pródiga do limoeiro alto.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

2 pontos de ordem à mesa, ou o mau perder dos "estadistas" medíocres europeus


Já não me surpreendem, mas irritam-me as bocas foleiras de alguns estadistas europeus sobre a política portuguesa. Como se fossem eles os patrões desta nossa terrinha. Ele são os boeres, os suabos, os gauleses e, agora, até um espanholito das Finanças se dignou mimosear-nos com uns dichotes pacóvios. Porque será que eles não tratam mas é de arrumar a casa e resolver, sim, os problemas deles?
Mas, ontem, fiquei estupefacto com as declarações agressivas de três ou quatro luminárias políticas (alemãs e francesas, principalmente) sobre o novo governo inglês constituído por Theresa May. Boris Johnson foi o bombo da festa. O Ministro dos Negócios Estrangeiros francês até lhe chamou mentiroso, perante as câmeras da televisão gaulesa. E o banalíssimo Hollande também mandou bocas. Já não há decoro, nem maneiras!
É esta a classe lumpen que governa a Europa. Deus nos acuda!

Adagiário CCLVI


A indústria, para ser eficaz, tem de acompanhar as flutuações da moda ou os novos interesses do público.
Assim se explica que, actualmente, uma boa parte dos livros que se publicam venham já acompanhados de marcadores alusivos à obra, publicitando também a editora. É a constatação do facto duma intensificação de interesse no coleccionismo de marcadores de livros.
Outro tanto tem vindo a acontecer com os pacotinhos de açúcar que as Cafeeiras vendem com o seu produto principal. Pululam séries temáticas, algumas bem criativas e originais. Outras com design arrojado e bom gosto estético, que nos surpreendem e nos motivam para pequenas colecções que vão surgindo nos mais diversos blogues, através de imagens sugestivas.
Desde sempre me interessei por adagiários, que traduzem a sabedoria ancestral dos povos nos mais diversos aspectos da vida prática, quer nos seus aspectos mais sérios, mas também, por vezes, galhofeiros e atrevidos. Por isso, não posso deixar de saudar esta nova temática dos pacotinhos de açúcar do Café Sical, consagrada aos rifoneiros internacionais.
De uma série de nove, aqui ficam o nº 3/9 (com um adágio indiano) e o nº 4, com um provérbio etíope, que aqui reproduzo, para uma melhor leitura:

3/9 - Um segredo é pouco para um, suficiente para dois, demais para três. (Índia)
4/9 - Um bom nome é melhor que um bom perfume. (Etiópia). 

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Recomendado : sessenta e três


Os ensaístas, bem como os filósofos, nunca abundaram na terra portuguesa. Se considerarmos apenas o ensaio literário, desde o pioneiro Moniz Barreto (1863-1896), luso-indiano, a lista de figuras, que abordaram a temática, reduz-se ainda mais. Deixo de fora o ensaio académico feito por universitários, mas também aí as obras de qualidade escasseiam.
Estudiosos há, cuja actividade literária sai prejudicada da sua excessiva exposição política. Antes como agora. Estou-me a lembrar, por exemplo, do esquecido Fidelino de Figueiredo (1889-1967), que tem uma obra ensaística muito interessante sobre as literaturas comparadas peninsulares. E que é raramente referido.
Poeta estimável, Vasco da Graça Moura (1942-2014) incorreu no mesmo pecado de exposição partidária. Tradutor de grande mérito e crítico arguto, não o devemos esquecer, pese embora o seu polémico grau de intervenção política, em anos ainda recentes e talvez nem sempre pelas melhores causas...
Estes Discursos Vários Poéticos (Verbo, 2013) são no entanto obra limpa e valiosa. Desde os capítulos sobre tradução de poesia à síntese explicativa e brilhante da obra de Nemésio, passando por alguns concisos apontamentos sobre a poesia de Mourão-Ferreira e de Sophia. Não resisto, por saborosa, à transcrição que VGM faz, oblíqua a propósito dos portugueses, colhida em Fastigímia, de Tomé Pinheiro da Veiga:
Em descobrindo o Portugalete, se nos mostrou uma cara de vilãozinho, encarquilhada, mui trefo, tudo penedos escabrosos e montes, sem nenhuma lhaneza, muita silveira e a terra partida aos palmos com suas paredinhas, como quem diz: isto é meu, não é teu, não me furtes as minhas uvas.
Bem como esta afirmação polémica - com que aliás eu concordo - de sua lavra, numa avaliação comparada: "Essa palavra poética toca-nos não porque revela Deus, mas porque Nemésio era muito melhor poeta do que Régio ou Torga." (pg. 400)
Por estes e outros motivos, estimulantes, aqui venho recomendar este livro de ensaios de Vasco da Graça Moura. Tirará o seu proveito, quem o ler.

quarta-feira, 13 de julho de 2016

D. Duarte em versão inglesa


Foi com manifesta surpresa, e júbilo também, que, no penúltimo TLS (nº 5909), vi a informação da saída em versão inglesa do clássico da literatura portuguesa e de equitação "A ensinança de bem cavalgar toda  sela", composto pelo rei D. Duarte (1391-1438).
Escrito no século XV, foi editado apenas no século XIX. A obra, que em inglês tem o título de The Book of Horsemanship, foi traduzida por Jeffrey L. Forgeng, e editada pela Boydell & Brewer, recentemente.

Citações CCXCI


Cada romance é um testemunho numerado: constitui uma representação do mundo, mas de um mundo a que o romancista acrescentou qualquer coisa: o seu ressentimento, a sua nostalgia, a sua crítica.

Mario Vargas Llosa (1936), in Revue Libre, 1971.

terça-feira, 12 de julho de 2016

(des)Colagem política


Não gosto de propagandear azémolas e vendidos, no Blogue, por isso raramente os faço representar em imagem. Como dizia o Namora, a publicidade, ainda que negativa, ajuda...
Este Bloem (significará flor, em neerlandês? Se é, não é tulipa, nem que se cheire...) Di(j)sse e tem dito várias coisas desagradáveis e autoritárias sobre Portugal. Nem sequer são inteligentes e, por isso, não as suporto.
Gelificado de cabeça, bastardo do ganancioso Blair e pau mandado do aleijadinho germânico, este boer anquilosado e cavernícola apenas ambiciona uma reforma dourada como o bovino luso-barrosão.
Deus, se existe, que não lha conceda!


Pinacoteca Pessoal 115


Face a uma pintura abstracta, confesso que a minha opinião (de amador) é demorada, ao contrário de uma obra figurativa que desencadeia mais facilmente, em mim, uma adesão ou um desagrado, algum gosto e empatia, ou mera neutralidade. Perante uma tela abstracta dou-me conta, instintivamente, a procurar um pequeno indício ou sinal de coisa física, um rosto insinuado, a silhueta de um edifício no espaço da pintura que decifre para mim um qualquer simbolismo. Mas logo tendo a abandonar esse movimento interior de olhar que busca uma tradução que não existe, nem poderia existir, naturalmente. Mesmo nas obras de um amigo meu, que a pratica (arte abstracta), e porque o conheço razoavelmente, o mais que consigo é pressentir estados de espírito, por intuição nem sempre fundamentada.
Um dos casos raros de imediata adesão a uma pintura de natureza abstracta, aconteceu-me com a obra do pintor francês, de origem russa, Nicolas de Staël, que nasceu em 1914 e veio a suicidar-se, em Paris, no ano de 1955. Pelo meio da sua vida chegou a integrar a Legião Estrangeira, francesa (na Tunísia). As suas paisagens são marcadas por pinceladas espessas, mas de grande beleza estética no seu conjunto de harmonia que, de imediato, conquistaram a minha admiração.

Quanto às suas naturezas mortas de interior, também o seu lirismo pictórico e a sua simplicidade tiveram sobre mim um grande fascínio. Bem como algumas ilustrações que fez para livros do seu grande amigo e poeta René Char.

Não quero ainda deixar de referir a beleza esquemática, quase diria a tocar o osso e o essencial, que se podem surpreender em muitas das suas marinhas de inspiração abstracta. E de grande magia encantatória. De que aqui deixo um exemplo, em imagem final.




segunda-feira, 11 de julho de 2016

Do rifoneiro castelhano (1)


La hermosura de la ramera y el hablar del loco, valen poco.

(A formosura da rameira e o falar do louco, valem pouco.)

Tratamentos


Tenho verificado, ao longo da minha vida, que, numa relação de serviço sem conhecimento prévio dos intervenientes, o prestador do serviço me trata quase sempre pelo nome e não pelo apelido. Eu tento sempre fazer o inverso, a menos que não conheça o nome de família do indivíduo.
Mais raramente, o meu interlocutor acrescenta o meu nome ao apelido, na conversa. São escassas porém as vezes em que sou tratado apenas pelo(s) apelido(s). E creio que esta impropriedade é genuinamente portuguesa. Porque, lá fora, isso só excepcionalmente acontece, e só depois de alguma intimidade de convivência, seja de serviço ou social.
Sou levado a crer que o facto é resultado de sermos um país pequeno em que tudo parece contíguo. Mas posso estar enganado...

Wim Mertens : "Hedgehog's skin"


Obs.: único inconveniente do vídeo - cerca de 50 segundos de aplausos, no final...

domingo, 10 de julho de 2016

Como lhe havemos de chamar?


Comic Relief?...
Instantâneo colhido a Sul, por A. de A. M., a quem agradeço.

França - Portugal


Não me é indiferente a final, em Paris, da selecção de futebol de Portugal contra a França.
Mas sei também que, seja qual for o resultado, nada se alterará na minha vida. Nem na de milhões de portugueses, cá dentro ou lá fora. Talvez apenas os portugueses, que vivem em França, ganhem alguma maior auto-estima e se sintam fortalecidos nas suas capacidades, no seu país de adopção ou necessidade.
Mas os tiranetes da CEE continuarão a incomodar-nos e a tentar humilhar-nos, fazendo chantagem psicológica, financeira e económica, como se nada se tivesse passado. E vai passar, realmente?
Acima de tudo, não sou pela emoção fácil, nem pelos triunfalismos vaporosos. Além disso, sei também que as televisões e os jornais, à falta de melhor assunto, me vão xingar o juízo, com o tema, durante dias e dias...
Por isso não estou optimista com as perspectivas.
Há que lembrar, neste caso, o poeta Alexandre O'Neill: ...Acaso o nosso destino, tac!, vai mudar?

A par e passo 170


Na realidade existe no poeta uma espécie de energia espiritual de natureza própria: manifesta-se nele e revela-se-lhe em certos momentos de importância infinita. Infinita para ele...
E eu digo: infinita para ele, porque a experiência, no fundo, ensina-nos que esses instantes que nos parecem de valor universal são, muitas vezes, sem futuro, e fazem-nos meditar nesta máxima: o que vale para um único não vale nada. É a lei aérea da Literatura.
Mas todo o verdadeiro poeta é necessariamente um crítico de primeira ordem. (...) O espírito é terrivelmente volúvel, enganador e enganado, fértil em problemas insolúveis e soluções ilusórias. Como é que uma obra notável poderá sair deste caos, se este caos que contém tudo aquilo que continha também aquelas oportunidades de se conhecer a si mesmo e de escolher o que pode e deve ser retirado desse mesmo pequeno instante e ser cuidadosamente utilizado?

Paul Valéry, in Variété V (pgs. 156/7).

sábado, 9 de julho de 2016

Jean Daniel, a propósito da morte de Michel Rocard (1930-2016)


Envelhecer é ainda mais difícil quando pessoas como tu, Michel, têm a péssima ideia de nos deixar.

Jean Daniel, in L'Obs. (nº 2696).

L'Obs.


De vez em quando, ainda faço o favor de comprar L'Obs. Não sei se é um favor à minha juventude já distante ou se o respeito por um afecto já perdido.
A revista francesa fez parte da minha aprendizagem política e comecei a lê-la com 24 anos. Pontificava então Jean Daniel (1920), seu fundador, e um pied-noir que foi amigo de Camus. Já afastado, ainda hoje, de tempos a tempos, escreve alguns editoriais, normalmente exemplares, sobre assuntos importantes, que leio com prazer. Ao folhear a revista, previamente, antes de me decidir a comprá-la, na banca lisboeta que frequento, se deparo com um artigo de Jean Daniel, não resisto.
Mas nunca mais voltei a comprar L'Obs. sistemática e indiscriminadamente. O semanário piorou muito ao longo dos últimos anos. Fechou-se também muito sobre a realidade francesa. No grosso do seu miolo têm lugares cativos a política gaulesa, por extensas páginas, o Daesh, o terrorismo de uma forma geral, e os refugiados. Repetidamente. Que saudades do tempo em que falavam de Portugal por causa do 25 de Abril, e em que algumas figuras portuguesas chegaram a fazer capa da revista!...
O jornal Le Monde noticiava, há dias, que a Direcção de L'Obs queria reduzir as despesas em 5 milhões de euros por ano, e que haveria um plano de rescisões amigáveis, em marcha... Eu creio que a culpa é de quem tem vindo a refazer a revista e nas cedências que tem procurado fazer para angariar mais leitores - sem resultado. Normalmente até dedicam 6 ou 7 páginas (cerca de 10% da revista) a assuntos róseos ou quejandos... Há vinte anos atrás, seria um sacrilégio.
Ora isto é como a Igreja ou o Partido Comunista. Se abre muito, definha e morre...

sexta-feira, 8 de julho de 2016

No reino dos Algarves


Do Algarve, província portuguesa que não aprecio particularmente, guardo no entanto boas recordações de Lagos e de Vila Real de Santo António. Lagos não se descaracterizou demasiado e o seu "D. Sebastião", de Cutileiro, é das esculturas portuguesas que mais gosto e que nunca me canso de rever. Quanto a Vila Real de Santo António, o seu geométrico traçado pombalino ordenou-a para sempre (?) em patamares até ao rio, de uma forma estética admirável. Onde me sinto bem.
Faço por esquecer Faro e o desordenado Portimão, que me parecem um Cacém ou Reboleira, mais cosmopolita. Dizem que foram os Patos Bravos que estragaram a paisagem algarvia. Talvez.
Mas agora, segundo notícias visuais do meu amigo A. de A. M., parece que um escultor português também contribuiu com um mamarracho de pedra mármore para desfear a zona ribeirinha da Vila Real do Sul. E nada menos que o mesmo escultor do magnífico "D. Sebastião", de Lagos - pois é, o mesmo João Cutileiro (1936). Ele há horas infelizes...
Esta senhora, poetisa ao que dizem, chamava-se Lutgarda Guimarães de Caires (1873-1935) e há-de vir a assombrar (para sempre?) as margens de Vila Real de Santo António. Juntando-se ao Sá Carneiro guilhotinado do Areeiro (Lisboa) e ao Bispo do Porto, anão de pernas curtas, no Jardim da Cordoaria. Fica completo, assim, o trio de horrores da escultura portuguesa moderna...


com agradecimentos a A. de A. M..

Omara Portuondo &...

Com um envoi virtual a Fonseca e Costa (1933-2015) e ao seu "Kilas...".

Divagações 114 (Isto não é uma fábula!)


A gaivota abandonou-se, repentinamente, aos pátios interiores, defronte. Ao circuito fechado do silêncio em que mal cabiam as suas asas abertas.
Imagino que o tenha feito inconscientemente, sem medir o risco e as consequências, nem sequer os limites exíguos do espaço que lhe viria a caber.
Apesar de tudo, conseguiu sair. Como também a abelha intrometida que se viu aflita para esvoaçar para fora da nossa sala, depois de varrer, por alguns minutos interiores, o vidro amplo da janela.
A Grã-Bretanha vai sair de quê? E pode?

quinta-feira, 7 de julho de 2016

Desabafo (14)


Resgate por resgate, tirem-me lá, s. f. f., o aleijadinho arreitado, da cadeira de rodas, a ver se ele se cala.
É que eu já não consigo ouvi-lo, na sua incontinência pueril, gaguejante e ressentida!

Memória (109)

Uma breve síntese para recordar o magnífico filme de Milos Forman (1932) e a divina música de Mozart (1756-1791) que, neste Rondó à moda Turca, atinge um dos seus esplendores...

Madrugada, manhã e andorinhas


Parece mais feliz e sereno o voo das andorinhas, esta manhã. Que não aquele bater de asas inquieto e nervoso, ziguezagueante, que lhes é habitual. O ar está fresco e quase desapareceu a névoa sobre o rio. Limpa talvez pela bátega que caiu, pelas quatro da manhã, e me acordou. Primeiro, o tropel violento do granizo fino, depois a cadência persistente da chuva ritmada, que nunca mais acabava...
O Sol tenta vencer as nuvens ralas, enquanto as andorinhas se abandonam à sua dança suave, em grupos pequenos de duas ou três. Zilram baixo. Algumas pombas preguiçosas, pelos telhados, parecem esconder a cabeça sob as asas. Das gaivotas invisíveis, apenas se ouvem, de longe a longe, os roncos dissonantes.
Composto o esboço, vou-me ao banho.

Última safra


Ontem, foi um fartar vilanagem!...
Depois do almoço, uma caverna de Ali-Babá, desarrumadíssima, onde milhares de livros se desordenavam em prateleiras e no chão, ali para a Estrada de Benfica. Optei pelos policiais, acima, mais La neige était sale, de Simenon. Destaque para a capa de Jorge Colombo, no volume da Colecção Xis que, habitualmente, era ilustrada por Edmundo Muge. Esportulei 5 euros.

Já mais tarde, o meu Alfarrabista de referência. Que levara a efeito recentemente uma venda temática, no sábado passado e que eu preanunciara (poste "Última hora", de 30/5/2016). Foi muito falada esta quermesse. E concorrida. Até ocasionou artigos em jornais, com fotografias e tudo.

Deparei-me com os despojos da batalha, mas ainda havia alguns troféus. Porque ainda comprei uma primeira edição de  contos de Graham Greene, e algumas outras obras que me interessavam. Foram 15 euros bem empregues. E devo ter leitura para todo o Verão.
Hoje, não saio de casa, para evitar mais tentações...


terça-feira, 5 de julho de 2016

Há 46 anos...


Se eu disser que, em Braga, há 46 anos, amanheceu com céu limpo e foi um dia de calor, estou a falar verdade e com rigor. O passado, na nossa memória, regula-se e baliza-se por acontecimentos marcantes da nossa vida. Se me lembro que em 5/7/1970 esteve calor, isso é apenas um aspecto secundário de uma data importante, na minha vida. Que desencadeia um antes e um depois.
Acabei de ler, recentemente, o livro em imagem, na tradução portuguesa da Bertrand que me parece fraca e desleixada (houve, pelo menos 3 frases de que não percebi o sentido, a tradutora usou "repetidor" em vez de repetente, etc....), e cuja revisão foi descuidada, porque o livro apresenta inúmeras gralhas. Mesmo assim estas Memórias resistem, pela qualidade intrínseca do texto de Simone de Beauvoir (1908-1986).
O que me surpreendeu mais, no entanto, foi a minúcia com que S. de B. reconstruiu os tempos de infância e adolescência, numa altura em que já tinha 50 anos. Tudo me leva a crer que houve uma efabulação da realidade, consciente ou não. E que a ficção acabou por preencher os hiatos da memória, nesta autobiografia pormenorizada.  Como, muitas vezes, também a nós acontece...

Da leitura (13)


A minha experiência humana era ainda curta; por falta de uma boa luz e palavras apropriadas não abrangia tudo. A natureza mostrava-me, visíveis, tangíveis, uma grande quantidade de maneiras de existir das quais eu nunca me tinha aproximado. Admirava o isolamento magnífico do carvalho que dominava o parque-paisagem; entristecia-me a solidão acompanhada das ervas. Conheci as manhãs ingénuas e a melancolia crepuscular, os triunfos e os declínios e as renovações e as agonias. Alguma coisa em mim um dia concordaria com o perfume das madressilvas. Todas as tardes me sentava entre as mesmas urzes e olhava as ondulações azuladas das Modédières, todas as tardes o Sol se punha por detrás da mesma colina: mas os vermelhos, os rosas, os carmins, os púrpuras e os violetas nunca se repetiam. Nas pradarias imutáveis zumbia de madrugada até à noite uma vida sempre nova. Face ao céu que muda, a fidelidade distinguia-se da rotina e envelhecer não era necessariamente uma negação.
De novo era única e desejada; era preciso o meu olhar para que o vermelho da faia encontrasse o azul do cedro e o prateado dos álamos. Quando partia, a paisagem desfazia-se, não existia para mais ninguém: não chegava a existir.

Simone de Beauvoir, in Memórias de uma menina bem-comportada (pgs. 129/30).