quinta-feira, 30 de junho de 2016

Uma fotografia, de vez em quando (84)


Tendo a encadernação como sua profissão inicial, o checo Joseph Sudek (1986-1976) cedo a abandonou por, no decurso da I Grande Guerra (1916), ter sido ferido com gravidade no braço direito, que veio a ser-lhe amputado. E porque lhe ofereceram uma máquina, começou a interessar-se, cada vez mais intensamente, pela fotografia. A sua vasta obra é de grande qualidade, muito embora a sua temática predominante seja, insistentemente, a cidade de Praga. De tal modo, que ainda hoje o recordam, afectuosamente, como o Poeta de Praga. A série da reconstrução da Catedral de S. Vito, em Praga, é um dos conjuntos mais bem sucedidos da sua obra fotográfica, em que a luz coada cria uma poalha fantasmática muito singular e aparentemente misteriosa.






Joseph Sudek terá sido sempre um homem tímido, discreto e modesto. Conta-se que, na inauguração das suas exposições (e teve muitas), raramente aparecia. Gostava de expor a sua obra, mas não gostava de se expor...

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Ver melhor


Quando eu era pequenino, lembro-me que praticamente só usava óculos de sol, na praia.
A meio da minha idade, alguém que vivera em África, onde eu nunca estivera, ensinou-me duas coisas: que os nativos raramente dispensavam o uso desse adereço, mesmo que chovesse; e que um negro de cabelos brancos era, forçosamente, muito velho - duas coisas que nunca mais esqueci. 
Com o tempo e a globalização, habituei-me a ver excessivamente as pessoas mais diversas a usarem óculos de sol, estivesse o tempo que estivesse. E dava-me a pensar comigo: devem ver o mundo ainda mais negro do que ele é, na realidade... Mas, por outro lado, dizia: isto é óptimo para as lojas de óptica! E para os ciganos que os vendem pela rua, contrafeitos.
Ora, logo pela manhãzinha, HMJ contou-me uma história divertida, que me pôs bem disposto. Como Lisboa, e embora há muito mais tempo, Colónia (Alemanha) tem muitos turistas. Que se dirigem, invariavelmente, para ver a Catedral, como, na capital portuguesa, têm de, obrigatoriamente, viajar no eléctrico 28 ou subir, em rebanho acarneirado, ao elevador de Sta. Justa. Todos lêem pela mesma cartilha, acefalamente. Quantos deles irão, em contrapartida, ao MNAA? Porque ao Museu dos Coches vão eles: reza da cartilha globalizante...
Pois bem, o Deão da Catedral de Colónia estava a receber muitas reclamações de turistas, sempre pelo mesmo motivo: que a Catedral estava muito mal iluminada. O Deão acabou por responder-lhes, em entrevista: "Quando entrarem na Catedral, tirem os óculos escuros!" 

Osmose 84


Quase todos nos consideramos normais, excepto os génios e todos aqueles que nem sequer sabem pensar sobre isso. São os felizes que, como a Bíblia prescreve, hão-de alcançar, em beatitude, o reino dos céus.
Mas as visões existem. De um modo subjectivo e individual que, por força da veemência emocional (a montante) pode atingir e contagiar o colectivo, de forma irracional, a jusante (Lourdes, Fátima...).
Daí, eu estar de acordo, à partida, com a classificação que Jeffrey A. Lieberman atribui a Freud, pela sua activa contribuição pioneira nos domínios da psiquiatria:
... a tragic visionary far ahead of his time (...) simultaneously, psychiatry's greatest hero and its most calamitous rogue.

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Apontamento 80: Um galerista fala sobre a Arte e os Artistas


Jörg Johnen, galerista em Berlim e que iniciou a sua carreira, em 1984, em Colónia, Alemanha, deu, recentemente, uma entrevista ao jornal DIE ZEIT, tecendo considerações sobre o estado actual da Arte e dos Artistas.

A sua visão crítica, num olhar de despedida sobre a sua carreira, não engrandece a Arte, nem abona nada sobre a maioria dos Artistas.

Johnen sublinha que uma recepção intelectual da Arte foi substituída por fenómenos como a “posse”, a “auto-representação” e o “glamour”, tornando-se duvidoso o caminho dos Artistas que seguem esta “pista do capital” de coleccionadores endinheirados.

O galerista, mantendo-se fiel a alguns, poucos, artistas, confessa-se cansado de uma arte contemporânea feita de “cliques de rato”, “junções artesanais” de “corte e costura”. No fim, fala de um dos seus Artistas que ele considera pela espiritualidade, mas que não consegue ter o êxito merecido pela timidez e modéstia, características tão fora do mundo actual.


 Post de HMJ

Da Holanda, em particular


Não é sequer dos meus escritores policiais preferidos, mas o inglês Nicolas Freeling (1927-2003) rodeava de ingredientes muito interessantes as obras que tinham o inspector holandês Van der Valk como protagonista central. Falava dos costumes, de gastronomia, do ambiente paisagístico holandês, com à vontade e propriedade. Talvez porque, apesar de britânico, vivera na Holanda, casara com uma holandesa e tinha uma avó dessa mesma naturalidade, com o apelido Vierling.
O livro (em imagem) que acabei, ontem, de ler, "Na pista do crime" (Sand Castles, 1989), foi o último que Freeling escreveu da série de Van der Valk que foi  adaptada pela BBC, em televisão. Comprei-o numa abada de Vampiros, que adquiri, usados, no Montijo, algumas semanas atrás, por 1 euro cada. São várias, nesta obra acima referida, as referências aos holandeses, e bem curiosas. Por isso, vou proceder a algumas transcrições:

" Os holandeses são democratas: quando tratam alguém por Meneer estão a ser sarcásticos. Como por exemplo: «Meneer, não se importava, por favor, de retirar a ponta da sua bengala de caça de cima do meu dedo do pé?" (pg. 8)
" O quarto de casal dava para o mar. Tal como todos os quartos holandeses era mal ventilado e sobreaquecido." (pg. 14)
" Os holandeses não são dotados para as artes culinárias. Falta-lhes o instinto que os belgas tão bem possuem (quando se deixam persuadir a cozinhar os seus pratos típicos). (pg. 15)
" Primeiro, a paixão dos holandeses pela luz eléctrica; as ruas podiam não estar mais iluminadas do que uma aldeia remota do Texas, mas no interior de uma sala de estar de doze metros quadrados, era vulgar encontrarem-se dez lâmpadas acesas." (pg. 17)

para a Sandra, no seu "Presépio com Vista para o Canal", que, com propriedade e conhecimento de causa, poderá apoiar ou refutar estas insinuações..:-)

domingo, 26 de junho de 2016

Desabafo (13)


Vai sendo sistemático, repetitivo, corriqueiro, banal. Os jornalistas ouvem os vizinhos e amigos do assassino ou do autor do massacre, e estes dizem: "Ele até era educado, discreto, sossegado... Nada fazia prever isto!" Os jornalistas ouvem os pais, os irmãos, a família, enfim, e sai o estereótipo: "Nunca pensei...Fiquei em estado de choque (ou: "estou devastado", que se usa muito, hoje em dia, sobretudo nas revistas róseas...)!" Depois, vêm os psicólogos (lobby muito importante e essencial, actualmente, nestas coisas) explicar ou, então, dar apoio psicológico aos familiares das vítimas. É esta a rede assistencial e clientelar dos acidentes ou desastres - os suspeitos do costume. Mais a gentinha que, no local fatídico ou simbólico, vem pôr inúmeros ramos de flores, cartazes e velinhas acesas - uma espécie de indústria caseira de caridade, que os meios de informação aproveitam para fotografar ou filmar. Porque tem colorido, emociona as almas simples, apaga remorsos, e faz vender jornais...
Quando é que isto terá começado? E será que algum dia irá acabar? Dando lugar ao silêncio, à discrição, à compassividade interior de cada um e sem o mínimo folclore exibicionista.

Citações CCXC


O mau gosto é um gosto autêntico, evidentemente, e o bom gosto é o resíduo do privilégio de alguns.

Dave Hickey (1940), in Art Guitar: Essays on Art and Democracy.

sábado, 25 de junho de 2016

O romance da coxinha


Estes avisos funestos que, agora, aparecem nos maços de tabaco, fazem-me lembrar as novelas Tide radiofónicas dos anos 50/60 portugueses. Pela sua iconografia quitche, paupérrima de imaginação, pueril, emocionalmente primária, que foi gerada pelos apparatchik da CEE, e por eles imposta que constassem nas embalagens de cigarros europeus. Bem fizeram os britânicos em querer sair deste navio de tolos, que mete água por todos os lados...
Quanto à vertente imagem piedosa, que encima o poste, gostei que tivessem ressuscitado a saudosa Lady Di, travestida de mãe inconsolável. Mas, por outro lado, fiquei desconfiado. E muito! Não será isto uma forma ardilosa e uma alternativa encapotada para publicitar a interrupção voluntária da gravidez? Ora, cuidem-se!...

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Esboço premonitório ou projecto em jeito de fábula


Era no tempo em que tudo parecia poder vir a acontecer. E ainda não havia a CEE...
Sentado frente à janela da sala de jantar, eu via as metamorfoses vertiginosas das nuvens. Porque elas têm, em si, uma capacidade de sugestão e engano infinitos. E são como um pintor que desenha, mas nunca está satisfeito com o que faz. E vai apagando.
Devia ser Junho. Um Junho não muito definido, que ameaçasse chuva ou trovoadas. E, nessa altura, eu gostava muito de Geografia: aqueles mapas coloridos dos países, os riscos a negro dos rios, o castanho macio das montanhas. A princípio, nas nuvens em frente, começaram a aparecer-me os contornos nítidos da Grã-Bretanha; mas logo, e pouco depois, desenharam-se os limites mais pequenos da ilha de Chipre. Cinco minutos após, as nuvens eram apenas um ponto, como se fora, ao Sul de Espanha, o minúsculo protectorado de Gibraltar.
Que se desvaneceu da minha visão, como por encanto quase de imediato, e eu voltei, de novo, à realidade. E pensei que devia ter ido chover para outro lado...

quarta-feira, 22 de junho de 2016

O grande EfE


Já lhes chamaram os Magriços, e portaram-se bem, numa altura em que não havia inflação nem exagero nas previsões, antes modéstia e prudência objectiva.
Hoje, que há falta de melhor pretexto para a auto-estima nacional, os comentaristas residentes e mercenários desdobram-se em elogios e em ais Jesus! nas antevisões oníricas e parvas sobre a selecção nacional.
Ora, parece-me que os antigos Magriços se transformaram, agora, nos novos Empatas...
Mas também quem nos obriga a pôr o destino da nossa alegria nos pés de 11 criaturas?

A par e passo 169


O pensamento é, em suma, o trabalho que faz viver em nós aquilo que não existe, que lhe empresta, queiramos ou não, as nossas forças actuais, que nos faz tomar a parte pelo todo, a imagem pela realidade, e que nos dá a ilusão de ver, de agir, de experimentar, de possuir independentemente do nosso velho e querido corpo, que nós deixámos, com o seu cigarro, na cadeira, esperando retomá-lo bruscamente, se o telefone tocar, ou por ordem, mais prosaica, do nosso estômago que reclama algum subsídio nutritivo...

Paul Valéry, in Variété V (pg. 169).

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Da antiga Porcalhota (Amadora)


É pelos antigos, quase sempre, que nós descobrimos coisas novas para enriquecer a nossa sabedoria. Da Amadora, que fora Porcalhota até 1907, sabia eu. E não era novidade que o nome sujava o brio dos seus moradores, para lhe quererem mudar o seu topónimo para coisa mais asseada...
Mas, porquê Porcalhota?
Pois fui encontrar a explicação em Aldeia, de Aquilino Ribeiro (1885-1963), de forma muito linear, lógica e compreensiva. Aqui ficam, por isso, as palavras do Mestre:
"... Em pecuária se cifrava a primeira riqueza da aldeia. Numa parte da serra, comunal desde a pedra de arranque ao mato galego, pastava o gado lanígero, na outra os suínos. Chamava-se dar porcos ao fintão, confiá-los a tanto por cabeça a um guardão que todas as manhãs vinha, tangia a sua corna de chifre, e abalava com as varas para o monte. No século XVIII ainda se usavam tais contratos nos arredores de Lisboa; daí Porcalhota, pastagem dos ditos. ..."

Abóboras (bis)


E vão três...
Para já são apenas flores. Esplendorosamente amarelas, ao Sol. Não imagino no que irão dar, só faço votos para que sejam maneirinhas, mas saudáveis se vierem a desabrochar em fruto...

Adagiário CCLIV


Aos seis meses assenta, aos sete adenta, ao ano andante e aos dois falante.

domingo, 19 de junho de 2016

Máxima minúscula ( e rústica)


Ao princípio era o Verbo; ao despois foi a imagem. Para sempre.

Apontamento 79 (bis): Abóboras


Vamos dar conta da evolução das nossas abóboras. Como se vê pela foto, a primeira flor cumpre o dito: "quem sai aos seus ..."

De facto, a mãezinha era uma senhora abóbora !

Post de HMJ, com os votos de um bom Domingo

Sobre Pintura, inovação, e um quadro de 1770, em particular


Parece ser consensual entre os académicos, segundo o TLS (nº 5904), que a primeira natureza morta com flores terá sido executada por volta de 1603, pelo pintor holandês Roelandt Savery (1576-1639). Muito embora, anteriormente, tivesse havido algumas tentativas incipientes e mal sucedidas, ou de segunda ordem, na qualidade. A data coincide com um despertar de interesse, nos Países Baixos, pelos jardins e pela horticultura e botânica.

Cerca de 170 anos depois, o artista Joshua Reynolds (1723-1792), talvez num acesso de admiração e entusiasmo perante o quadro "A morte do general Wolfe", do pintor anglo-americano Benjamin West (1738-1820), terá afirmado: "...prevejo que esta pintura não só se tornará consensualmente apreciada, mas será também um ponto de partida importante na evolução da arte." O facto do general Wolfe ser um herói da Guerra dos Sete Anos e também gozar de grande popularidade na Inglaterra, terá decerto pesado no entusiasmo de Reynolds, por esta obra de cariz neoclássico, do seu colega pintor.


A tela, hoje pertença da National Gallery of Canada (Otava), representa a agonia do militar britânico, na curta (durou cerca de 15 minutos) batalha de Quebeque, entre franceses e ingleses, em que o General foi atingido mortalmente por vários tiros de mosquete. O aspecto dramático e compassivo dos circunstantes, bem como a arquitectura triangular do projecto ( a bandeira funciona como ângulo superior de um triângulo), singularizam esta obra, na sua época. Mas há também nela uma sugestão de descida da cruz que lembra representações anteriores e maiores de Van Dick e Dürer, sendo que estas eram de natureza sagrada. E o quadro de West ser, na sua laicidade, uma bela imagem espiritual do século das luzes...

sábado, 18 de junho de 2016

Não ser patrioteiro


De manhã, em altos brados foi a música pimba, aeróbica no campo da Escola, alugado, como ATL no subúrbio  outrabandista. Eu estava a temer o pior, para depois do jantar, até porque queria ver, na RTP Memória, a Guerra Colonial, do Joaquim Furtado, com alguma tranquilidade física e de espírito.
Felizmente, um empate arrefece os ânimos, não motiva o sopro das vuvuzelas, os urros e grunhidos bestiais, as buzinadelas frenéticas pelas ruas, as discussões acaloradas pela noite dentro. Vi a Guerra, em perfeita tranquilidade.
E ainda há quem me acuse de patriotismo exagerado!...

Gostar de


Dos poetas românticos ingleses, as minhas preferências foram sempre para Blake e Keats, quase ex aequo. Aprecio alguns poemas de Coleridge, q. b.; Wordsworth vale-me apenas por um começo de poema (Five years have passed/ five summers with the length...). Mas nunca gostei da poesia de Byron.
Despertaram-se-me estas divagações, da leitura despreocupada de Prazeres, de Eduardo Barroso, livro que já aqui referi. O capítulo estimulante intitula-se O prazer da amizade. E vou citá-lo:
"Tenho portanto amigos de luxo, de primeira, e de segunda, para finalmente aparecerem os indiferentes e até os inimigos. (...) Tenho amigos meus, que por conhecerem milhares de pessoas, pensam sinceramente que têm milhares de amigos. Na amizade, como no amor, existem graus de intensidade que muitas vezes não têm só que ver com o tempo de duração desse afecto. ..."
Ora, são estas coisas simples, e claras também para mim, que se baralham de todo, em muita gente, nos nossos dias. O feicebuque, é um bom exemplo do uso abusivo da palavra amigo e da vacuidade dos like. Muitas vezes, por rasteirice mental de pensamento, por falta de discernimento de grau e ausência de sentido crítico (que sempre foi manifesta em Portugal), por ligeireza de afectos e de sensibilidade. Mas não há nada a fazer...

Bibi Ferreira


A durabilidade tem as suas vantagens. Se se trata de uma coisa, mesmo sendo-nos indiferente, ou uma ferramenta que dure muito, acabamos por nos afeiçoarmos a ela. Se for uma pessoa, a sua longa idade provoca-nos sempre alguma admiração. Escritor que seja, se ultrapassar os 80, mesmo que seja banal, alguma editora acaba por o ressuscitar e ele entra no circuito das celebridades, e cada novo livro é saudado como se de uma obra-prima se tratasse. Se for actor, ainda é melhor e mais garantido, ainda que tenha sido um canastrão toda a vida. A velhice cria-lhe uma aura de respeitabilidade e sucesso.
Não é o caso de Bibi Ferreira, actriz brasileira, que acabou de completar 94 anos no passado dia 1 de Junho, nascida que foi no já longínquo ano de 1922. E que é, em si mesma, uma lenda viva e merecida. Pelo seu passado rico de profissionalismo e capacidades humanas. Senão, bastaria ouvirmos este Monólogo das Mãos, que ela declamou, com arte, no programa de Jô Soares, para nos rendermos à sua excelência profissional. Ora ouçam:


com agradecimentos a C. S..

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Da leitura (13)


Acabado o livro, pouso-o sobre a mesa. Pouco depois, reabro-o nas páginas onde deixei ficar 4 pequenos pedaços de papel, a marcar frases, textos ou ideias de que me achei mais próximo ou que me estimularam num monólogo interior mais intenso. Quantas  mais são as pequenas marcas de papel, mais os encontros... Sinais, como se numa viagem tivéssemos marcado, no mapa, as localidades principais, a revisitar. Releio essas linhas e retiro os pequenos papéis. Sem colinas, o livro readquire o seu horizonte raso de integridade e vai repousar na prateleira, vertical, junto dos outros volumes do mesmo autor. Num resumido perfil de lombada, pouco visível.
Para sempre?

para MR, em troca de W. B..

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Assim vai o Mundo...


Directamente de L'Obs, e de Wiaz, a batalha campal gaulesa; no Público, as fotos da batalha fluvial do Tamisa, por causa do Brexit. E eu pergunto: Et moi, et moi et moi ?- como diria o Dutronc, mas a propósito dos amarelos, dos negros, dos soviéticos, dos judeus americanos, dos vietnamitas...
Numa altura, em suma, em que o politicamente correcto ainda não era uma religião sagrada.


quarta-feira, 15 de junho de 2016

Retro (85)


Foram as minhas últimas quatro aquisições de postais do início do século passado, escolhido o da imagem que encima o poste, para ilustração condigna. É possível - palpite de HMJ - que represente a tentadora e fatal Lorelei, no seu Reno, que ali estava e cantava para perdição dos marinheiros.
Mas o postal tem ainda a singularidade de, no verso, trazer um soneto da época, de um vate prendado, que dava pelo nome de Fernandes Costa. Dei-me ao trabalho de o transcrever, para poder ser lido em melhores condições. Julgo que, quer o postal quer o soneto, sejam das primeiras duas décadas do séc. XX. Serão, muito provavelmente, centenários.


Para chave de ouro, resolvi incluir também a célebre canção popular alemã que, se calhar, não era conhecida do prendado sonetista português. Numa límpida interpretação de Peter Schreier (1935).

Pinacoteca Pessoal 114 (pouco canónica)


Deixemos os "bifes", que também cansam, com o seu brexit. Passemos aos teutónicos, que estão de pedra e cal, nesta caranguejola da CE. Até porque lhes convém, sobretudo a Leste...
Não me recordo como cheguei ao nome de Thomas Schütte, pintor e sobretudo escultor, nascido em Oldenburg (Alemanha), em 1954, presentemente a trabalhar em Düsseldorf.
Desenhos seus e aguarelas ilustraram alguns livros, mas foi através da escultura que o seu nome se destacou no panorama artístico germânico. Alguma ironia atravessa as suas obras, alguma preocupação figurativa, bem como o interesse pela condição humana contemporânea. Deixo em imagem a obra Mulher de Bronze III, executada em 1998, e ainda os Inimigos Unidos I e II, no Central Park, em Nova Iorque.


terça-feira, 14 de junho de 2016

O TLS, as elites, o brexit e os hooligans


Eu até compreendo que os ingleses sejam desconfiados em relação ao Continente europeu. Os motivos da História não faltam: os romanos, os normandos, Napoleão, Hitler...
Mas não estava à espera que o circunspecto TLS se viesse a intrometer na refrega, pugnando pela manutenção da Grã-Bretanha no seio desta confusa e controversa comunidade europeia.
Provavelmente, os intelectuais e as elites estão mais preocupados do que os hooligans em relação ao próximo referendo e ao Brexit. O que dá para desconfiar imenso.


O nobre desporto


Desta vez, foi em Marselha. Mas há que lembrar Heysel (Bélgica), em 1985, Albufeira, em 2004...
Brexit? Porque não?...

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Citações CCLXXXIX


Num exemplo famoso, a centopeia chegaria a um impasse suicida se pensasse no próximo passo a dar.

George Steiner, in Dez Razões (Possíveis) para a Tristeza do Pensamento (pg. 41).

domingo, 12 de junho de 2016

Resgatados do olvido


Quase todos os livros têm um prazo de validade, raros são os de eterna leitura. E, destes, uma grande parte deles são apenas folheados por académicos abnegados ou leitores exóticos, em busca de singularidades.
Noutra sintonia, hoje, eu estava a pensar não deixar nada de novo no Arpose, depois do gentil poste de HMJ sobre as nossas pré-anunciadas abóboras, na varanda a Leste. As visitas ao Blogue têm sido poucas, os comentários, ainda menos; porque hei-de eu desaproveitar estes luminosos e amenos dias de Junho, para escrevinhar umas coisas que só os amigos fiéis ainda vão lendo?
Mas há coisas que têm o seu tempo para serem ditas ou escritas...
A tarde saldou-se por duas recordações muito antigas, que me vieram da memória, por associação.
A primeira, e mais rica, por sentimental, foi uma cadeira de lona preta, na praia da Póvoa de Varzim. Primeva e familiar, no seu peso inteiro de madeira maciça, ferragens de metal puro, lona grossa, inteiriça também.
Quanto à segunda. Na sexta-feira passada estivemos no Montijo e eu, num feira de usados que mais parecia de ciganos, comprei por 2 euros o livro que aparece em imagem. É um livro ligeiro, para ler na varanda ou na praia. Mas lembrei-me, ao lê-lo, dos meus tempos de estudante em que fiz exames e pensei que, hoje, finalmente já estou livre deles, para sempre. Foi uma grata constatação.


Apontamento 79: Abóboras [não] no Telhado, mas na varanda a leste



Embora tenha escolhido, ontem à noite, um livro de Aquilino Ribeiro para reler, não quero falar das Abóboras no Telhado. As nossas, como mostra a fotografia, estão a espalhar-se num recanto da varanda a leste.

Sem ter experiência anterior, parece que já há vários rebentos de flores. Se assim for, não sei como possa segurar, depois, as ditas abóboras, porque vieram de uma “mãezinha” bem grande. Aliás, o caso foi assim.

Antes do Natal, e para fazer os meus bolinhos de Jerimú, recebi uma enorme abóbora-menina. Abri-a e aproveitei quase tudo. No meio, descobri umas pevides com a casca aberta e rebentos já “verdinhos”. Ora, resolvi pôr pevides num vaso vazio, mas com terra, na varanda.

Surpresa das surpresas. Há umas três semanas, a nossa abóbora não pára de crescer e tomar conta de um espaço da varanda. Hoje foi o dia de colocar novos tutores para ver se ela se disciplina na sua ânsia de procurar novos caminhos.

E Bom Domingo !

Post de HMJ

sábado, 11 de junho de 2016

Comic Relief (126)


Julgo que uma das mais valias do sucesso do humor de Buster Keaton (1895-1966) residia na inexpressividade dos traços do seu rosto. Mesmo em momentos fílmicos de grande tensão e perigo, o actor mantinha uma impassibilidade quase total.
O vídeo, acima, documenta e explica alguns dos truques e técnicas das filmagens, ajudando a perceber melhor o rigor que era posto ao serviço dos resultados bem humorados ou cómicos que iam sendo alcançados. Não por acaso...
Ainda hoje se podem encontrar influências dos seus trabalhos, em recentes realizadores de cinema, como o vídeo exemplifica.

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Uma fotografia, de vez em quando (83)


Especializado em madeiras e diplomado nessa área, Stéphane Lavoué (1976) foi surprendido, numa deslocação profissional ao Brasil, pela obra de Sebastião Salgado, que foi marcante na sua vida. O mundo do trabalho, nos seus aspectos mais árduos e de piores condições, tem sido fixado pelo fotógrafo francês, de forma muito impressiva e constitui uma das suas temáticas mais constantes.
Uma estadia prolongada na Finisterra, recente, permitiu-lhe retratar os trabalhadores da indústria de  transformação do pescado, nas suas múltiplas actividades. Por entre o que poderia ser uma iconografia lírico-cristã (a trabalhadora de rosto angelical) até às figurações fantasmáticas de uma fantasiosa ficção científica, aqui ficam 3 retratos de trabalhadores, que ilustram bem a obra de Lavoué.
Todas as fotos pertencem a uma reportagem que o penúltimo L'Obs publicou sobre o fotógrafo.


Dia de Camões e das Comunidades


Já aqui no Arpose falei (8/5/2011) do bom humor do nosso grande Poeta. E como hoje é dia de celebrar Camões, aqui deixo duas estâncias do chamado episódio de Veloso, marinheiro que se aventurou a ir a terra, durante viagem de ida para India, mas ia sendo mal sucedido e morto, se não fugisse correndo, para longe de alguns indígenas africanos, ameaçadores e sanguinolentos. O episódio espelha bem o sentido de humor do autor de Os Lusíadas. Como se pode ler:

...
E sendo já Veloso em salvamento
Logo nos recolhemos para a armada
Vendo a malícia feia e rude intento
Da gente bestial, bruta e malvada:
De quem nenhum melhor conhecimento
Podemos ter da Índia desejada,
Que estarmos ainda muito longe dela
E assim tornei a dar ao vento a vela.

Disse então a Veloso um companheiro
(Começando-se todos a sorrir)
Ou lá Veloso amigo, aquele outeiro
É melhor de descer que de subir:
Se é, responde o ousado aventureiro
Mas quando eu para cá vi tantos vir,
Daqueles cães, depressa um pouco vim
Por me lembrar que estáveis cá sem mim.
...

Luís de Camões, Os Lusíadas (Canto V).

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Ascensão e queda


Dei-me conta, há dias, que das três empresas privadas onde trabalhei, durante a minha vida activa profissional, nenhuma delas sobrevivera, independente, tendo sido engolidas por outras, em qualquer dos casos, maiores.
Na última delas, onde laborei 28 anos, tive até oportunidade de presenciar a sua ascensão (1984) e o princípio do seu declínio que começou em 1995, até que foi comprada e absorvida por outra, em 2015, já eu lá não estava, felizmente.
E encontrei razões e similitudes nos três processos. Bem como causas maiores: inveja e gula. Que, como se sabe, na mitologia cristã, são pecados capitais. Ou do capitalismo?

A par e passo 168


Pensemos numa pequena criança: esta criança traz em si um conjunto de possibilidades. Ao fim de alguns meses de vida, ela aprendeu, quase simultaneamente, a falar e a andar. Adquiriu, assim, dois tipos de competências. Isto é, possui agora duas espécies de possibilidades, cujas circunstâncias acidentais de cada instante fornecerão resposta às suas necessidades e imaginações diversas.
Tendo aprendido a utilizar as pernas, essa criança virá a descobrir que não só pode andar, mas também correr; e não somente andar e correr, mas ainda dançar. E isto é um grande acontecimento. Ela inventou e descobriu, ao mesmo tempo, uma espécie de utilidade de segunda ordem, para os seus membros inferiores, uma generalização da sua fórmula de movimento. Com efeito, enquanto a marcha é, em suma, uma actividade monótona e pouco especializada, esta nova forma de acção, a Dança, permite uma infinidade de criações, de variações e até de figuração.

Paul Valéry, in Variéte V (pgs. 148/9).

Nota: a pintura de P. Valéry, que encima o poste, é um auto-retrato.

quarta-feira, 8 de junho de 2016

Mercearias Finas 113


Li há dias que o ano de 2011 terá sido generoso e bom para quase todas as regiões demarcadas portuguesas, no tocante aos vinhos produzidos. Ainda me lembro da década prodigiosa que foram os anos 60, do século XX. Porque os 70 foram de uma miséria franciscana... Mas, dantes, era fácil sabê-lo quer pelos prémios da Junta Nacional do Vinho, quer pelas Vintage declaradas, no Douro. Hoje, quase todos se fecham em copas e nós, os amadores, andamos às cegas.
Vou tirando, no entanto, as minhas conclusões e atrevo-me a afirmar que, para vinhos brancos, o ano de 2015 foi fracote. Dos três que já provei, achei-os muito inferiores ao habitual. Até o Colheita Especial 2015, branco, da Adega de Pegões, que costuma assegurar alguma qualidade, deixa muito a desejar. Está chocho.
Era um vinho branco que desde, pelo menos 2008, custava no sítio do costume, sempre 2,99 euros. Pois está em promoção, e a 2,49 euros, presentemente - um bodo aos pobres, aparentemente.
Esse grande patriota, que dá pelo apelido de Soares dos Santos e que já foi patrão do P. D. e do António Barreto, deve ter-se apercebido da pobreza da colheita e mandou rebaixá-la, talvez por interposta pessoa, nas gôndolas das suas superfícies. Para os pategos galegos escoarem esta colheita de 2015, e ele poder mandar os seus habituais proveitos para a Holanda... Deus o abençoe, na sua infinita misericórdia!

terça-feira, 7 de junho de 2016

Livros em leilão


Nos próximos dias 20, 21 e 22 de Junho, terá lugar mais um leilão de livros, no Palácio da Independência (às Portas de Sto. Antão, Lisboa), promovido por José Vicente (Livraria Olisipo).
O acervo pertence à biblioteca de Ramiro Teixeira (1938), crítico de literatura, e é também acrescido de outras proveniências, segundo indicação do catálogo.
Por diversas razões, gostaria de destacar alguns lotes e respectivas estimativas de venda. Como se segue:
399 - Definições// E Estatutos...Da Ordem de Christo...Lisboa, 1628..............175/ 300 euros.
579 - Guimarães, Delfim...Arquivo Literário (1922/29), 16 volumes..................... 75/ 150 euros.
598 - Helder, Herberto - O Amor em Visita (Lisboa, 1958), 1ª edição................250/ 500 euros.
1414 - Cortez, Jeronymo - O Non Plus Ultra... Lisboa, 1757.................................75/ 150 euros.

Ad usum delphini (4)


Paulo Portas, de acordo com as últimas notícias, vai ser conselheiro (comercial?) da Mota-Engil. Ou seja, vai fazer o seu branqueamento para a vida civil. Nada de mais natural: segue, no fundo, as pisadas de Jorge Coelho, depois da tragédia de Entre-os-Rios. E na mesma empresa de construção civil. Que não tem nada a ver com o Grupo Lena. Apenas se dedicam, ambas, à mesma temática industrial. Embora a primeira esteja cotada em Bolsa.
Eis um tema interessante para a CMTV desenvolver, com a sua habitual isenção, na justiceira linha do seu projecto editorial.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Na varanda a Leste


Há que procurar outra música, porque as que trago comigo parecem já cansadas de si mesmas, na sua perpétua multiplicação. E a luz ainda há-de crescer para iluminar os dias de Junho, por mais de duas semanas. Depois, será a vez da noite, que irá, pouco a pouco, ganhando mais espaço. Num ciclo natural limitado que, ciclicamente, se repete, sempre.
Poucas aves, defronte no meu ângulo de visão, mas sempre o costumeiro casal de rolas tímidas, rotineiras, que não voam nunca mais alto que os 30/40 metros de altura, num circuito de horizonte cerrado. Morreu a melhor roseira e o ano não tem sido bom para os limoeiros. A safra vai ser diminuta. Valha-nos a pequena oliveira, floridíssima.
Dizia, há pouco, Manguel, quando o li na página 314 (Uma História da Curiosidade, 2015): "...Além de nos ser impossível apreender a nossa própria morte, à medida que envelhecemos tornamo-nos mais conscientes da progressiva ausência dos outros. É-nos difícil dizer adeus. Cada despedida assombra-nos com a secreta suspeita de que poderá ser a última; tentamos continuar a acenar à porta durante o máximo de tempo possível. ..."
Um poema pode muito bem ser uma espécie de adivinha. Porque não responde, nem se clarifica por si, antes pergunta quase sempre, e restitui às palavras - quando de verdadeira poesia se trata - uma força antiga, inicial que, muitas vezes, já não conseguimos entender completamente.