quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Poupar nas palavras, ou o rei mago que se perdeu no caminho


O adjectivo salazarento tem, para mim, várias sugestões de associação subjectiva. Lembro-me de gafos (lazareto), dum senhor poupado (Salazar), de Nicolau Tolentino (cavalo lazarento) e recordo-me ainda da Bíblia (Lázaro).
Quando ontem, no Parlamento, um deputado (João Galamba) teve a ousadia legítima de dizer, ao nosso "contabilista melancólico" ou mago Gaspar, que o país já não tem "disponibilidade para discursos salazarentos", eu pensei que ele estava a dizer a verdade e a acertar na "mouche".
Ainda para mais, um senhor que, nas previsões e programa, errou quase todos os objectivos... Vamos que fosse um operário de uma fábrica a fazer tanta asneira, e já teria sido posto na rua. Com a facilidade que há, hoje, nos despedimentos.

Revivalismo Ligeiro LXXXI


Até seria interessante transpor, para o Portugal de hoje, pelo irrealismo dos nossos políticos, esta brejeira canção francesa de 1967. Dou uma dica: o papel da Marquesa poderia ser interpretado pelo nosso estimado P. R. ...

Celebrações fictícias e o dia da Poupança


Não mais nos libertaremos destas celebrações espúrias, vindas de fora, que enxameiam todos os dias do ano, lançadas, seguramente, para animar o comércio e a indústria.
Hoje, convencionou-se que seja o dia mundial da Poupança. Ideia posta a circular, provávelmente, pela Banca ou pela Suiça, desejosas de arrecadar mais uns dinheiritos, para os seus cofres.
Será, no entanto, uma ironia celebrar a data, em Portugal, quando o dinheiro, para tantas famílias, mal chega ao fim do mês, e a fome espreita, ou é já uma dramática realidade. Quando as vendas do Nestum e do Cérelac dispararam, nas farmácias, que ainda não fecharam...

Iconografia moderna e laica (19) : furacão Sandy


"...as águas elevaram-se sobre a Terra, e fizeram sobrenadar a Arca, ..."

Génesis, 7: 18.

Drummond


É para mim, com Cecília Meireles, um dos grandes poetas brasileiros do séc. XX. Mas também um prosador notável ("Contos de Aprendiz" e "Contos Plausíveis), bem como foi um cronista muito atento à realidade. Passam hoje 110 anos sobre o nascimento (31/10/1902) de Carlos Drummond de Andrade, e aproveito para lembrar um seu pequeno texto de "Contos Plausíveis", pleno de bom humor e intitulado A Incapacidade de ser Verdadeiro:
Paulo tinha fama de mentiroso. Um dia chegou em casa dizendo que vira no campo dois dragões-da-independência cuspindo fogo e lendo fotonovelas.
A mãe botou-o de castigo, mas na semana seguinte ele veio contando que caíra no pátio da escola um pedaço de lua, todo cheio de buraquinhos, feito queijo, e ele provou e tinha gosto de queijo. Desta vez Paulo não só ficou sem sobremesa como foi proibido de jogar futebol durante quinze dias.
Quando o menino voltou falando que todas as borboletas da Terra passaram pela chácara de Siá Elpídia e queriam formar um tapete voador para transportá-lo ao sétimo céu, a mãe decidiu levá-lo ao médico. Após o exame, o Dr. Epaminondas abanou a cabeça:
- Não há nada a fazer, Dona Coló. Este menino é mesmo um caso de poesia.

para MR que, como eu, também gosta muito de Drummond.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Um poeta açoriano pouco lembrado



Ar de Inverno

Aves do mar que em ronda lenta
giram no ar, à ventania,
gritam na tarde macilenta
a sua bárbara alegria.

Incha lá fora a vaga escura,
uiva o nordeste aflitamente.
Que mágoa anónima satura
este ar de Inverno, este ar doente.

Alma que vogas a gemer
na tarde anémica, de vento,
como se infiltra no meu ser
o teu esparso sofrimento!

Que viuvez desamparada
chora no ar, no vento frio,
por esta tarde macerada
em que a esperança se esvaiu...

Roberto de Mesquita (1875-1924), in ...almas cativas.

A par e passo 15


Há um "segredo" para fazer versos, como há para tocar violino. Aquele que não sabe o segredo faz versos, ou toca violino; pelo menos, assim o crê, mas engana-se e outros com ele; porque ele confunde aquilo que ele acredita estar a fazer com aquilo que faz na realidade - e é precisamente o facto de possuir um segredo, que evita fazer essa confusão.
...
Não há "verdade" sem paixão, sem erro. Quero eu dizer: a verdade não se obtém senão apaixonadamente.
...
Os nossos pensamentos mais importantes são aqueles que contradizem os nossos sentimentos.
...
É preciso ter cometido muitos crimes, mais ou menos interiores, e carregar consigo um pesado passado, e variado, cheio de acidentes morais e outros, para saber, para ousar e para conseguir enfim, um dia, praticar um acto bom, fazer um pouco de bem - sem errar.

Paul Valéry, in Tel Quel II (pgs. 64, 69, 70 e 74).

Nota: só para lembrar que passa, hoje, mais um aniversário do nascimento de Paul Valéry, em 1871.

Laura Knight (1877-1970)


É o penúltimo TLS que anuncia uma grande retrospectiva da obra da pintora inglesa, Laura Knight, nascida em Nottingham, e que faleceu a poucos dias de completar 83 anos. O título da mostra é In open air, porque a artista gostava sobretudo de pintar exteriores e cenas da beira-mar, principalmente, da Cornualha. Muito embora a sua obra paisagística raramente excluísse as figuras humanas. Na fase final da sua vida, interessou-se muito pelos ciganos, que figuram em várias das suas telas, tendo por cenário a zona de Malvern. De uma forma geral, a sua obra é, consensualmente, considerada impressionista, mas eu creio que alguns dos seus quadros têm muito de realista.

Nota: a primeira das telas intitula-se "Lamorna Birch and his daughters", e a segunda "Logan's Rock", na Cornualha.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Alma Feminina


Cada tempo tem as suas modas, os seus exemplos e os seus ídolos. Cada época escolhe os seus ícones e consagra, nas suas aras votivas, os seus corpos e nomes. Escolhe aqueles ou aquelas que hão-de pernoitar num fugaz, sempre, panteão da memória.
A nossa época, e num meio mais ou menos lido e feminino, escolheu para culto dois nomes indeléveis: Frida Kahlo e Clarice Lispector. Numa declaração de interesses, devo dizer que são duas celebridades que não me entusiasmam. Mas - serei polémico - ao dizê-lo: interessam imenso às Mulheres do meu tempo.
Observando vários blogues femininos, verifico que a pintora mexicana e a escritora ucraniano-brasileira são um must, quase sempre referido e reverenciado. Claro que há nomes de segunda linha: Virginia Woolf, Anaïs Nin, Irene Lisboa, Josephine Baker..., mas ficam muito longe do acrisolado culto feminino de que as duas primeiras gozam.
Se eu conseguisse perceber e explicar esta devoção, teria compreendido a alma feminina. O que, modestamente confesso, não é o caso.

Ponto de situação


A pouco menos de duas semanas da data em que o Arpose perfaz 3 anos de actividade, resolvi dar conta aos meus Amigos, estimados Seguidores, e até aos anónimos frequentadores do Blogue, do tráfego das nacionalidades visitantes. Até às 17h30 de hoje, o cômputo total de visualizações de páginas é o seguinte, por países:
Portugal - 172.367 visualizações.
Brasil - 89.752             "
Estados Unidos - 13.161 "
Alemanha - 7.296            "
Rússia - 6.009                 "
França - 2.666                 "
Espanha - 2.052               "
Reino Unido - 1.214         "
Holanda - 1.007                "
Itália - 749 visualizações.
Apenas achei estranha a baixa posição da nossa vizinha Espanha, muito inferior a países de onde não seria de esperar tantas visitas. Como, por exemplo, a Rússia ou a França.

Regionalismos minhotos (24)


Na sequência da letra P, segue-se a escolha que fiz de alguns regionalismos minhotos:

1. Patela - pedra larga e curta.
2. Pavião - cavalo velho.
3. Pêco - não ser pêco: valente, forte, sadio; estar pêco: enregelado, com frio. (Conheço com o significado de desajeitado)
4. Pelingrano - véu palatino. Monco de peru. Pingente.
5. Pelote - estar em pelote: estar nu.
6. Pentear - diz-se que o vinho penteia, quando lançado numa malga, faz estrias ao longo das paredes.
7. Pentelhoca - mulher mal arranjada.

domingo, 28 de outubro de 2012

Da janela do aposento 18: Sobre a ignorância



[Frei António de Beja, Contra os juyzos dos astrologos, Lisboa, Germão Galharde, 1523, fl. 1, recto e verso]

Em Julho do ano passado já falei aqui do livro em epígrafe, citando uma máxima do "Beate pater hieronime".  No entanto, voltei a pegar no livro de Frei António de Beja, impresso em Lisboa, por Germão Galharde no ano de 1523, e oferecido "aa christianissima senhora raynha dona Lianor". 
Transcrevo, do início do livro, o que o presente "breve tratado" pretende contrariar, a saber, "a opinião de alguns ousados astrologos (...)" que "ousam em público juizo dizer que a quatro ou cinco dias de Fevereiro do ano de 1524, por ajuntamento de alguns planetas em signo de piscis (= Peixes), haverá grande dilúvio na terra". 
Dito isto, e explicando resumidamente o título do livro, fixei o olhar numa afirmação de Frei António de Beja sobre a ignorância e que reza assim: "De muitos males (excelentíssima senhora) que traz consigo a ignorância e pouco saber, é este um grande que faz de ligeiro crer o que nos dizem". Embora confundindo, propositadamente, os contextos e os visados no "Breve Tratado", continuo a achar grande actualidade à definição da ignorância.

P:S: Apenas durante a elaboração do "post" me apercebi da coincidência com outra actualidade, i.e., remetendo para um dilúvio, previsto para o ano de 1524, quando o furacão "Sandy" ameaça as terras do Senhor Presidente Obama.

Post de HMJ

Livrinhos 12 : Platão



Já aqui falei, nesta rubrica, da  Bibliothèque Miniature, da Payot, em 10/5/12 e 9/9/12, a propósito de voluminhos dedicados, respectivamente, a Proudhon e Maurice de Guérain. Este é dedicado a Platão (427-347), com uma antologia escolhida e traduzida por M. Solovine.
Escusado será encarecer o cuidado gráfico posto na edição e a bonita encadernação em tecido florido, que dá gosto ver. E o tamanho miniatural do livrinho que poderemos meter no bolso e levar para onde formos, para ler.

Pinacoteca Pessoal 38 : os Clouet



Foram pintores e retratistas exímios dos reis de França. Nascido na Flandres, Jean (Janet) Clouet (1485?-1541) e o seu filho, François Clouet (1516-1572), retrataram as famílias régias de Luís XII e Francisco I, em desenhos e aguarelas de grande realismo e finura, que lhes grangearam fama. O retrato era um tema dilecto da Renascença. Grande parte das obras dos Clouet integram o acervo do Museu Condé, de Chantilly, provenientes, maioritariamente, da colecção de Catarina de Medicis. A sobriedade refinada destes retratos régios conquistou, também, o gosto estético de Anatole France, que os coleccionou com fervor. No Museu Soares dos Reis, do Porto, conservam-se dois retratos, atribuídos aos Clouet.
Em imagem, a rainha Margarida de Vallois, em criança, obra executada por François Clouet, em 1560; e o desenho do futuro Carlos IX, feito por volta de 1552, também atribuído à escola dos Clouet.

sábado, 27 de outubro de 2012

Perplexidades na mudança de hora


Há um pequeníssimo poema de Fernando Pessoa (de momento, não o consigo localizar) que diz, mais ou menos, o seguinte:

Cortei a laranja a meio:
para qual das metades fui injusto?

Nesta mudança de hora, quem ganha ou perde? Nós, ou o dia?
Se a noite, amanhã, já virá mais cedo.


Os trabalhos no Inverno, para JAD




Se cá nevasse, oferecia uma maquineta destas ao JAD a fim de lhe facilitar o trabalho matinal de limpar os passeios frente à sua casa. Suponho que gorro e luvas já se encontram no seu guarda-fato.

Post de HMJ

Justiça divina

Na Alemanha já neva. A sra. Merkel já deve ter substituído os soquetes por meias compridas, de lã. A temperatura mínima aponta para os 2º negativos.
Em Portugal, o sol brilha, embora intermitente. A relva resplandece num verde claro, macio e afectuoso. Dentro de casa, o termómetro marca 24º. Sem aquecimento, nem ar condicionado.

Comic Relief (55) : passagem de testemunho, ou...


...também se poderia legendar a imagem, à brasileira, como: abraço de urso, no equivalente francês de "assassinato por entusiasmo". Mas também, e à portuguesa: a bela e o monstro. Ou, muito simplesmente: o corte das gorduras. Ou, cura de emagrecimento. A partir de agora, a Cultura terá um representante mais pequenino. Também para o que recebe do Orçamento, deve chegar...

Nos 120 anos do nascimento de Graciliano Ramos


Da introdução de Antônio Cândido a Caetés (7º edição, 1965), um pequeno excerto:

Para ler Graciliano Ramos, tavez convenha ao leitor aparelhar-se do espiríto de jornada, dispondo-se a uma experiência que se desdobra em etapas e, principiada na narração de costumes, termina pela confissão das mais vividas emoções pessoais. Com isto, percorre o sertão, a mata, a fazenda, a vila, a cidade, a casa, a prisão, vendo fazendeiros e vaqueiros, empregados e funcionários, políticos e vagabundos, pelos quais passa o romancista, progredindo no sentido de integrar o que observa ao seu modo peculiar de julgar e de sentir De tal forma que, embora pouco afeito ao pitoresco e ao descritivo, e antes de mais nada preocupado em ser, por intermédio da sua obra, como artista e como homem, termina por nos conduzir discretamente a esferas bastante várias de humanidade, sem se afastar demasiado de certos temas e modos de escrever. ..."

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Mercearias Finas 62 : Açorda em verso


Açordas, já as soube fazer aprimoradas. De bacalhau, com gambas, ou para acompanhar uns "jaquinzinhos" fritos, sabiam a  matar. Mas, com a falta de prática dos últimos anos, provavelmente não as faria tão bem como outrora. Também sei que o know how veio dos árabes, que por aqui passaram e deixaram saberes e sabores de bom gosto e memória.
Quanto a José Inácio de Araújo (1827-1907), até há pouco tempo, eu não sabia nada. E, das consultas a que procedi, pouco consegui apurar. Teria sido um ourives lisboeta, que sabia cozinhar viandas e versos, estes últimos de veia satírica. E que os distribuía, por alguns amigos que mais estimava. Foi assim que alguns versos lhe sobreviveram. Como estes:

Açorda à Portuguesa

Pão de trigo, sem sombra de ter joio:
Azeite do melhor, de Santarém;
Alho do mais pequeno e do saloio.
Ponha em lume brando e mexa bem.

Sal que não seja inglês - porque é remédio
Toda a criança assim alimentada
É capaz de deitar abaixo um prédio,
Quatro meses depois de desmamada.

Com este bom pitéu sem refogados,
Invenção puramente lusitana,
Os ilustres varões assinalados
Passaram inda além da Taprobana.

Fortes p'la açorda, demos nós aos mouros
Como se sabe, uma fatal derrota;
E abiscoitamos majestosos louros
Para os nobres troféus de Aljubarrota.

A música do arco-íris


Não faço a menor ideia daquilo que seja um "Perfect Rainbow", que Brian Crain escolheu para título desta pequena e bonita obra musical.
Já há muito que não via um arco-íris, mas hoje vi logo dois, pela manhã. Um quase vertical, sobre Lisboa. Cerca de uma hora mais tarde vimos outro, magnífico, já na zona outrabandista. Era uma calota perfeita, de cerca de 180º - há muito que não via uma beleza de cores, assim...

Letras nas Greguerías de Gómez de la Serna


1. O L parece querer dar um pontapé na letra que lhe fica a seguir.
2. O W é o M a fazer o pino.

Ramón Gómez de la Serna, in Greguerías (1963).

Carta manuscrita de Carlos Malheiro Dias


Por amável deferência amiga de H. N., o Arpose tem oportunidade de publicar uma carta manuscrita do romancista português Carlos Malheiro Dias (1875-1941). Muito embora o teor da missiva não seja literário, mas meramente pessoal e da esfera privada, é uma curiosidade interessante que se saúda - e agradece ao possuidor.
Escrita da Granja, onde provavelmente o escritor passava as suas férias de Verão, data também do período em que Malheiro Dias foi chefe de gabinete do Ministro das Obras Públicas - daí o papel timbrado. A carta, remetida a Guilherme Correia Leite, limita-se a rechaçar, liminarmente, o facto - baseado num equívoco insólito - da existência de uma dívida antiga do escritor, para com um tio de Guilherme Leite.  
                    

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

De Eluard para Braque


Georges Braque

Um pássaro ganha altura,
Rejeita a nudez como um véu inútil,
Porque nunca teve medo da luz,
Fechado no seu voo,
Nunca sentiu a sombra.

Cascas de colheitas crestadas pelo sol.
Todas as folhas nos bosques dizem que sim,
Elas não sabem senão dizer que sim,
Todas as perguntas, todas as respostas
E o orvalho brota deste íntimo sim.

Um homem de olhos ligeiros descreve o céu do amor.
Ele reúne as maravilhas
Como folhas de um bosque,
Como os pássaros nas suas asas
E os homens quando adormecem.

Paul Eluard, in Nouveaux Poèmes (1926).

Citações CXII : Carl P. E. Bach


Um músico só pode emocionar se ele próprio estiver emocionado.

Carl Philipp Emanuel Bach (1714-1788)

Fellini, em sequência do poste "Músicos e Maestros"


Com agradecimentos a H. N., pela oportuna sugestão.

Músicos e Maestros


Há dias, tive oportunidade de ler um artigo muito interessante, em que era abordado o papel dos maestros, em relação às orquestras que dirigiam. Um leigo terá a tentação de perguntar se a existência de um maestro se justificará, sempre e inteiramente. Parece-me, na minha enorme ignorância musical, que numa pequena orquestra de câmara, ou num quarteto, talvez nem sempre ele seja necessário, mas a chefia ou direcção pode assumir várias formas. Lembro-me, por exemplo,  da subtil direcção de Jordí Savall, quando toca em família. Dos seus pequenos acenos, das expressões faciais, dos olhares dirigidos, quase miméticos. Que está muito distante daquilo que dizem ter sido as direcções tirânicas de Toscanini ou Furtwangler como Maestros. Entre a pose hierática de Karajan e a fogosidade juvenil de Joana Carneiro há uma diferença de tomo. E de método, obviamente.
Mas a coisa que mais me surpreendeu, nesse artigo que li, foi classificar a ligação entre maestros e músicos, muitas vezes, como uma relação de amor-ódio. Porque, também, muitos dos músicos se perguntam se seria mesmo necessária a existência de maestros. E para que servem. É evidente que não comungo destes pensamentos extremos. Há uns anos, tive ocasião de ver um vídeo muito curioso do ensaio do Concerto nº 5, para piano, de Beethoven, entre Simon Rattle e Alfred Brendel. E essa troca de saberes, entre os dois, demonstrava, à saciedade, a justificação plena da necessidade de existência de um Maestro. Desde que haja a inteligência e humildade de ambos os executantes, para se entenderem, acederem entre si na melhor forma de harmonia, em relação à grande Música.

Flaubertiana : letra E


Do Dicionário de Ideias Feitas, de Gustave Flaubert, segue-se, hoje, uma pequena escolha de palavras e ideias começadas por E. Assim:

Eclectismo - bradar contra, por ser uma filosofia imoral.
Economia - sempre precedida por «ordem». Citar a história de Laffitte a apanhar um alfinete no pátio do banqueiro Perrégaux.
Economia política - ciência sem entranhas.
Empresário - palavra usada no meio artístico para designar o produtor. Sempre precedida de hábil.
Espirro - depois de lhe dizerem «Salve-o Deus», começar uma discussão sobre a origem desse costume.
Excepção - dizer que confirmam a regra. Não correr o risco de explicar porquê.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Bach / Fischer-Dieskau


Nota pessoal: esta cantata de Bach, vem em sequência, e por intenção pessoal, em seguida ao poste anterior. Intitula-se "Ich habe genug". Um alemão interpretará o título como: o que tenho, é suficiente. Um português, que saiba um pouco de alemão, traduzirá, sem grandes pruridos filosóficos, e exasperado, hoje, por: Basta!

De um diário imaginário


Chove e relampeja. O comissário da Cultura parece que pediu escusa, por motivos de saúde, para sair do Governo. Mas já deve ter motivos suficientes, com a experiência que teve, para escrever alguns romances policiais cujo homicídio central tenha sido provocado por asfixia. E parece-me ser uma atitude avisada, profilática, agora que este governo atingiu os píncaros de popularidade... Não quero falar de ratos, nem de navios.
Continua a chover neste Outono do nosso descontentamento. E percebo, num momento de clarividência súbita, como e porque a maior parte dos filósofos europeus nasceram a Norte. Como eles são escassos em Portugal, na Espanha, na Itália... A Grécia é a excepção, mas na Antiguidade. Quando a Cultura floresce, todo um povo mostra o seu melhor, nas artes, nos ofícios e nas ciências.
Esta incomodidade, que hoje sentimos, mas que vem de longe, deve ter-se transformado, ao longo dos  séculos, na bem conhecida melancolia à portuguesa. Ou para mais uma vez citar Camões, nesta "apagada e vil tristeza". A que nos tem condenado o termos sidos governados, tantas vezes, por videirinhos, oportunistas, miguéis de vasconcelos, carreiristas...eu sei lá!
Sobram-nos poetas, e continua a chover.

Significado amplo e significado restrito


A poesia tem destas coisas. E as palavras contribuem, na sua quase infinita elasticidade.
Em 1958, Jorge de Sena publicou, na Morais Editora, o seu quinto livro de poesia, intitulado "Fidelidade". Hoje, quando refiro fidelidade no sentido seniano, quero dizer que a aplico no sentido mais amplo.
Ao reverter a água de um copo, para a jarra ou garrafa que foi o seu depositário inicial, é preciso mão firme e ritmo constante, no movimento de retorno. Uma pequena hesitação ou uma ligeira mudança de ritmo, e ela entorna-se. Porque toda a acção, para ter sucesso, exige uma tensão constante e persistente. Uma fidelidade, em suma.

Emily Dickinson, ainda


Não há fragata alguma como um livro
Para nos levar terras além,
Nem corcel nenhum como uma página
De poesia caprichosa e galopante.
Até o mais pobre pode seguir este percurso
Sem o pesado preço da portagem;
Que frugal parece a carruagem
Que sustenta a alma humana!

Obsv.: de novo me penitencio por não respeitar as maiúsculas tão características na poesia de Emily Dickinson. Mais uma vez o poema original foi retirado de publicação avulsa - que as não observou...

terça-feira, 23 de outubro de 2012

A par e passo 14


Um poeta é o mais utilitário dos seres. Preguiça, desespero, acidentes de linguagem, olhares singulares - tudo o que se perde, rejeita, ignora, elimina, esquece o homem mais prático, o poeta colhe-o, e pela sua arte dá-lhe algum valor.
...
Aquilo que tu fazes melhor, isso é uma armadilha inevitável.
...
A juventude não ama os objectos perfeitos. Eles deixam-lhe muito pouco para fazer e irritam ou aborrecem.
...
O poema - esta hesitação prolongada entre o som e o sentido.

Paul Valéry, in Tel Quel II (pgs. 49, 54, 63).

Ignorância, crendice e inocência virtual


Ora atente-se nesta "rima pelos consoantes" que, no ciberespaço é muito mais banal do que parece. O devoto e incauto cibernauta indicou, numa fé extrema que desafia a razão, o seguinte como search words:
"augusto talhos meireles" (esperando o milagre).
E veio, mas à moda do Google, que lhe sugeriu o poste "Alguns arabismos", colocado no Blogue a 3/5/12.
Viva a América! Na sua inocência.

Interlúdio 20


É um cão outrabandista que se põe à janela, quando não chove. Um vizinho insólito, muito senhor de si e do seu horizonte, provavelmente curioso. Não fora como aquelas criancinhas mal-educadas que, às vezes, guincham nos transportes públicos, até gostaríamos mais dele. Mas, porque não foi ensinado, também, com frequência, se põe a ladrar desaustinadamente, quer seja de noite, ou de dia. É pena, porque quando está silencioso, parece mesmo um senhor.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Franz Liszt / Artur Pizarro


Para lembrar a passagem de mais um aniversário do nascimento de Franz Liszt (1811-1876), um retrato menos conhecido do grande compositor, aos 12 anos. E a Rapsódia Húngara nº 18.





Sobre globos terrestres, mapas e geografia


Em pequeno, tive um  globo terrestre de diminutas dimensões, feito em folha de Flandres, suspenso de uma armação de acrílico. Fazia os meus encantos, porque podia rodar-se e até abri-lo em dois: hemisfério Norte e hemisfério Sul. E, embora sempre tivesse gostado de mapas geográficos, o pequeno globo terrestre era muito mais interessante, até porque tinha movimento.
Ao que parece, a primeira representação pictórica de globos terrestres surge em 1533, no quadro "Os Embaixadores", do pintor alemão Hans Holbein (1497-1543), o Novo. E o primeiro Globo teria sido construído em Nuremberga, pouco antes da descoberta da América, por Colombo. Muito embora se diga que os Gregos teriam feito um, na Antiguidade.
Hoje, e pelo TLS, soube que a palavra Cartografia é de origem relativamente recente. A fazer fé na informação, terá sido usada (criada) pela primeira vez, em 1839, pelos portugueses. Vinte anos depois, em 1859, terá sido introduzida no léxico inglês. A ser verdade, teremos sido os pioneiros.

Osmose (37)


É preciso evitar o derrame, a bonomia da efusão. Quando os anos são longos e as defesas desarmam, as palavras soltam-se libertas de constrangimentos, às vezes, excessivas sobre os outros. É aconselhável o cuidado e, se possível, um restrito uso da razão.
O homem saíu feliz do almoço de anos, que tinha congraçado à sua volta três gerações, quase unânimes. E que pareciam também pacificadas, satisfeitas entre si. Mas quando saíu, ao descer as escadas altas, tropeçou e ia caindo no terceiro degrau.

Pequena história (16) : ficção e realidade


Se daqui a 100 anos, alguém se debruçar e ler obras de ficção portuguesa dos anos 40, 50, 60 do séc. XX ( e poucas terão sobrevido, certamente, pela usura do tempo), aperceber-se-á, de imediato, das convulsões sociais da época, da pobreza e desesperança, em que tanta gente vivia. Os artistas, em geral, fossem eles pintores, cineastas, escritores, eram interventivos, e sentiam-se responsáveis por denunciar a injustiça das situações. Hoje, contar-se-ão pelos dedos de uma mão, os escritores que tomam esse aspecto como uma responsabilidade cívica, nas suas obras.
Mas esse entendimento humano já vinha de longe e também existia nos outros países. Basta ler Dickens, crítico da situação, na Inglaterra. Ou Steinbeck, com "As Vinhas da Ira". E tantos outros. A este propósito, será curioso lembrar o episódio em que Abraham Lincoln (1809-1865) encontrou e conheceu Harriet Beecher Stowe (1811-1896), celebrada autora de "A Cabana de Pai Tomás". Após a apresentação da escritora, o presidente americano disse: "Então esta é que é a pequena senhora que provocou a grande guerra?" -  referindo-se à abolição da escravatura e à Guerra Civil americana.

À guisa de consolação...


...e por causa da chuva.

Obsv.: o feliz avozinho que recebeu este postal (de Boas-festas) vivia em Serpa, e tinha um nome bem interessante: Antonio Satyro Costa. Honny soit qui mal y pense...

Pinacoteca Pessoal 37 : Domenico Zampieri

Devo confessar que só muito recentemente dei por este pintor barroco italiano de nome Domenico Zampieri, nascido em Bolonha, a 21 de Outubro de 1581, no seio de família modesta.
Mas os animais fabulosos têm sempre um certo fascínio. Sobretudo, para mim, o unicórnio que me lembra o nerval, numa feição terrestre mais amorável e simpática. E a associação que Zampieri estabeleceu nesta obra (Virgem e unicórnio) parece-me bem curiosa. A pintura do fresco terá sido executada entre 1603 e 1605, para a família Farnese.
O Pintor veio a morrer em Nápoles, no ano de 1641.

Outono dominical


Três incomodidades na manhã: a chuva, as intermináveis roupas, por causa do frio. E o jornal que não veio. Compro outro, maquinal, para não vir de mãos a abanar. De regresso ao interior folheio, em piloto automático, páginas onde não sei, por falta de hábito, procurar os assuntos. Um crónica de um jovem escritor barbudo, dito de referência, no final do suplemento-revista sobre Moda, deixa-me perplexo: um amontoado de lugares-comuns, a pretender ter graça (?). Ou surrealista pobre e desinspirado: "... A orelha é uma varanda para ouvir. ..."
Fico de olhos vidrados a olhar as janelas gotejantes e o lá fora cinzento, silencioso.

sábado, 20 de outubro de 2012

Recomendado : trinta e um - Kieslowski/ Red

É, para usar palavras de Bénard da Costa, um dos filmes da minha vida. Refiro-me a "Red (Vermelho)", final da magnífica trilogia "Cores", de Krzysztof Kieslowski (1941-1996). Com belíssima banda sonora de Zbignew Preisner (1955) e um desempenho notável de Jean-Louis Trintignant. Que, no seu papel, me faz lembrar (sem que eu saiba explicar porquê) o "Juiz penitente" do romance "A Queda" de Albert Camus.
O filme pode ver-se hoje(-amanhã), pouco depois da meia noite, às 00h30, na RTP 2. Boa sessão a quem vier a ver (ou rever)! E que gostem, como eu gosto.

Discutível, mas estimulante para reflexão


Jornalista e escritor respeitado, fundador do jornal "La Repubblica", em 1976, o italiano Eugenio Scalfari (1924) deu, recentemente, uma entrevista muito interessante a "Le Nouvel Observateur", por ocasião da saída, em França, da sua obra traduzida "Par la haute mer ouverte. Notes de lecture d'un Moderne". Passo a traduzir um pequeno excerto da entrevista, que me pareceu pertinente, embora discutível:
"...Hoje, os jovens abandonaram a leitura, mesmo a dos jornais. Eles comunicam através do som e das imagens. Todos os dias vemos adolescentes que andam com os seus auscultadores nas orelhas. Chamo-lhes, no final do meu livro, «os novos bárbaros». Não no sentido pejorativo, mas no sentido de que eles falam uma outra linguagem. Eles já não são como todas as novas gerações que contestavam os valores dos pais e dos avós, mas que conheciam esses valores. E que, por fim, acabavam por aceitar uma parte desses mesmos valores, e assim a evolução prosseguia. Não, os «bárbaros» actuais recusam-nos, mas sem os conhecer. Eles falam outra linguagem e começam do zero. Por isso não sabemos o que vai ser a civilização futura. É um enigma. ..."

Filatelia LIII : Hungria



Embora de modo que parece estranho, a Hungria está-me associada, na memória, a duas localidades: Witterschlick, pequena aldeia próxima de Bona (Alemanha), e à Póvoa de Varzim. Na primeira, estabeleci contacto, pela primeira vez, com húngaros (3 rapazes e 1 rapariga); na Póvoa, foi-me oferecida, por um senhor de apelido Graça,, uma pequena, mas interessante colecção de selos usados da Hungria. Que fui continuando, até determinada altura, através de correspondentes magiares que me mandavam selos do seu país, em troca de selos portugueses que eu lhes remetia.
Na minha opinião, há um estilo próprio no desenho, cores e qualidade estética que permite reconhecer - para quem esteja familiarizado - os selos da Inglaterra, da França, da Alemanha, dos E. U. A.,da Suiça, pela qualidade e personalidade do seu grafismo. E da Hungria também. Dos ex-países comunistas do Leste europeu, U. R. S. S. incluída, os selos magiares eram, de longe, os mais bonitos e, esteticamente, mais bem conseguidos. Em imagem, 2 séries húngaras dos anos 50, em abono do que acabo de afirmar.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Quand il est mort le poète


Não é um Requiem, mas apenas uma nota para referir a morte do cronista e poeta Manuel António Pina (1943-2012), hoje. Assim, este Quand il est mort le poète, de Gilbert Bécaud.
Mas não posso deixar de referir que o mundo virtual do ciberespaço, às vezes, me parece um campo largo de necrofagia. Eu explico: embora a obra poética de Manuel António Pina não fosse das minhas preferidas, quando ele recebeu o Prémio Camões, em 2011, dediquei-lhe um poste ("Se não fossem os gostos, que seria do amarelo?", em 14/5/2011). Este poste esteve adormecido e raramente alguém o visitava. Pois, hoje, desde o início da tarde, 1 em cada 3 visitas (73 visitantes até agora, para ser exacto) veio ler esse poste, num voyeurisme frenético. Provavelmente, durante uma ou duas semanas vender-se-ão muitos livros do Poeta. Dentro de um mês, o mais certo, é que já quase ninguém fale dele. Os necrófagos terão ido para outro lado, em busca de outras novas emoções. Sic transit gloria mundi...

Flaubertiana : letra D


Da obra já referida de Gustave Flaubert, de cuja versão portuguesa segue a imagem, é altura de reproduzir a selecção que fiz de palavras (ou ideias feitas) começadas por D. Em sequência:

Deboche - causa de todas as doenças dos homens solteiros.
Deserto - dá tâmaras.
Diletante - homem rico com assinatura na Ópera.
Doente - para fazer subir o moral de um doente rir do seu mal e negar os seus sofrimentos.
Domicílio - sempre inviolável. No entanto, a Justiça, a Polícia entram nele quando muito bem querem.
Dormir - dormir demais torna o sangue espesso.
Dúvida - pior do que negação.

Idiotismos 6

Aprendi a dizer a palavra, mas só muito mais tarde lhe soube o significado. Até porque, em jogos infantis, basta a magia dos sons para brincar. Federico Fellini, em imagens memoráveis (Otto e mezzo), põe um conjunto de crianças, antes de adormecer, a repetir uma lenga-lenga: "Asa, nisi, masa!" - que não tem um significado concreto. Mas a palavra "babona" usei-a muitas vezes, em jogos de praia, até vir a saber que era o feminino de babão, que queria dizer: que se baba, palerma, idiota.
Nesse jogo de Verão, havia alguém sentado(a) na areia da praia e, em volta, um grupo de crianças fazendo rodar um cordel, em círculo, onde estava inserido um anel ou aliança, ou mesmo uma anilha que passava escondidamente de uma para outra. As crianças entoavam, interminavelmente:

Babona que estás no meio, 
ó babona!
Estás feita uma toleirona,
ó babona!
....
Se o babão acertava na mão que escondia o anel, vinha para a roda, e o que fora descoberto passava para o centro da roda, e ficava na berlinda. A expressão estar na berlinda ainda hoje significa estar no centro das atenções. Mas, inicialmente, berlinda era uma carruagem elegante inventada e construída, no séc. XVIII, pelo arquitecto Filipe Chiese, na cidade de Berlim. O facto de ser um transporte que despertava a atenção pela beleza, viria a servir para nomear um jogo em que, havendo uma roda, havia também alguém no centro dela que devia ser vigiado, atentamente.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Bonecas de Papel



Em geminação com o PROSIMETRON, e pela mão de MR, lembrei-me das bonecas de papel como a Heidi apresentada em cima. 
Eram folhas de cartolina que exigiam uma perícia especial ao recortar os recantos todos sem estragar as "roupinhas" ou o "corpo" da boneca.

Post de HMJ, dedicado a MR

Gerações


Não posso inteiramente queixar-me. Havia pouca liberdade, é certo, quando eu era jovem; havia a perspectiva da guerra colonial e da morte, também. Mas havia algum bem-estar, mínimo. E, depois do 25 de Abril, abriu-se o futuro e a liberdade. Recentemente, no entanto, tudo começou a andar para trás, e grande parte dos jovens, entre os 20 e os 30 anos, já não terão grandes expectativas de felicidade, em Portugal.
Há dias, numa esplanada coberta, das Avenidas Novas, numa mesa contígua à minha, e muito próxima, vieram sentar-se dois jovens angolanos, ia eu a meio do meu Coelho à Caçador, acompanhado por um modesto tinto alentejano. Um dos angolanos que, pelo ovalado do corpo, poderia ser sobrinho do falecido Savimbi, pediu Bifinhos de Cebolada. O outro, que poderia ser primo da Isabelinha dos Santos, nóvel empreendedora de sucesso, optou por Moelas com batata frita e arroz. Ambos beberam sumos adocicados de lata.
Os jovens africanos falaram, maioritariamente, de miúdas e de pequenos negócios. Pareciam felizes e eu lembrei-me de Eduardo Mondlane e Amílcar Cabral, que morreram assassinados. Recordei-me de Samora Machel... Como as coisas mudaram! O clã dos Santos, de Angola, é dono de um império. Já não andam pela guerra, nem precisam de contar os Quanzas, para comprar posições maioritárias em empresas portuguesas de referência. Só vestem roupas de marca e os seus antigos camuflados só servirão para alacres mascaradas de Carnaval.
É a vingança do chinês..., o colonialismo (económico) ao contrário, a evolução das gerações. Hoje, é notícia que um grupo angolano terá comprado uma participação importante da empresa do "Diário de Notícias". Mira Amaral, flectido ligeiramente, deve com frequência encher de perdigotos, ao beijá-la, a mão delicada e elegante de Isabel dos Santos. Os nossos jovens desempregados devem andar à procura de camuflados, em segunda mão, para voltar a África. Mas não é pela reconquista... Agostinho Neto, na tumba, deve rir-se às gargalhadas.

Divagações 31


As grandes, lisas, brancas superfícies verticais, como que esbatem a chuva persistente. Como um cenário de fundo, em aberto. Onde a água, mesmo quando escorre, parece transparente. Até as arcadas são menos sombrias, nesta cidade batida pelo Outono.
Não são como o granito, a norte, que tudo enegrece numa monotonia ou destino de pesadumbre - que parece infinito, num determinismo de castigo, triste e sem futuro.
Depois, no espaço comunitário do fogo, embora seja noite cerrada, o lume temperado da amizade ilumina o pão, o queijo e o vinho sobre a mesa. E antecipa a luz do dia seguinte. Com a força branda da ternura.

Cardeal D. Henrique - Exposição e Catálogo



A exposição dedicada à obra impressa do Cardeal D. Henrique, na passagem do quinto centenário do seu nascimento, foi inaugurada hoje na Biblioteca Pública de Évora, depois de, inicialmente, ter sido apresentada na Biblioteca Nacional de Portugal.
A mostra bibliográfica e documental ficou, a partir de hoje, enriquecida com o lançamento do respectivo catálogo, na imagem, bem como uma visita guiada pelo Professor Doutor João Alves Dias, responsável pela organização do evento e do respectivo catálogo.

Post de HMJ