domingo, 31 de julho de 2011

Em aditamento a um comentário que fiz no Prosimetron


 No Minho, entre gente de poucas posses, em tempos recuados, as famílias que tivessem crianças convalescentes de alguma doença, ou débeis por natureza, para as tonificar ou robustecer, costumavam dar-lhes "sopas de cavalo cansado", porque os medicamentos eram caros para as suas bolsas limitadas. A receita era mais ou menos a seguinte:
- Vinho verde tinto (cerca de meia malga sopeira)
- Mel (uma colher de sopa não muito cheia)
- 1 gema de ovo
- Pedaços de Pão.
Na malga deitava-se o vinho tinto, acrescentando o mel e a gema de ovo, e misturando muito bem. No final acrescentavam-se as fatias de pão ou, preferencialmente, miolo de broa de milho, migado. As "Sopas de cavalo cansado" poder-se-iam também amornar, ligeiramente.
Ao que diziam, as crianças que as comessem durante alguns dias, recuperavam a saúde e ficavam fortes.

para o JAD, com Amizade.

Curiosidades 40 : origens, invenções e descobertas


Do livro "Diccionario de Invenções, Origens..." (1876), de Alberto Pimentel (1849-1925), respigamos algumas curiosidades que nos pareceram mais interessantes (com actualização ortográfica):
1. Agulhas - "As agulhas cuja invenção os gregos e os romanos atribuem a uma mulher, estiveram longo tempo sem ser aperfeiçoadas, porque eram feitas geralmente de espinhas de peixe, como os alfinetes. Parece ter sido no século XIV que se começou a empregar o arame nas agulhas e aí pelo século XVII que o arame foi substituído pelo aço."
2. Anspeçada - " Este posto hoje introduzido nos corpos de todas as armas do exército, no seu princípio pertencia só à Infantaria. O seu nome provém de duas palavras italianas lancia spezzata, lança quebrada, de que os franceses tiraram o seu lanspessada, e nós daí o nosso anspeçada. Chamavam-lhe assim, porque este posto era dado aos velhos gendarmes, que não podendo já servir na Cavalaria (cuja arma principal era a lança) os agregavam, como por uma espécie de reforma, aos corpos da Infantaria;..."
3. Bambochata - "Tem esta denominação um género de quadros ou desenhos que representam cenas populares, facetas e grotescas. Esta palavra deriva d'um pintor flamengo, Pedro van Loor, nascido em 1613, alcunhado Bamboccio, porque tinha defeituosa configuração. Como ele fosse o maior pintor d'este género, deu-se por analogia o nome de bambochatas às suas composições e às dos seus imitadores. ..."

Notas: a) o termo "anspeçada", no meu tempo de tropa (1968-1971), creio que já não era usado.
           b) existe um poema herói-cómico intitulado " A Lusa Bambochata" (1885) de Joannico C. Mila.

sábado, 30 de julho de 2011

E. M. Cioran e o Tabaco


"...Terei falado aqui da minha intoxicação pelo tabaco? Dizia eu há dois meses a um cirurgião australiano, que veio jantar a nossa casa, que eu tinha sido um grande fumador e que era impossível tomar a mais pequena decisão sem acender um cigarro, e esta dependência total, esta escravatura, acabaram por se me tornarem intoleráveis. Quando deixei de fumar, foi uma total libertação.
O cirurgião que parecia visivelmente interessado por aquilo que eu dizia, contou-me que lhe tinha acontecido o mesmo que a mim, e que uma vez, no meio de uma operação muito grave, parou bruscamente, não conseguindo decidir-se em que sentido devia prosseguir. Abandonou a sala de operações e foi fumar um cigarro, no exterior. Depois, sem dificuldade, soube aquilo que deveria fazer, tomou a decisão que se lhe revelou correcta uma vez que a operação, contra todos os receios, foi bem sucedida.
Depois que eu deixei de fumar, sinto-me menos capaz de afrontar os problemas da vida prática (sem contar com a baixa de rendimento intelectual que se seguiu!), mas finalmente não tenho mais o sentimento de me sentir dependente de um veneno, de um dono impiedoso."
E. M. Cioran, in "Cahiers - 1952/1972" (pg. 596). 

Da janela do aposento 4


Tenho andado às voltas, por questões técnicas, com o impresso de Germão Galharde, de 1526, cuja portada se reproduz acima.
No entanto, o olhar técnico não se abstraíu de uma parte significativa da Ordenaçam, "dada em Santarem, aos cinco dias do mes de Iulho", de 1526, por D. João III (1521-1557). Passados séculos, eis a transcrição de uma verdade ainda actual: "vendo eu o muyto tempo que ate ora se gastaua no processar: e ordenar os feytos" ...


Post de HMJ

Neste dia, dedicado a c.a. e todos os leitores amigos, artífices de justiça

Pelo aniversário de c. a.


Albatroz

Frente à janela o velho marinheiro
Sonha com baleias que navegam pela alma
E que o seu olho feroz não arpoou.
O seu coração é na verdade um único
Cemitério marinho. Não o do poema.
O que viaja nessa pequena vaga
Que lhe circula, lentamente, pela face.

Ómar Ortiz

Nota: expresso, ou não, cada poema traz em si um legado, uma herança de referentes, para além do seu impulso original e pessoal. Pela tradução deste poema de Ómar Ortiz (Bogotá, 1950) se podem notar vários ascendentes: Coleridge ("A rima do Velho Marinheiro"), "O Cemitério Marinho" de Valéry; e, porventura, o capitão Ahab do romance de Melville. As ilhas, em Arte, são uma ficção imperfeita.

para c. a. , com parabéns. 

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Aqui há dez anos


Arrumos de época própria, fazem-me deparar com um JL do período de 25 de Julho a 7 de Agosto de 2001 (a primeira data gralhada na capa). É o nº 804, do ano XXI. Dá para ver a efemeridade das coisas e o eco amortecido ou sepultado do que terá sido "importante", aqui há dez anos atrás - não vale a pena correr pela moda muito presente e demasiado actual... Dos best-sellers de ficção (10) passo a referir os 5 mais vendidos (alguém se lembrará deles?):
1 - Gaby Hautmann: "Um amante a mais ainda sabe a pouco" (Quetzal).
2 - Edith Wherton: "Sono Crepuscular" (Asa).
3 - Marion Zimmer Bradley e Diana L. Paxton: "A Sacerdotisa de Avalon" (Rocco).
4 - Luísa Castel-Branco: "Luísa" (Oficina do Livro).
5 - Brian Gallaghr: "Marido Infiel" (Presença).
As duas notícias em destaque, neste JL, são: "Os 5 anos da CPLP: Balanço e Perspectivas" e a atribuição do Prémio Camões a Eugénio de Andrade, com testemunhos e artigos de Eduardo Lourenço, Arnaldo Saraiva e José Tolentino Mendonça. O JL traz ainda 3 poemas inéditos do Poeta. Transcrevo um deles que não sei se terá tido inclusão e posterior impressão em livro. Tem como título "À beira da água" e está datado da Foz do Douro (27. 8. 2000). Segue:

Estive sempre sentado nesta pedra
escutando, por assim dizer, o silêncio.
Ou no lago cair um fiozinho de água.
O lago é o tanque daquela idade
em que não tinha o coração
magoado. (Porque o amor, perdoa dizê-lo,
dói tanto! Todo o amor. Até o nosso,
tão feito de privação.) Estou onde
sempre estive: à beira de ser água.
Envelhecendo no rumor da bica
por onde corre apenas o silêncio.

Portuguesas no século XVIII


Mais uma vez usando o pitoresco das observações contidas na "Relação do Reino de Portugal - 1701", de Thomas Cox/Cox Macro, editado pela BNP, em 2007, se transcrevem as notas sobre as mulheres portuguesas da época:
"...As Mulheres são geralmente pequenas e muito bonitas, excedendo a maior parte das mulheres da Europa. Mas assim que atingem a perfeição, decaem rapidamente e não restam vestígios dos seus anteriores encantos; atribuo duas razões a isto: em primeiro lugar, o seu uso excessivo de Pinturas e Loções compostas de preparados de Mercúrio que lhes endurecem e enrugam a Pele; e andam sempre com Leites e Feltros nos bolsos, e, quando a ocasião assim o exige, usam-nos mesmo em público, na rua e nas Igrejas. Outra razão é a sua prática excessiva de Lascívia; pois não existe outro sítio na Europa onde as mulheres sejam tão libidinosas, nem mais livres nos favores que dispensam. Começam a ter Filhos entre os doze e os treze anos, e aos vinte seis, vinte sete não têm mais." 

Cedo, na manhã de Julho


Do interior da janela, abro as férias ao cinzento. Há uma incomodidade neste frio inesperado de final de Julho, e esta troca de azul pelo escuro suscita um desconforto biológico e mental. Depois, na esplanada sem mar à frente, desdobro as páginas e leio, sobre Faulkner, umas linhas de crítica avulsa e breve. Hesito se devo levar, para o interior do café donde os trouxera, a chávena com o pires e o copo da água, já vazios. Há mais chávenas vazias pelas mesas abandonadas. O empregado virá buscar, com certeza, com a bandeja (se for redonda?) ou o tabuleiro (se for rectangular?), a louça usada e suja, para a lavar, no interior.
Uma pá metálica arrasta-se pelo chão, num ruído agressivo e desagradável, levando areia grossa de um lado para outro. Levanto-me e regresso. Há que fazer qualquer coisa pelo dia...

Mercearias Finas 35 : livros antigos de cozinha portugueses


Provavelmente, o mais velho livro de cozinha portuguesa terá pertencido à Infanta D. Maria que o terá levado para Itália, quando casou com o duque de Parma, em 1565. O livro foi encontrado por Giacinto Manupella, em Nápoles, nos anos 40 do século passado, sendo publicado, posteriormente. N' "O Livro das Sopas - a viagem do paladar", de Maria Antónia Goes, editado pela Colares Editores (s/d), faz-se a cronologia dos mais antigos livros de cozinha, nacionais e até ao séc. XIX, que passamos a transcrever:
1550 - Livro de Cozinha da Infanta D. Maria
1680 - Arte de Cozinha, de Domingues Rodrigues
1780 - O Cozinheiro Moderno, de Lucas Rigaud
1788 - Arte Nova para Confeiteiros e Conserveiros, de autor anónimo
1841 - Arte do Cozinheiro e Copeiro, do Visconde de Vilarinho de S. Romão
1849 - Cozinheiro Completo, de autor desconhecido
1860 - Formulário para Cozinha e Copa, de autor anónimo
1870 - O Cozinheiro dos Cozinheiros, de Plantier
1876 - Arte de Cozinha , de João da Matta
1890 - Manual da Cozinheira, de Henrique Zeferino
1891 - Manual de Receitas e Segredos Úteis, de autor desconhecido, publicado em Lisboa
1894 - O Cozinheiro Indispensável, editado no Porto, pela Livraria Internacional.

Nota (de culpa): Reparação em tempo útil (amável lembrete de HMJ), mas indesculpável não ter referido, sobretudo para quem se interessa pelo assunto, o magnífico catálogo "Livros Portugueses de Cozinha", da BNP (2ª ed., 1998), trabalhado com rigor por Manuela Rêgo e José Quitério. Hoje (29/7/11, 14,27 hrs.), em tempo. 

quinta-feira, 28 de julho de 2011

3 colombianos por uma esplanada de Verão


As Armas

Muitos se armam para a guerra.
É necessário.
Outros se armam contra o mundo.
É preciso.
Alguns se armam contra a morte.
É natural.
Tu armas-te para o amor
e estás tão indefeso
para a guerra,
contra o mundo,
para a morte.

Luz Helena Cordero (1961)

O Arroz

É como se fora
um baixo da orquestra
toda a clareza
afim da melodia
formosura branca
O arroz caminha
como dedos de pomba.

Horacio Benevides (1949)

para MR, este "trocar de rosa", feito em liberdade, numa esplanada de Verão, com votos de boas férias.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades...


Dentro de 11 dias passará mais um ano sobre a morte (8 de Agosto), aos 45 anos, de Ruy Belo (1933-1978). Sozinho, em Queluz, numa zona incaracterística de betão profuso, mas que dá pelo nome bíblico de Monte Abraão. Tal como a sua poesia, singularíssima e original, batia ao hausto longo de ressonância bíblica. Ontem, estive a reler o seu "Na senda da Poesia" (1969) e, no prefácio, ele fala com autenticidade dos gostos e amores perdidos de juventude. Vou passar-lhe a palavra:
"...Não escreveríamos hoje o ingénuo estudo sobre Sebastião da Gama nem a crónica jornalística sobre a poesia italiana, apesar de não deixarmos de sentir alguma saudade de um entusiasmo que passou e talvez não volte mais. ..."

quarta-feira, 27 de julho de 2011

"Bokassas" há muitos


Por vezes reencontramos, nas arrumações, livros que tiveram importância numa determinada fase da vida. Por coincidência, ou não, o "livro negro" da imagem surgiu pouco depois de termos falado aqui de alguns "Bokassas" europeus.
Ao folhear o livro, voltei a lembrar-me do motivo da compra. Hoje, já poucas pessoas se lembram que F.J. Strauss foi ministro da defesa da Alemanha. Durante o seu exercício adquiriu os malfadados aviões "Starfighter" para a Força Aérea alemã e que tanto pelo preço exorbitante, como, principalmente, por problemas de segurança ficaram célebres.
Menos célebres ficaram os 300 pilotos que, até 1989, faleceram ao serviço do país, pilotando os ditos aviões.

Post de HMJ

Balanço e contas, pouco antes das férias

O blogue, neste mês de Julho de 2011, atingirá o seu máximo mensal de postes colocados. Ultrapassará, muito provavelmente, o número de 140. Tal não teria sido possível sem a preciosa colaboração de HMJ e de H. N. (que, oportunamente, dará a sua opinião de leitura, aqui, sobre uma obra de Eduardo Lourenço). Mas também me foram essenciais as sugestões, dicas e informações amigas transmitidas por: A. A. M., C. S. e ms (estou a citar, por ordem alfabética). Não menos importante e motivadora foi, sem dúvida, a visita e comentários de alguém que muito prezo: MR. Mas também foram estimulantes as visitas, comentários e interacção, bissextos de: c. a., JAD, LB, Margarida Elias, Miss Tolstoi, "oliveira da Eurídice" e Ralf Wokan (volto a citar por ordem alfabética). Que se me perdoe alguma clamorosa omissão!
Finalmente, as visitas tímidas ou caladas, e anónimas oscilam entre 130 e 140 diárias, presentemente, com predomínio das brasileiras. Um agradecimento especial aos 29 seguidores do Arpose, pela paciência com que me têm vindo a acompanhar, com desvelo e atenção. E, já agora, uma última nota: o Arpose entrará, a partir de agora em velocidade de cruzeiro. E a seguir ao próximo fim-de-semana, optará por uma hibernação bissexta. Como dizia José Gomes Ferreira: "Viver sempre, também cansa!"
Obrigado a todos. E muito boas férias!

Bibliofilia 50 : Vasconcellos Coutinho


Está muito representado na "Fénix Renascida", este autor madeirense cuja obra foi publicada postumamente (1729). Francisco de Vasconcellos Coutinho (1665-1723) era um excelente "fabbro" do barroco cultista e dominava bem as normas poéticas da época. David Mourão-Ferreira sublinha-lhe acentos camonianos e algum pré-romantismo antecipado. Só se lhe conhecem, para além das poesias publicadas na "Fénix Renascida", estes dois conjuntos de poemas, numa edição interessante, de marca joanina característica. As obras, desencadernadas, comprei-as num alfarrabista da Calçada do Carmo, nos anos 90, por Esc. 2.200$00 (cca. 11,00 euros) - pareceu-me um preço justo, na altura. Depois foram para um encadernador, ali para as bandas da Sé, que fez um bom trabalho, limpo e perfeito, atendendo às condições. Nunca mais dei, até hoje, por mais nenhum exemplar à venda. Mas suponho que não será muito raro.

O ogre de Oslo e o silêncio dos inocentes


O comportamento humano, na sua expressão e manifestações, é infinito. E mesmo em seres humanos, aparentemente normais, equilibrados e previsíveis há, muitas vezes, desvios da norma, reacções e respostas de atitude que nos desarmam e nos deixam perplexos. Na memória de cada um haverá, também porventura, exemplos de comportamento desadequado, e inexplicáveis, pelo nosso critério e ética de estar no Mundo. Embora não nesta forma desmesurada de horror e apocalipse. Por outro lado não gosto, e evito pronunciar-me, aqui no Arpose sobretudo, a quente e de imediato, sobre casos complexos e que não se podem explicar pela Razão. Demorei a pronunciar-me sobre o caso DSK. Mas penso que devo dizer alguma coisa sobre o ogre de Oslo e o repúdio que sinto pelos seus actos assassinos.
Mitómano, exibicionista (basta ver os "uniformes" com que se autofotografou) dissimulado sob a capa de uma aparente discrição, frio até ao detalhe na execução do seu plano homicida, ideologicamente incoerente, carente de atenção e sedento de publicidade na forma como, por palavras, quase se auto-diviniza... Não creio, por isso, que falar muito do ogre seja a melhor forma de o esconjurar. E, não obstante, é o que os media estão a fazer, copiosamente, aliás. Há sempre espíritos débeis em que estes casos exercem algum fascínio e desejo de imitação.
Finalmente, gostaria de reter, transcrevendo, algumas declarações que me parecem ajustadas ao assunto. Do professor Marius Wülfsberg: "...um homem muito inteligente que enlouqueceu. (...) Não devemos permitir que uma pessoa tão bem informada esteja à nossa frente e faça propaganda..." E uma frase do Pai do ogre de Oslo, embaixador norueguês reformado, a viver no Sul de França: "...era melhor que ele se tivesse suicidado, antes de matar tantas pessoas...". Que o ogre não descanse em paz!

terça-feira, 26 de julho de 2011

André Maurois : as personagens


"A personagem é o homem que os outros imaginam que nós somos, ou fomos. Ela é talvez múltipla. Duas personagens diferentes, contraditórias e, por vezes, hostis entre si, que nos podem sobreviver no espírito dos nossos amigos, dos nossos inimigos, e continuar, depois da nossa morte, uma luta de que a nossa figura póstuma é o motivo."
André Maurois (1885-1967), in Mémoires (1942).

Osmose (22)


A única mesa vazia do restaurante estava-me ao lado e o par, um pouco distanciado em idades, não tinha outra alternativa. Ela, tão ágil de gesto e passo, dava ideia alta de uma gazela da Núbia, ele, mais setentrional, de boa máscara, bronzeado mas com duas brancas rugas paralelas, no pescoço, como se marcado para ser degolado. Pela conversa breve, dele, percebi que uma viagem os iria separar. Ela estagnava os olhos grandes, abstractos, no espelho em frente e respondia por monossílabos discretos. Foi então que o homem lhe estendeu um pequeno embrulho delicado, e disse: "- Toma!" Vagarosamente, a rapariga sussurrou: "- A minha estima não merecia tanto..." E foi a única frase completa que lhe ouvi, até me ir embora, em direcção à rua. Tinham eles começado a tomar o café.

Navegar, navegar...


Em memória de umas férias de suma liberdade, com crianças felizes à volta. E também para o António.

No tempo em que...


O verso: não apenas a lembrança
fica. Como voltar ainda? Aos dias,
anos até, e tanto por viver.
No sonho se levanta e não concorda
com ritmos, regras e este sobressalto:
cidade passo a passo desenhada
no amarelo linho, lentamente.
Tão baços copos de vermelho, o vinho,
só palavras bebidas que ficaram
feridas na memória, palmo a palmo
tão curtos dias e afinal palavras
de silêncio em protesto, tão incerto
melhor seria não o ter sonhado.

António de Almeida Mattos, in Conjuntivo Presente

para o António, o reflexo abraço de sempre, hoje, de parabéns.

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Regionalismos minhotos (4)


Aqui vão mais 4 regionalismos minhotos retirados de Vocabulário Minhoto (1916, Esposende), de M. Boaventura, com os respectivos significados, e para que conste:
1. Alambazar - besuntar; comer despropositamente e com sofreguidão.
2. Alfotrecos - utensílios, trastes velhos.
3. Algariça - colmeia. (Provavelmente de origem árabe).
4. Alquitetes - espertalhão; manhoso.

Música em viagem


Com agradecimentos cordiais a C. S. .

Cromos 20 : Esquadras de Guerra


Esta colecção de 312 cromos coloridos, da Agência Portuguesa de Revistas e Editorial Ibis, tenho-a completa, e deverá ter sido publicada no início dos anos 60 ou finais de 50 do século passado. A caderneta custava Esc. 6$00. Os cromos eram elucidativos nas características dos barcos e navios, mas também faziam um historial da navegação desde os primórdios humanos, reproduzindo barcos fenícios, romanos, até àqueles dias do séc. XX. Mas também as insígnias de comando e até os códigos de sinais marítimos. Era muito instrutiva, em suma. Mostra-se também, em imagem, a página referente a Portugal.

Os lugares, o tempo e os livros


Era habitual, quando saía por muito tempo, de férias, normalmente, levar comigo 3 livros: um policial (Maigret, de preferência), outro de prosa (romance ou ensaio) e, mais um, de poesia. De uma vez, lembro-me que juntei "Alegria Breve", de Vergílio Ferreira, às "Rimas" de Xavier de Matos, acompanhados por um Simenon, de que já não recordo o título. Sei, é que os li à beira Reno, num Verão bem quente. Foi um contraponto insólito: o frio e a neve que caía no romance, contra as altas temperaturas de Merkenich, temperadas apenas pelas águas, ainda frescas, do Fühlinger See.
Mas é um bom exercício para a memória tentarmos lembrar o local onde lemos determinado livro, ou algum poema que nos ficou de cor, de algum lugar. No Verão de 1989 (e por várias associações mentais, que faço), sei que li um estranho poema, embora muito interessante, "Da Creação et Composição do Homem" que, apesar de incluído nas "Obras de Luís de Camões" (edição de Paris, 1759, por onde o li), foi escrito, na verdade, por André Falcão de Resende.
Ainda mais marcante, no entanto, desse Agosto de 1989, foi a compra de um voluminho (na imagem), estimável e simpático, de René Char. Foi adquirido num pequeno alfarrabista de Liége, nas margens do Maas, um sábado ou domingo em que havia Feira da Ladra, na cidade. Edição numerada (o meu tem o número 234), custou-me 350,00 francos belgas, muito bem empregues. Li-o, depois, vertiginosamente, em Dilsen, numa casa alta de madeira, encantadora, com um soberbo jardim, em volta.

para HMJ.

Festival de Salzburgo: um discurso censurado



De acordo com uma notícia do DIE ZEIT, Jean Ziegler, sociólogo suiço, na imagem, deveria ter discursado perante o "público abastado" do Festival de Salzburgo, a decorrer entre 27.7. e 30.8.2011. Mas Ziegler foi desconvocado e, atendendo ao conteúdo do seu discurso, o próprio explica que os responsáveis pelo Festival sucumbiram face à "pressão suave" do Crédit Suisse e da Nestlé, apoiantes oficiais do evento.
Convenhamos que as palavras de Ziegler destoariam no meio da encenação de abastança. O discurso inicia-se para confrontar o público com números assustadores: "a cada cinco segundos morre uma criança, de fome, com idade inferior a 10 anos. 37.000 pessoas morrem diariamente de fome ...". Depois de explicar, de forma objectiva, mas expressiva, os estádios de enfrquecimento progessivo da criança até à morte, conclui que não existe, objectivamente, falta de alimento.
Ziegler nomeia, claramente, os responsáveis: "desde os estados que desviaram as suas ajudas para apoiarem o seu sistema bancários em crise até aos «patifes bancários» e os «bandidos especulativos»". Portanto, as palavras não eram meigas.
[Após alguma procura consegui encontrar o texto na íntegra, publicado a 24.7.2011, no jornal Süddeutsche Zeitung.]

Post de HMJ

domingo, 24 de julho de 2011

Divagações 11


Pontual o "pirilampo" abre os olhos, dois minutos depois do "aladino" - já passa das 9 da noite, mas vão acordando cada vez mais cedo: dias a encurtar a luz. Os pássaros andavam atabalhoados, ao fim da tarde, com o vento forte, inesperado, que se levantou. Só azúis no céu, intensificando-se no escuro, a sudeste. Os candeeiros, na rua, acendem às 21,14. Dizem que os relógios, psicanaliticamente, se podem associar à morte (ver Bergman, "Morangos Silvestres"), mas tudo isso é sempre distante, na imaginação. O vento agiganta a sua força, abanando as palmeiras-bébé, no passeio, que parecem quase levantar voo. Não fora o texto sobre François Nourissier (1927-2011), hipocondríaco confesso, que chamava à sua Parkinson, "Miss P.", não havia razões para melancolia. Nem há. O silêncio cá fora espera apenas pela lua. Será que é Lua nova?, porque também não a vejo...
Às claras "search words" : monumentos na Costa da Caparica, de um distinto pesquisador português, o obtuso motor de busca do Google encaminhou-o para o poste sobre o  Mosteiro da Costa (Guimarães), aqui no Blogue. Junta-se assim o Alzheimer ao Parkinson, valha-nos deus! Ao menos a caipirinha estava óptima! 

Os Ingleses vistos por um Inglês


"A Grã-Bretanha é verdadeiramente um asilo de loucos. É uma das coisas que nos distingue de outras nações. Temos uma concepção muito flexível da normalidade. Sob alguns aspectos, somos rígidos e formais, mas acreditamos que temos direito à excentricidade, na condição de que os excêntricos tenham altura. Nós não somos muito tolerantes em relação aos pequenos."
Louis de Bernières (1954). Tradução da versão francesa do livro "Un immense asile de fous" (Mercure de France).

Pequena história - D. João da Câmara


Teve vida breve este homem de Teatro, formado em Engenharia, mas que gostava da boémia e noitadas. D. João (Gonçalves Zarco) da Câmara (1852-1908) foi um fecundo dramaturgo e escreveu mais de 40 peças de teatro, entre elas: "Os Velhos", "Alcácer-Kibir", "Ao pé do fogão"... O seu busto pontifica entre o Teatro D. Maria II e a Estação do Rossio, em Lisboa. É o local apropriado, porque D. João da Câmara também trabalhou nos Caminhos de Ferro, e o pequeno Largo lisboeta, referido, tem o seu nome.
Dele se conta uma pequena história, interessante. Um dia, chegando a casa, disse à mulher: "Sabes? Convidaram-me hoje a entrar para a política. Prometeram-me um lugar de deputado, nas próximas eleições. Que dizes?"
E a mulher, consternada, abanou a cabeça e respondeu-lhe:
"- Ó João, mal por mal, antes o Teatro."

Incursões Culinárias 4


Zwetschgendatschi [= Bolo de abrunhos]


Quando se recebia a visita de familiares ou amigos, normalmente aos Domingos, eles chegavam por volta das 3 ou 4 horas da tarde, para o café, acompanhado de bolos. Para o dia de hoje, escolhemos, então, um bolo de abrunhos, podendo ser substituídos por ameixas. A diferença reside na maior consistência da polpa nos abrunhos, como se pode ver pela imagem abaixo, que facilita o trabalho de descaroçar os frutos.


Ora, vamos, então, à receita. Para a massa, precisamos:

21 g de fermento de padeiro
200 ml de leite morno
60 g de açúcar
1 ovo
1 pitada de sal
60 g de manteiga amolecida
400 g de farinha

Para a cobertura:
1 kg de abrunhos (ou ameixas)
100 g de amêndoa ralada
canela e açúcar

Tempo de preparação ca. 2 horas e 45 minutos (1 1/2 de repouso + 30 minutos de forno)

1. Misturar o fermento de padeiro com o leite e uma colher de chá de açúcar e colocar, durante 15 min., num lugar temperado.
2. Misturar o resto do açúcar, o ovo e o sal com o preparado de fermento, juntando a manteiga e a farinha.
3. Amassar tudo, durante alguns minutos, e deixar levedar, em lugar temperado, durante 45 minutos.
4. Untar o tabuleiro, amassar bem, mais uma vez, a massa e estendê-la no tabuleiro.
5. Durante o repouso da massa, costumo preparar os abrunhos, abrindo-os não completamente, mas tipo livro aberto, para tirar os caroços. Depois, colocar os abrunhos na massa em forma de leque. [Costumo pô-los em filas na vertical. E já agora, o "datschi" significa "carregar", ou seja, enterrar, levemente, uma das pontas dos abrunhos na massa.]
Espalhar a amêndoa ralada por cima dos abrunhos, deitar canela, para quem quiser, e açúcar. Deixar tapado no tabuleiro a levedar mais 30 minutos. Depois, vai ao forno, a 200º, ca. de 30 minutos.

Um tabuleiro de "Zwetschgendatschi", designação bávara para o "Pflaumenkuchen" também muito popular, nesta altura do ano, em Colónia, dá para muitos convivas. Os mais gulosos ainda põem Chantilly por cima.

Bom apetite !

Post de HMJ

Recomendado : dezassete - sobre enologia


É um livro de divulgação ampla, detalhada e de leitura agradável. Embora com algumas gralhas que, numa revisão atenta, talvez pudessem ter sido evitadas; a tradução também me não parece muito cuidada. Fora isto é um livro útil, simples na exposição dos temas e muito informativo.
O livro foi editado, em 2005, pelas Publicações Europa-América. O seu autor, Richard Mayson, é um profundo conhecedor da realidade enológica portuguesa, nos seus múltiplos aspectos. O ilustrador do livro é Leo Duff, nascido em Belfast. O volume aborda as castas de uvas, as regiões vinícolas, os principais produtores particulares e adegas cooperativas nacionais, bem como os seus respectivos produtos. Faz também uma análise detalhada sobre os últimos melhores anos de colheitas.
Para quem quiser ficar a saber o básico e até o suficiente sobre enologia portuguesa tem, n' "Os Vinhos e Vinhas de Portugal", uma obra acessível e útil, que eu recomendo vivamente.

NÃO vá de férias à Madeira


Aproveitando uma velha fotografia de uma campanha em sentido contrário, sugiro, em nome da ética, e sobretudo da igualdade dos cidadãos consignada na Constituição da República: não vá de férias à Madeira. Certamente, o povo madeirense não merece.
No entanto, perante a manutenção das benesses consignadas no estatuto politico-administrativo da Madeira que, entre outros, garante direitos adquiridos, ocorre a imagem do Zé Povinho. É pena que a criatividade relativamente à Moodys ainda não tenha "chegado à Madeira".

Post de HMJ

sábado, 23 de julho de 2011

Civilidade (13) : outra vez à mesa...


Com o avanço da globalização, qualquer dia pouparemos nas facas e, como os americanos, utilizaremos apenas o garfo para levarmos a comida à boca. E, quem sabe, se formos tradicionalistas e puristas, voltando ao passado português e europeu medieval, bastará uma fatia de pão como base, e os dedos. Já teria faltado mais... O que não se pouparia nos talheres!?, o pior era o futuro das Cutelarias vimaranenses e portuguesas.
Já aqui falei dum livrinho do Padre João de N. Sra. da Porta Siqueira, intitulado "Escola Política, ou Tractado Practico da Civilidade Portugueza" (Porto, 1803). Devia ser um homem exemplar, em matéria de etiqueta e boas maneiras. Aqui vão algumas indicações úteis:
"...Quando se cóme, não faremos sacco na bôcca, nem a encheremos muito, para o que sejão os bocados pequenos; nem se metta hum, sem termos engulido o outro. Não se mastiga com estrondo, não se cóme depressa, e como quem se escalda, não se estão mexendo muito os queixos, nem ajuntando os beiços, assoprando, etc. Se está muito quente o comer, se deixa esfriar, ou se mexe com a colhér.
Os ossos não se levão à bôcca em mesa de cerimonia, nem se estão chuchando, e roendo, mas só se esburgão com faca, e garfo, com summo cuidado de não çujar os dedos; porém accontecendo, os não alimparemos á toalha, nem a algum boccado de pão, como muitos fazem, mas ao guardanapo. ..."

Equidade e Ética

Após a escrita do texto sobre Hans e Sophie Scholl, reencontrei o livro sobre a "Rosa Branca", numa edição do Fischer Verlag de 1964. Curiosamente, e para além de me confrontar com os próprios sublinhados da época, deparei-me, novamente, com uma citação de Johann Gottlieb Fichte.


[1762 - 1814]

"Deverás agir [na tua vida] como se o destino da causa alemã
dependesse de ti e dos teus actos
e a responsabilidade fosse tua."

Apesar de esta máxima ter acompanhado, mentalmente, a minha vida, já não me lembrava onde e quando tinha lido conselho tão marcante. Ora, a citação consta do livro acima citado, fazendo parte de um "esboço de defesa" do Professor Huber, catedrático de Filosofia da Universidade de Munique, assassinado em 13.7.1943 no âmbito do processo sumário contra o movimento da "Rosa Branca".
[Confesso que não conheço a restante obra de J. G. Fichte, embora admitindo algumas polémicas, objecto de estudos que aqui não têm cabimento.]
Ora, a escolha da citação pelo Professor Huber para a sua defesa, e com a devida diferença de regimes da Alemanha de então e da República Portuguesa actualmente, encaminhou-me para pensamentos tristes.


Perante tudo o que o símbolo acima reproduzido devia significar, e notícias hoje divulgadas sobre benesses do Governo Regional da Madeira, concluí que altos representantes do Estado não tiveram, infelizmente, acesso à máxima de J. G. Fichte. Recomendo-lhes, por isso, a leitura do livro acima citado. E, na ausência de ética e abertura mental para palavras tão elevadas, que não abusem da equidade e da dignidade dos outros cidadãos.

Post de HMJ

Reservado: Hemingway/Sturges/Spencer Tracy



É um filme de um homem só. Na luta com um peixe enorme (espadarte?) e difícil, como a vida. Ou em luta por um sonho. Nas palavras de Shakespeare: "...full of sound and fury..." O livro ("The Old Man and the Sea") de Hemingway é, seguramente, melhor do que o filme de John Sturges, realizado em 1958. Mas o desempenho de Spencer Tracy (1900-1967) é notável.
O filme dá, logo à noite, na RTP 2, às 22,42hrs. E eu irei revê-lo.

Raymond Chandler


Raymond Chandler, nascido nos Estados Unidos a 22 de Julho de 1888, é ainda hoje considerado uma referência do romance negro ou policial. Mas começou a escrever tarde, aos 51 anos, iniciou-se com "The Big Sleep". Acontece que Chandler, pouco antes executivo superior de uma companhia petrolífera, fora despedido por alcoolismo e pelas imensas faltas que dava. Dedicou-se, então, a escrever contos e romances policiais. Até à sua morte, em 26 de Março de 1959, escreveu 7 romances policiais (todos traduzidos na Colecção Vampiro: 101, 118, 135, 147, 155, 164 e 213), vários contos publicados em "pulp magazines", e diversos argumentos cinematográficos em parceria com William Wilder. Dos livros em imagem, refira-se que "O Imenso Adeus" ("The Long Goodbye"), nº 101 da Colecção Vampiro, foi traduzido por Mário Henrique Leiria, com capa de Cândido Costa Pinto. O segundo, com capa de Lima de Freitas, tem o número 135, na mesma colecção. O protagonista principal dos romances de Raymond Chandler é o detective Philip Marlowe.

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Basílio da Gama, e as Epopeias


Os tempos que correm não se compadecem com a leitura de Epopeias. Até "Os Lusíadas" foram encurtando, timidamente, nos programas escolares. E, embora haja muitos leitores de livros("-tijolo", H. N.), em matéria de poesia, a situação é outra e fia mais fino. Julgo que a vida actual beneficia os haiku (japoneses, e não só), e os poemas menos longos. E não me parece que quem lê, normalmente, os tais calhamaços (nos transportes públicos), goste, na realidade, de ler poesia. Muito menos epopeias rimadas. (Tenho cá a minha teoria [entre leitores de calhamaços e epopeias], mas é insuficientemente fundamentada, por isso a não desenvolvo.)
Partilhamos com o Brasil, país irmão, do tempo colonial, vários poetas estimáveis. Um deles é Basílio da Gama, nascido em 1740, mas dia incerto, que veio a morrer a 31 de Julho de 1795. Tinha um hausto e estro longo, este brasileiro que se formou na Lusa Atenas, porque são dele os longos poemas: "O Uraguay" (sic) de 1769, "A Declaração Trágica" (1772) e "Quitubia" (1791), todos impressos, originalmente, em Lisboa. O Marquês de Pombal engraçou-se dos seus versos e, numa altura de infortúnio para o Poeta, protegeu-o. E Basílio da Gama, mesmo depois da "Viradeira", pagou-lhe com gratidão. Era um homem íntegro.
Não recomendaria a um amigo a leitura de "O Uraguay" porque, como diria Garrett, é sesquipedal, e tarefa nobre de académicos. Mas, catando muito a epopeia, ainda se encontram alguns versos estimáveis que, no caso do excerto que se segue (morte de Lindoya), me lembram o quadro de Da Vinci, "Leda e o Cisne", não sei muito bem porquê. E aqui vão:

"...Este lugar delicioso e triste,
Cansada de viver, tinha escolhido,
Para morrer, a misera Lindoya.
Lá, reclinada, como que dormia.
Na branda relva, e nas mimosas flores,
Tinha a face na mão, e a mão no tronco
De um funebre cypreste, que espelhava
Melancolica sombra. Mais de perto
Descobrem que se enrola no seu corpo
Verde serpente, e lhe passeia, e cinge
Pescoço e braços, e lhe lambe o seio.
Fogem de a vêr assim sobresaltados,
E param cheios de temor ao longe;
E nem se atrevem a chamal-a e temem
Que desperte assustada, e irrite o monstro,
E fuja, e apresse, no fugir, a morte. ..."

Mireille Mathieu



Quando começou a ter carreira sólida, disseram que era a sucessora natural de Edith Piaf. Como, em Portugal, também disseram que Carlos Malheiro Dias seria o continuador de Eça de Queiroz. Estas comparações são sempre despropositadas, porque cada ser humano é sempre, e por si, um animal único em vias extinção. Seja como for Mireille Mathieu completa, hoje, 65 anos. E eu quis lembrá-la.

Produtos Nacionais 1

Loja dos Açores


Noutro dia, li algures que 150,00 euros gastos (por português/ano?) em produtos nacionais (começando com os números 5 60 no código de barras), iria criar, entre outros benefícios, novos postos de trabalho, claro! Da nossa parte, e para além dos vinhos portugueses que entram em casa, preferimos as pequenas mercearias, o mercado e, já agora, a recém-descoberta Loja dos Açores. Por mão amiga, veio-nos, há tempos, um pão açoreano, massa tipo brioche, que não era o que se pode ver no vídeo acima, mas que era óptimo. 
Recentemente, procurei a Loja dos Açores na Rua S. Julião, na Baixa. Embora pouco visível do lado de fora, dentro da loja encontrei uma variedade de produtos e uma empregada, açoreana, educada, atenta e boa vendedora. A rapariga foi de tal maneira convincente e eficiente que saí da loja com manteiga, queijos e carne - "acabada de chegar" - para além do ananás na imagem abaixo. Segui o conselho da empregada, "deixar o ananás amadurecer durante uma semana", e hoje confirmou-se a excelência do produto.


E boas compras para os lusitos!

Post de HMJ

A morte de um Pintor


Nascido em Berlim a 8 de Dezembro de 1922, Lucian Freud faleceu na passada quarta-feira, 20/7/2011. Neto de Sigmund Freud, de ascendência judaica, a família fugiu para a Grã-Bretanha para escapar ao nazismo, em 1933. O Pintor naturalizou-se inglês, em 1939. Realista obstinado, num tempo em que a abstracção predominava, a pintura de Lucian Freud é reconhecível pelas pinceladas fortes, espessas e carregadas dos seus retratos ( o de Isabel II, causou polémica) e pelo tratamento rude dos seus nus, onde a carne quase assumia um destaque pictórico violento. Para a lenda futura ficará decerto o facto de ter continuado a pintar, já com 88 anos, e até ao dia da sua morte.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

As Varandas


Sempre gostei de varandas, demorei é muito tempo a dar por isso.  A minha casa(-matriz) inicial não as tinha, embora houvesse, numa gaveta, um projecto e plantas de arquitecto para abrir uma, num vão de escada, virada a Sul. Mas nunca se concretizou.
No início dos anos 60, em Coimbra, tive a minha primeira varanda: era ampla e virada para Montes Claros. Mas foi só em 1984 ou 85 que esse meu afecto se fez obra e palavra:

Agora que partiram vais abrir
memória pela noite e a varanda
recolhe o vento que quiseres levar.
Não respondes não ouves: com a noite

vais partir de ti. A ti chegar.

Curiosidades 39 : as visitas


Obrigadinho, ó Google!
O que ele se fartou de trabalhar aqui pelo Arpose! Fez-me 17 visitas, hoje e até agora. E eu, obtuso e ingrato, mal dei por ele: nem um chá, nem uma coca-cola lhe ofereci!... Ficou com um share de 9% de frequência ( a maior) no Blogue. Fico comovido com esta fidelidade canina, embora não goste de cães.
Nomeio-o em definitivo, e "honoris causa", meu big brother. Que um deus informático o conserve!

"As Novas Oportunidades"


Proliferam, como em 1983-85 as vi proliferar. Parecem "franchisadas", estas pequenas lojas, opacas de fora, cujo interior não se vislumbra das ruas, mas têm letreiros espampanantes no exterior, a dizer: "Compro e vendo ouro", ou reclamos ainda mais apelativos para quem precisa. São as novas oportunidades dos tempos de crise: começam a aparecer os abutres sobrevoando os corpos enfraquecidos, as hienas principiam a chegar. E estas novas lojas, que já não se chamam de Penhores, nascem da noite para o dia, como cogumelos, para se aproveitarem da fraqueza social dos mais débeis. Como a indústria de armamento se alimenta e ganha com as guerras, como os sucateiros lucram com o fim das guerras e a paz sequente, comprando a preços de saldo os metais sobrantes, assim os usurários, os especuladores e os abutres ganham, sempre, com as crises económicas. São os novos oportunistas. Até vêm a casa...
Ontem, na minha caixa de Correio, tinha o folheto colorido que se mostra na imagem. E no cacifo-estante da publicidade, do prédio, havia dezenas de folhetos coloridos, como este.

Da janela do aposento 3

Conselhos sábios para o país e a Europa

A conjunção de saberes permite olhar para os livros tanto sob a forma como o seu conteúdo. Aqui vai mais um encontro com o texto, tirado de:

Com efeito, no fólio 7, recto, deparamo-nos, no capítulo 3, com um "belo naco de prosa" [HN dixit]:

E para facilitar a (re)leitura de conselhos sábios sobre o remédio para tornar os países (ou reinos) fortes, aqui vai o texto correspondente, publicado por Mário Tavares Dias, em 1965.

(...)
Boas leituras.

Post de HMJ