segunda-feira, 31 de março de 2014

Revivalismo Ligeiro XCV : James Taylor


Curiosidades 25


Penso que toda a gente, ao longo da sua vida, se cruzou com pessoas de nomes insólitos ou com apelidos extravagantes. Até que ponto esses nomes e apelidos marcaram, para bem ou para mal, a vida dessas pessoas, é que só os próprios o poderiam dizer.
O Alentejo e as Américas, na minha convicção, são lugares onde, por vezes, se abusa em relação à onomástica, muito embora, em quase todos os países, por motivos políticos, religiosos, ou outros, haja nomes em moda, ciclicamente. Foi o caso, em Portugal, de nomes brasileiros, por influência das telenovelas. O que, porventura, indicia alguma falta de imaginação ou um determinado horizonte cultural.
O último "Obs.", sob o apropriado título "Des prénoms qui détonent" refere que, nos Estados Unidos, em 2002, pelo menos 194 bebés, foram baptizados sob o nome de "Colt". E, em França, durante o ano de 2010, 30 criancinhas receberam o nome de "Jihad". E, em Setembro de 2013, houve até uma extremosa mãe que mandou o filho para a Escola, com uma tee-shirt onde se lia, de frente, "Je suis une bombe", e nas costas: "Jihad, né le 11 de Setembre". Um tribunal francês condenou-a a um mês de prisão, com pena suspensa, e uma multa de 2.000 euros.

Exposição a Norte, em Abril


É depois de amanhã, 2 de Abril, a inauguração desta mostra de Dulce Barata Feyo, no Porto. A informação está dada, a opção fica a cargo de cada um, se gostar de Pintura.

Uma louvável iniciativa (25)


Mais três pacotinhos de açúcar, desta vez, alusivos à província do Minho (no verso, com informações sobre a arte da filigrana), do Douro Litoral, com um pequeno texto sobre o Vinho do Porto. Finalmente, da Ilha da Madeira, com a receita do conhecido Bolo de Mel islenho, no verso. De que, também, deixamos a imagem.

domingo, 30 de março de 2014

Puccini / Freni / Ferraris


A par e passo 85


A liberdade é uma sensação. Respira-se. A ideia de que somos livres alarga o futuro do momento. (...) Os acontecimentos não são senão a espuma das coisas. As reflexões que fazemos sobre eles são falaciosas, e as pretensas lições que tiramos destes factos espectaculares são arbitrárias e não isentas de perigos. Sabemos o que nos custaram, em 1940, como em 1914, os «ensinamentos» das guerras precedentes. Bastaria pensar, de resto, na infinidade de coincidências que cada «acontecimento» provoca para nos convencermos que não há senão que reflectir, cuidadosamente, sobre eles.

Paul Valéry, in Regards sur le Monde actuel (pgs. 381/2).

Nota: terminam, por hoje, as escolhas e traduções sobre esta obra de Valéry. O futuro dirá e ditará a continuação, ou não, desta rubrica, com outras obras do escritor francês, ou até de outros autores.

Colombo em queda


Apesar do desagrado da comunidade italiana, em Buenos Aires, a gigantesca estátua de Cristovão Colombo contemplando o rio da Prata (erigida no início do século XX), numa das praças da capital, foi desmantelada. E vai ser substituída por uma estátua de uma heroína nacional, por ordem e decisão da presidente Cristina Kirchner.
Há quem encare o facto como uma tomada de posição demagógica, como uma espécie de pureza de sangue memorial. Ou como uma exarcebação nacionalista, em que os argentinos são prodigamente cíclicos, para provocar um movimento patriótico de reforçada coesão popular.

sábado, 29 de março de 2014

Mercearias Finas 85 : para memória futura


Finou-se hoje, aos 33 anos de vida, e em muito boa companhia.

Georg Philipp Tellemann (1681-1767)

Citações CLXVII


O cepticismo activo é aquele que se esforça por se vencer a si mesmo e por conseguir chegar, através da experiência organizada, a uma espécie de segurança relativa.

Johann Wolfgang Goethe (1749-1832).

sexta-feira, 28 de março de 2014

Património


Celebra-se, hoje, pelo menos a nível nacional, o Dia do Centro Histórico. Não hesitaria em destacar o de Évora e o de Guimarães que, muito justamente, foram reconhecidos pela Unesco. A sua harmonia estética é flagrante, entre muitos outros, até do estrangeiro - não precisamos de ir lá fora...
Não sei quando começaram a ser chamados assim, nem quando as autarquias começaram a cuidar deles com desvelo e concentrada atenção regionalista, orgulhosa. Mas sei, em relação a Guimarães, quando tudo se começou a preparar. Foi nos finais dos anos 50, início dos 60 do século passado, e pela mão de particulares, que tinham amor à terra. E principiaram a comprar e restaurar velhas casas degradadas do centro da cidade, mesmo sem qualquer apoio, na altura, da autarquia.
E o resultado está à vista.

Marcadores 20


Singelo, este marcador transmontano (Chaves), que vinha dentro do livro "Dicionário de transmontanismos" (Chaves, 2005), deixa o recado essencial, nas suas palavras poupadas. E não deixa de ser bonito, na sua simplicidade elegante.

Regionalismos transmontanos (31)


1. Emacetar - fazer macetes, juntar as cartas do mesmo naipe ao baralhar.
2. Embiotar-se - enraivecer-se.
3. Empalear - adiar intrujando, enganar com paleio.
4. Empesgado - apertado.
5. Empinocado - aperaltado, delambido.
6. Encanastrado - bêbado.

quinta-feira, 27 de março de 2014

Robert Schumann / Clara Haskil


No Dia Mundial do Teatro


Creio que a primeira peça de teatro que li terá sido o "Auto da Alma", de Gil Vicente. Também por razões escolares, seguiu-se-lhe "Frei Luís de Sousa", de Almeida Garrett. E até pouco depois dos 30 anos continuei, com regularidade, a ver e a ler obras teatrais.
Subitamente, e mais ou menos por essa altura, o meu interesse começou a declinar, a pouco e pouco, e julgo que há mais de dez anos que nem vejo, nem leio teatro. Mas também não consigo explicar a razão deste meu desinteresse acentuada por essa temática literária.
E, embora não a pratique de todo, actualmente, neste Dia Mundial de Teatro, que se celebra hoje, quero deixar, em imagem, algumas das obras que li e recordo, com maior satisfação, do passado.

O falar dos animais (2)


São raros, por aqui, os corvos outrabandistas e, não fosse ele crocitar, negro e dominador, da mais alta antena televisiva da pequena praça, eu não teria dado pela sua presença, de média ave de rapina; mas aquela onomatopeia, três ou quatro vezes repetida, é inconfundível, talvez um pouco desagradável, embora não tanto como a das gaivotas. Que são, hoje, para mim, aves antipáticas e, às vezes, até agressivas.
Lembrei-me que já aqui falara, há muito (15 de Agosto de 2010), do linguajar ou onomatopeias dos animais, e pensei que talvez fosse altura de acrescentar mais algumas. Que se seguem:
1. Arrufar - gato.
2. Arrulhar - pomba.
3. Balar ou balir - carneiro ou ovelha.
4. Croajar ou crocitar - corvo.
5. Fretenir - cigarra.
6. Nitrir - cavalo.
7. Pupilar - pavão.
8. Trocilar - tordo.
9. Vocear - papagaio.
10. Voznear - cisne.

Nota posterior: por informação amiga, de AVP, aqui fica a correcção - o corvo não é ave de rapina.

Uma louvável iniciativa (24)


Mais uma interessante ideia do jornal Público, desta vez para comemorar os 40 anos do 25 de Abril: a edição de 13 livros, na sua versão original, e que foram proibidos pelo regime do Estado Novo. Os volumes, a preço módico, acompanharão a venda do jornal, às quintas-feiras, iniciando-se a colecção com a publicação de "Gaibéus", de Alves Redol, no próximo dia 10 de Abril de 2014. Há 3 ou 4 títulos que não vou perder!...

quarta-feira, 26 de março de 2014

Cioran e a Música popular


É preciso rompermos com as nossas origens, com a superstição da «tribo». Sou romeno, é certo; no entanto, não consigo suportar a música popular romena (excepto a doïna *). Ao contrário, a música húngara mexe comigo, transtorna-me, chega-me ao sangue. Os húngaros são nossos inimigos. Mas, num certo sentido, estes inimigos estão-me mais próximos do que os meus compatriotas. Que conclusão tirar?

E. M. Cioran, in Cahiers - 1957-1972 (pg. 706).

* doïna - género de canção folclórica romena, normalmente nostálgica. Considerada, pela Unesco, Património Imaterial da Humanidade.

Maria Tanase (1913-1963)

Apontamento 42: O peso da memória



Sem mais comentários, porque a escrita concisa e clara  de Viriato Soremenho-Marques diz tudo. Só tenho receio destes "engravatados", sem cérebro, que Grosz tão bem representa.


Post de HMJ

Isto, sim, é que é produtividade...


Andam os nossos Pês (PR, PM...), mai-los economistas televisivos a encher a boca e a falar da necessidade do aumento da produtividade portuguesa, quando a solução, pelo menos, na Justiça, seria muito simples...
Bastaria que a justiceira loura do ministério luso se decidisse a pagar um curso de reciclagem, no Egipto, aos sonolentos juízes nacionais, para que talvez eles conseguissem evitar a prescrição de alguns processos dos seus compadres banqueiros, reformados e abonados.
Aceitemos, no entanto, que há Justiça e justiça...

Um poema de Robert Frost, no aniversário do seu nascimento


A Minor Bird (Um Pássaro Menor)

Eu bem gostaria que o pássaro voasse para longe
E não cantasse mais, todo o dia, próximo da casa;

Bati as palmas para ele, junto à porta,
Quando senti que não podia ouvi-lo mais.

Mas a culpa pertence-me decerto
E não há que censurar a avezita.

É evidente que alguma coisa está errada
Em querer silenciar uma canção.


Robert Frost (1874-1963), in The Runway and Other Animals.

terça-feira, 25 de março de 2014

Insólito, ao fim da tarde


Retro (44)


Nunca se sabe se alguma vez havemos de precisar deste milagroso produto do Dr. Lefan, para fazer renascer o cabelo, mas que também fazia, de novo, progredir as sobrancelhas, as pestanas...
Desconheço se George Satin, na rua da Era, 17, em Lisboa, ainda produz essa maravilhosa pomada, a que deu o nome de "Nital".
O anúncio vinha na contracapa do livrinho "Como devo governar a minha casa", que HMJ aqui postou recentemente. E que julgo ser datável dos anos 30/40 do século passado.

Produtos nacionais 15


Não será uma afirmação gratuita, eu dizer que Portugal é um dos países europeus que, proporcionalmente ao seu território, tem uma maior gama de diversidade e boa qualidade no que toca a enchidos e/ou produtos de fumeiro. Talvez a Espanha nos esteja próxima mas, mesmo assim, fica longe...
De há muito que a indústria de Panificação portuguesa tem três formas de aproveitar as sobras da sua produção: o chamado pão duro. A maior parte, é transformada em pão ralado, outra, em tostas; o restante, por vezes, é adquirido por fabricantes de alheiras, que se dedicam a comercializá-las.
A sua origem, no interior de Portugal (Trás-os-Montes, inicialmente), radica nos conversos ou cristãos-novos (ex-judeus) que queriam dar a ideia à vizinhança que comiam carne de porco. Muito embora apenas acrescentassem à massa de pão, das alheiras, carne de aves (galinha e pato) e, eventualmente, caça (coelho bravo, perdiz...). O azeite era também utilizado, bem como sal, pimenta, alho e, por vezes, colorau.
O que foi um pequeno nicho regional de produção artesanal, com o tempo, veio a transformar-se em indústria florescente, de agrado nacional e preferência. E, se algumas marcas vendem gato desenxabido por lebre, com recheio constituído quase só por pão desfeito, tempêro, alguns ossinhos e uns fiapos de carne de frango, a EuroFumeiro (passe a publicidade...), de Mirandela, distribui umas magníficas alheiras de caça, bem fornidas de coelho, porco, pato, galinha e, talvez, perdiz. Com grelos, batata frita e um ovo estrelado, são uma reconfortante refeição.

segunda-feira, 24 de março de 2014

Da Janela do Aposento 45: Gramáticas e outros livros afins



Considero que o benefício de poder ”con-viver” com duas culturas, ou duas línguas, é um privilégio de consequências ilimitadas para o ser humano, embora abordado de forma leviana por alguns opinadores, reduzindo-o a aspectos acessórios.
Na conquista do espaço do “alter”, ou seja, no esforço de entrar no universo do outro – da sua História, Cultura e suas Tradições – orienta-nos, como guia, a sua língua e, quiçá, as linguagens específicas. Desse esforço surgiram, ao longo dos anos, prazeres estranhos como é o caso de coleccionar Gramáticas, genericamente falando, da Língua Portuguesa.
Embora sem rigor científico do ponto de vista da linguística, arrumo os meus interesses e a consequente tentação de aquisição em quatro grandes áreas, ou seja, as Gramáticas históricas, as filosóficas, as didácticas e as “actualizações académicas”.
Pouco interessa para o caso de nunca ter completado, por inércia ou falta de lembrança, uma lista bibliográfica das Gramáticas que vou coleccionando.
Interessa-me, sobretudo, o enriquecimento mental que vou tirando da consulta de Gramáticas. Nas Gramáticas "históricas", i.e., as primeiras impressas durante o século XVI, aprecio a riqueza expressiva, frequentemente claríssima, na exposição de fenómenos complexos da estrutura da língua.
As Gramáticas chamadas “filosóficas”, como a de Soares Barbosa, encaminham-nos para uma reflexão abrangente sobre a(s) língua(s) e que, por vezes, se completa com ensaios de George Steiner.
A secção das “didácticas”, e por antigo dever de ofício, reúne o maior número de exemplares, embora de qualidade descendente numa perspectiva diacrónica, do passado para o presente, centrada no século XX. De alguns “abortos” das últimas três décadas não reza o acervo, porque não tinham a qualidade mínima para fazer companhia aos “amiguinhos” mais velhos.
A actualização na compra de Gramáticas e relativamente aos Estudos Linguísticos foi cedendo ao gosto, em detrimento da obrigação de acompanhar o vasto leque de novas achegas, circunscrevendo-se ao interesse pessoal, à autoridade e ao apreço por determinados académicos.
Dito isto, e atendendo à capa de um dos mais recentes livros “afins” em epígrafe, pretendia falar do que, actualmente, se designa por Pragmática, i.e., e sem rigor científico, um olhar para a língua quando usada e aplicada em determinados contextos de comunicação. Ora, vejamos uma página do dito “livrinho” de Rosa Maria:



Considero que determinadas áreas da Pragmática, por referência a contextos culturais próprios de cada língua, exigem um esforço suplementar ao forasteiro, revelando a sua sensibilidade à diferença e à aceitação do outro. Confesso que a brochura sobre a “Economia Doméstica” me deixou, pragmaticamente, perplexa. A linguagem, embora adequada a um livro “singelo” de instruções básicas, acusa uma vertente que, até agora, me tinha escapado. A saber, o cunho ideológico no uso da língua, aspecto peculiar que nem a última Gramática, publicada recentemente, ajuda a integrar no universo da língua.
O que despoletou, certamente, esse olhar crítico sobre o cunho ideológico de determinados discursos foi um artigo de George Steiner, “O milagre oco”, em que ele aborda o pós-guerra na Alemanha e sublinha que o “problema das relações entre a linguagem e a inumanidade política é fundamental”.
Com efeito, o contexto da comunicação, ou seja, a Pragmática, não se situa fora do quotidiano político e social dos falantes.

Post de HMJ, dedicado a H. N..


Chopin / Bolet

Philippe Halsman (1906-1979)


O Musée de l'Elysée, de Lausana (Suíça), um dos melhores consagrados à fotografia, inaugurou recentemente uma exposição dedicada à obra do controverso e extravagante Philippe Halsman, russo naturalizado americano, nascido em Riga, em 1906. A exposição encerrará a 11 de Maio de 2014.
Grande parte das suas fotografias são encenadas, cuidadosamente, e, numa boa parte delas, os modelos estão a saltar... Porque Halsman tinha a convicção de que os retratados ficavam mais descontraídos, durante os saltos. Mas, não há dúvida que era um exímio profissional, atestado por belos retratos de Einstein, Mauriac, Bardot, Dali (em imagem, "Dali atomicus") e dos Duques de Windsor, entre muitos outros.

domingo, 23 de março de 2014

Divagações 63


O silêncio matinal e deserto de uma cidade, sobretudo em domingos inóspitos, é como se fora uma paisagem em aberto, semelhante ao princípio do mundo, onde apenas as casas e as ruas, de construção humana, podem destoar. Embora o silêncio seja tão poderoso, que faz esquecer esses sinais insólitos da mão humana.
Todos nós, decerto, já experimentámos, por insónia imprevista ou noitada escolhida, esse espectáculo raro e tranquilo da cidade adormecida, das ruas vazias, da luz crescente e insinuante que se vai adivinhando pelas sombras tímidas, pelo róseo ou rútilo com que a aurora vai vencendo, pouco a pouco, quase imperceptível, o escuro da noite.
Em desabono do derrame lírico do poste, ou do sentimento poético, e por associação lógica, quando penso nestas manhãs de domingo de cidades desertas, vem-me sempre à memória uma imagem do filme "A Ultrapassagem" (Il Sorpasso), de Dino Risi (1916-2008), com Vittorio Gassman e Jean-Louis Trintignant, entrando em Roma, numa manhã dominical.
Já no centro de Roma, e velozmente, os dois ocupantes do carro desportivo, depois de ruas e ruas vazias, vislumbram um único passeante matinal, numa praça, levando dois cães pela trela, que quase o arrastam. Ao passarem por ele, Gassman grita-lhe: "Liberta-te, escravo! Solta os cães!..."

J. L. Borges


Confesso, previamente, que não sou grande apreciador da obra de Jorge Luis Borges (1899-1986), e já aqui o referi, antes. Reconheço-lhe, no entanto, e faço-o por uma questão de justiça, a enorme erudição cultural, um amplo conhecimento de línguas e uma prodigiosa imaginação efabuladora - não é coisa pouca, convenhamos.
O último "Obs." dedica duas páginas ao escritor argentino, onde encontrei duas observações que ele terá feito, e que eu achei interessantes. Quando sentiu que estava para morrer, ter-se-ia questionado: em que língua iria morrer... A outra, é uma citação exacta, que aqui fica: "A raiz da linguagem é irracional e de carácter mágico."

Nota pessoal: já no final deste poste, e ao colocar a caricatura de Borges, feita por E. Fernández, achei que quase poderia ser de António Lobo Antunes. E depois lembrei-me que são ambos do signo astrológico da Virgem...Coincidências.

Uma louvável iniciativa (23)


Estes pacotinhos de açúcar, de uma conhecida empresa de refinaria, divulgam, em design estilizado, trajes regionais portugueses. No verso, dão-nos a conhecer tradições e receitas mais antigas. O pacote de açúcar referente ao Alto Alentejo, fala-nos da Olaria Pedrada, que terá tido origem em Nisa; o de Trás-os-Montes traz a receita do celebrado Toucinho do Céu.

Interlúdio 46


A par e passo 84


Tudo o que o homem fez, e o que o fez homem, teve como primeiro objectivo e como condição primeira, a ideia e o acto de constituir reservas. O ócio sonha, pensa, inventa, desenvolve os indícios, combina as observações; de que resultam várias consequências que foram transformando a condição humana e as nossas relações com todas as coisas, exteriores ou não.
Cereais armazenados, peixe ou carnes, secas ou fumadas - reservas materiais, produtoras de tempo livre, diminuem também o acidental da subsistência, estimulam a previsão. Permitem formar e entesourar reservas de conhecimentos, e vivermos delas. Cada vez são mais precisas para vivermos. O que é o homem moderno? É o ser humano em que todos os meios de existência dependem estreitamente da conservação, da regeneração e renovação duma quantidade incrível e sempre crescente de saber.

Paul Valéry, in Regards sur le Monde actuel (pg. 316).

sábado, 22 de março de 2014

Um pequeno texto de Óscar Lopes


Figuras há que, apesar de longa vida e obra prolífica e vasta, nós pensamos sempre que não terão dito tudo. Ou que gostaríamos de continuar a lê-los, pelo tempo fora, por novos textos, novas descobertas e pensamentos. E, isto, porque conseguem, na divina proporção, expor as ideias numa sábia mescla de saber, inteligência e sensibilidade, que nos toca naquilo que, à falta de melhor, chamamos alma. Para mim, uma dessas figuras é Óscar Lopes.
Felizmente, há sempre textos que desconhecíamos e que nos trazem a alegria de uma ressurreição. Foi o caso deste "Abril. Sempre", que Óscar Lopes escreveu, em 1986, para uma colectânea. E que aqui deixo, na imagem possível.

Da Janela do Aposento 44: Uma Escola de delatores



Sempre defendi, e persisto nesse propósito, que a Educação e a Escola deviam concentrar-se no essencial, i.e., pensar e fazer pensar no sentido mais amplo. Infelizmente, e olhando para o passado e o presente do respectivo Ministério, a estratégia, se alguma vez existiu de forma explícita e consistente, não escolheu esse desígnio como prioridade a atingir.
E assim, em deambulações várias, chegamos à presente desgraça em que se promove, com pompa e circunstância, uma Escola de delatores. Pensar sobre a Escola, e ofendendo uma disciplina chamada Sociologia, passou a fazer-se com recurso ao método de trabalho de “espreitar pelo buraco da fechadura para dentro de uma sala de aula”. A “análise” da “socióloga” responsável baseia-se, então, em relatos encomendados, eufemistamente chamados “diários”, ou seja, numa linguagem simples, a denúncia institucionalizada.
Também não falta, claro está, o “patrão”, quiçá futuro empregador dos alunos, a achar “inovadora” e atractiva uma teoria, embora às avessas das Ciências Humanas, que lhe prepara o trabalho de recrutar, não apenas submissos, mas “exímios agentes” ao serviço da paz empresarial.
Pensava eu que a Inquisição, com os seus métodos e “Róis”, era fenómeno do passado !
  

Afinal, a Escola passou a ser o “centro de formação” dos novos agentes de informação, assegurando-se, desta forma, a acefalia dos futuros contribuintes e utilizadores dos serviços públicos como, aliás, as últimas campanhas “cívicas” demonstram. Aos prémios para os mais audazes cumpridores, lançados pelo Ministério das Finanças, juntam-se, agora, as ameaças dos Transportes de Lisboa.
Só a crassa ignorância do passado histórico poderá explicar a completa ausência de revolta cívica perante semelhante ataque à democracia e aos valores mais nobres da convivência humana. Enganam-se aqueles que pensam que um Estado policial garante o futuro de governos fracos.

Post de HMJ


Ao Sol


Regionalismos transmontanos (30)


1. Daimoso - caritativo, dadivoso, desprendido. Afável, carinhoso.
2. Datarina - sova, coça, tareia.
3. Decrua - primeira lavra da terra.
4. Desarar - por em desordem, desarrumar, desarranjar.
5. Desleigar - censurar asperamente, descompor, injuriar.
6. Dondo - macio, brando, mole. Puído. Mal cozido (pão).

Pequena história (28)


Óscar Lopes (1917-2013) foi um aluno liceal brilhante, com altas notas, nomeadamente, a Latim, em que teve, como professor, Francisco Torrinha. Na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, veio a licenciar-se em Filologia Clássica, onde também obteve muito boas classificações, excepto na cadeira de Latim, onde um professor (?) lhe atribuiu apenas 11 valores, que foi a sua mais baixa nota, destoando grandemente da média restante.
Já quase no final do curso, o Professor Rebelo Gonçalves desafiou-o a que apresentasse a sua tese - uma vez que o catedrático ia para Coimbra -, porque gostaria de ser o orientador e presidir ao júri da prova final. Óscar Lopes aceitou o repto, e entregou a tese, a tempo. O júri foi presidido, efectivamente, por Rebelo Gonçalves mas, no grupo da mesa de arguentes, encontrava-se também o professor de Latim, que lhe dera a baixa classificação.
Todos foram elogiosos quanto ao trabalho da tese, excepto o dito cujo professor que desabafou, contrariado, dizendo não perceber a qualidade do aluno, até porque, quando fora seu mestre, não lhe tinha notado tantos méritos. Ao que Óscar Lopes, perante risada geral dos colegas da assistência, retorquiu apenas:
- A culpa não é minha!...

Nota: o falecimento de Óscar Lopes ocorreu, precisamente, há um ano (22/3/2013).

para o António, com um abraço.

sexta-feira, 21 de março de 2014

Revivalismo Ligeiro XCIV : Patxi Andión


Ainda sobre Poesia, e com Eugénio


Há séculos, pelo menos 9, que os portugueses se exprimem, também, através da poesia. Mas raramente se interrogam sobre ela e sobre a criação. Ao contrário dos poetas ingleses, por exemplo, que muito teorizaram sobre ela: de Wordsworth e Coleridge até T. S. Eliot.
Mas Eugénio de Andrade, algumas vezes, falou sobre poesia, com palavras justas e sábias, que o saber da experiência lhe dava. Numa ocasião, a uma pergunta/acusação (do entrevistador) sobre a dureza dos seus juízos a propósito de jovens poetas, respondeu assim:
"...A juventude não precisa de piedade, mas de verdade. Há muito jovem que me pede ajuda onde não há ajuda possível, pois ninguém pode viver por eles a sua própria vida, remontar às fontes do ser. Porque a poesia é a perpétua procura dessas águas. Quando não é isso, é uma inútil cantilena com que se embalam as horas, com que alguns espíritos superficiais enganam a vida. Num tempo degradado como o nosso, todas as fontes estão ocultas. A tarefa do poeta é desocultá-las. Tudo o que nos saia das mãos sem esse sabor original são só palavras a mascarar a palavra, miséria que nos impede até de ouvir a magnífica e alta música do silêncio."

Considerações pessoais, a propósito de uma crónica alheia


De uma forma geral, e com raras excepções que confirmam a regra, o período de tempo da nossa vida, consagrado aos empregos que nos traziam a subsistência e salário mensal, trazia também, consigo, desencontros, incomodidades, constrangimentos psicológicos. Daí, eu, muitas vezes, dizer, perante queixas de amigos: Não há empregos felizes!
Se a reforma ou aposentação, pelo menos de início, se acompanha de desencanto e da evidência aparente do começo da inutilidade civil e laboral, do ponto de vista mais íntimo, o reformado pode também descobrir, se for optimista, novos horizontes de liberdade e tempo aberto que, só na longínqua infância, poderão encontrar paralelos de semelhança e prazer.
Acresce que, nos últimos 20/30 anos, o trabalho/emprego começou também a ser acompanhado por pressões, muitas vezes desumanas, de diversa ordem que, só por pudor, não chamaremos: neo-esclavagismo. Englobando desenfreadas competições, absurdas burocracias, excessivos encargos, quando não vexames desencadeados, normalmente, por um sistema e chefias medíocres.
O tal "burn-out" de que se ocupa a crónica de António Guerreiro, na ípsilon, do jornal Público, de hoje. E que, parcialmente, vai em imagem, a encimar este poste.

Poesia e o seu Dia Mundial


Quando um Poeta é traduzido para outra língua, é porque a qualidade da sua obra é transversal, no mundo.
Mas também é preciso dizer que, se a tradução da prosa - quando bem feita - é difícil e está cheia de armadilhas, verter poesia para outro idioma é sempre uma tarefa condenada à imperfeição. Porque cada povo e cultura tem expressão própria e palavras exactas para exprimir a singularidade atávica dos seus sentimentos mais íntimos e a sua maneira de ser e viver, sem correspondência integral, absoluta, nos outros idiomas, mesmo que próximos ou vizinhos - e não há nada a fazer... Quanto a essa singularidade e idiossincrasia, próprias.
Apesar disso, neste dia eleito, pela Unesco, para celebrar o Dia Mundial da Poesia, escolhi para imagem, no poste, dois livros de poesia traduzidos, para chinês e francês (respectivamente, por Yao Jingming e Michel Chandaigne), de Eugénio de Andrade (1923-2005) - um dos meus poetas portugueses de eleição.

para MR, e em geminação com o Prosimetron.

quinta-feira, 20 de março de 2014

Schubert / Lipatti

Factos


A nostalgia pelo cheiro dos livros, o prazer táctil de os folhear e o gosto de os ter, como objecto físico, manuseável, será, para as próximas gerações de leitores, provavelmente, um sentimento desconhecido e difícil de compreender.
Pela primeira vez, neste ano de 2014 e nos E. U. A., segundo as previsões, a venda de e-books irá ultrapassar a dos livros impressos.

quarta-feira, 19 de março de 2014

Uma fotografia, de vez em quando (33)


Nascido a 19 de Março de 1922, o fotógrafo catalão Francesc Català Roca veio a falecer, em Barcelona, poucos dias antes de completar 66 anos, a 5 de Março de 1988. A arte estava-lhe no sangue, porque já o pai exercia a profissão de fotógrafo.
Os seus temas abordam sobretudo o quotidiano, captado com imaginação, humor, sempre com o sentido exacto do momento próprio para fixar a realidade. Mas também não foi indiferente ao Surrealismo. Um retrato de Dali, muito interessante, e esta nuvem (na imagem) "presa na gaiola" fazem-nos lembrar Magritte.

arte menor (16)


Na outra margem


São horas de fechar
a noite sobre a noite.

Uma janela bate, acordam-me do trigo
ventos imprevisíveis, aves soltas

nos ombros de deus.
Apago-me contigo.


?- Sb. 3/14.

Mais, da Grécia : Elytis, Theodorakis, Farantouri


para MR.

Citações CLXVI


7 de Março de 1969
Por causa do mercado comum e do reordenamento das terras, o campesinato francês desapareceu em menos de cinco anos. As consequências serão incalculáveis. Quando um país perde os seus camponeses, ele corta com as suas tradições, com a sua continuidade histórica, duma classe felizmente atrasada, porque ela exerce uma espécie de travão, de entrave útil, sem o qual irá de abalo em abalo (secousse). É preciso que haja inovadores, mas também é necessário que existam desconfiados, incrédulos, consternados. O medo da mudança é tão inerente à vida, como a avidez pelo novo.

E. M. Cioran (1911-1995), in Cahiers / 1957-1972.

Desabafo (ou confidência)


Muitos filatelistas daltónicos deve haver pelo Brasil! : a quantidade de brasileiros (2 a 3, diariamente) que focam o poste "As cores, o daltonismo e a filatelia" (26/5/2011) - Evoé!, a minha solidariedade, porque sou um deles,  a  9/10, que é pouco.
Mas o meu cepticismo reage: olha que não!, devem ser donas de casa brasucas a querer pintar a casa, e andam, simples e burguesmente, a escolher as cores, por mostruário...

Filatelia LXXXIX : velhos catálogos (2)


Os tempos conturbados e os períodos de crise deixam marcas em todos os sectores. Até na Filatelia.
Em Portugal, anos e anos, por Setembro, sistemática e pontualmente, saíam para venda os catálogos Simões Ferreira (Porto) e Eládio de Santos (Lisboa), já com a data do ano seguinte, que permitiam orientar os filatelistas e os preços de selos portugueses nas lojas filatélicas.
Com o 25 de Abril, houve um alargamento de opções, com catálogos novos (2 ou 3 mais), em edição a cores, de várias proveniências, mas que duraram pouco. E nem chegaram a ter credibilidade, em relação aos dois mais antigos e clássicos na elaboração ajuizada. Depois, o catálogo Eládio de Santos, com o fecho da casa filatélica homónima, deixou de publicar-se. O nortenho Mercado Filatélico (catálogo Simões Ferreira) passou a ser patrocinado, em parceria, pela Afinsa e pelo núcleo filatélico do Ateneu Comercial do Porto. E o único catálogo português de selos ia saindo cada vez mais tarde...
Mas o deste ano (2014) ainda nem sequer saiu... o que deve querer dizer que os selos portugueses correm o risco de já nem ter um catálogo nacional. E os preços de mercado passarão a ser controlados, comercialmente, pelo catálogo alemão Michel, pelo francês Yvert, pelo inglês Stanley Gibbons.
Em contrapartida (imagem), podemos ver que o Michel, apesar da guerra, logo no ano a seguir, e em Setembro de 1946, não deixou de publicar, em Leipzig, conscenciosamente, o seu catálogo filatélico, para a Europa...

Mercearias Finas 84


Eu já ia muito em cima da hora, para me dar ao luxo de passar pela ribeira - como costumo fazer - e onde há, quase sempre, aves inesperadas, para além dos quotidianos pardais ou dos patos, que vêm do Palácio, subindo as águas e debicando os limos das margens.
O restaurante, dantes tão ocupado, tinha apenas duas mesas com três clientes espaçados e, por isso, escolhemos lugar à vontade. Convidado, que era, escolhi, na mediania de preço, as pescadinhas fritas (de rabo na boca) com arroz de tomate, que sempre foram uma boa opção, por lá. O branco do Cartaxo, da quinta do sr. Abílio, na sua ligeira acidez citrina, combinou bem.
Mas não resisti a perguntar ao Fernando, se o ciclóstomo de água doce (anunciado, com destaque, na ementa) era à bordaleza ou com arroz de cabidela, malandrinho. "É como quiser!" - respondeu-me ele. Mas a escolha estava feita embora, se fosse eu a pagar, a lampreia tivesse sido a eleita, que já no ano passado me privara dela, ao passar no "Solar dos Presuntos", às Portas de Sto. Antão. E já tinha saudades...
Mas o Fernando é um empregado gentil, que me estima. A meio das pescadinhas, trouxe-me um pratinho dela, com uma posta generosa, em arroz de cabidela. "Gostava que me desse a sua opinião, porque fui eu que a preparei." - acrescentou. Estava óptima, no seu leve avinagrado tintoso, a saber a rio. Que não ribeira...
E foi assim que fiz a minha vernissage, este ano.

Uma editora-livreira corajosa


Esta insólita fotografia, de autor desconhecido, tirada em Paris, nos anos 20 do século passado, e que faz capa do último TLS (nº 5789), fixou para a posteridade o irlandês James Joyce (1882-1941) e a editora-livreira norte-americana Sylvia Beach (1887-1962). Que, contra ventos e marés, e após recusas de várias editoras, resolveu publicar, em 1922, o romance Ulysses, de James Joyce.